Seminário || 2020 Migrating Rights | Keywords

Middle Passages

Gaia Giuliani (CES)

19 de fevereiro de 2020, 14h00

Sala 1, CES | Alta

Comentários/moderação: Manuela Ribeiro Sanches, Clara Keating, Júlia Garraio
 

Enquadramento

Para encerrar as celebrações do 70º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos (10 de dezembro de 2018), o seminário “Middle Passages” terá lugar no dia 19 de Fevereiro de 2020, sendo a terceira iniciativa da série 2020 Migrating Rights | Keywords. Esta série de eventos explora e procura criar consciência crítica sobre assuntos relacionados com as migrações e os regimes de fronteira em torno de um conjunto de palavras-chave: Fronteira, Humanitarismo, Mediterrâneo Negro, Representações, Funcionamentos das Bio-Fronteiras, e Contra-Narrativas.

Palavra-Chave #3 | Middle Passages


Resumo

Este seminário foca-se nas conexões e desconexões entre a história do Atlântico Negro e a  “Middle passage” contemporânea através do Mediterrâneo. Parto da ideia do navio de escravxs como “cronotopo” da modernidade (Paul Girloy), através do qual se estabelece uma ontologia diferencial entre seres humanos – entre xs que não podem e xs que podem ser reduzidoxs a propriedade com a finalidade da  extração de valor – para afirmar que o navio de escravxs, conjuntamente com o seu leilão e a plantação, configuram lugares semióticos onde se constrói a raça tal como ela é percebida na modernidade. Ou seja, a raça configura-se como traço inerente à monstruosidade, cuja violência e indomabilidade têm que ser contidas e convertidas em docilidade escravizada.

Ao confrontarmos o navio de escravxs com o barco de migrantes que atravessa o Mediterrâneo e desembarca em Lampedusa e nas praias do sul da Itália e da Europa, surge, no segundo caso, uma espécie de cronotopo reverso e pós-moderno. No primeiro caso, a viagem não autónoma do navio de escravxs e a vida na plantação – descrita por Fredrick Douglass e, mais recentemente, por bell hooks, Saidiya Hartman, Marcus Rediker e Christina Sharpe – definem a ontologia da pessoa escrava como não autónoma, e logo não-humana, e constroem, por contraste, a humanidade enquanto autonomia face ao seu dono; no segundo caso, a viagem autónoma dxs migrantes, tal como a sua vida em barracas e campos, como o “Jungle” em Calais, ou equivalentes em Ventimiglia, Roma, Parigi, Idomeni, Patrasso, entre tantos outros, marcam a impossibilidade dessa dicotomia donx/escravx – humano/ não humano em que assenta uma determinada construção da humanidade] (Papadopoulos & Vassilis Tsianos; Mezzadra). Perante este cenário, pretendo estabelecer um confronto histórico destas figuras da Modernidade colonial e pós-colonial, assumindo a ideia da fronteira como dispositivo semiótico – fundamentada na herança colonial da construção da raça e explorando novas articulações destas mesmas construções.