9ª edição do Prémio CES para Jovens Cientistas Sociais de Língua Portuguesa

Élida Lauris e Sílvia Roque vencedoras ex aequo da 9ª edição do Prémio CES

Julho de 2015

«Acesso para quem precisa, justiça para quem luta, direito para quem conhece. Dinâmicas de colonialidade e narra(alterna-)tivas do acesso à justiça no Brasil e em Portugal» de Élida Lauris

A pergunta "depois do fracasso da promessa de acesso à justiça, ainda há esperança para as/os pobres?" é o ponto de partida deste estudo. Para responder a esta questão, a autora dedicou-se à análise dos mecanismos que detém o dever institucional charneira de inclusão das/os pobres no direito, a assistência jurídica. Contrariando a tendência geral dos estudos comparativos sobre acesso à justiça, traça uma comparação das realidades brasileira e portuguesa. Convoca-se tanto o realismo da carência, quanto o potencial da promessa de acesso à justiça. Na conjugação dessas duas extremidades, reivindica-se uma reflexão crítica quer sobre as condições de desenvolvimento dos mecanismos de acesso, quer sobre as direções apontadas e seguidas pelos estudos sociojurídicos. Com suporte em métodos de análise qualitativa e ancorados numa abordagem culturalista do direito, os resultados deste estudo apuram uma constelação de significados, interpretações e experiências subjetivas inerente aos processos societais de criação, aplicação e uso do direito. As condições de cumplicidade entre a proposta de igualdade jurídica formal e as relações de dominação consagradas pelo sistema jurídico são desveladas a par do conhecimento ilustrativo do funcionamento dos serviços jurídicos de assistência.


«Das revoluções por cumprir às resistências (im)possíveis. Jovens e percursos de violências em El Salvador e na Guiné-Bissau» de Sílvia Roque

Este estudo questiona as perspetivas académicas e as práticas internacionais dominantes sobre contextos de pós-guerra, defendendo que estas se encontram centradas num pensamento binário que diferencia como categorias e períodos antinómicos guerra e paz, político e criminal, reprodução e resistência. Argumenta-se que esta visão redutora impede a compreensão da complexidade das relações, continuidades e mimetismos entre lógicas e períodos da guerra e a paz. Isto porque as perspetivas dominantes das Relações Internacionais, e mesmo dos Estudos da Paz e dos Conflitos, tendem, a ignorar múltiplas violências quotidianas assim como os percursos de produção de margens sociais e políticas e as suas reconfigurações ao longo da história; tendem, ao mesmo tempo, a veicular visões estereotipadas dos grupos nas margens do poder, nomeadamente os jovens de países e sociedades periféricas, e a constituí-los como ameaças para a segurança internacional, ignorando o sofrimento localizado e os percursos concretos de reprodução das violências; tendem ainda a secundarizar o papel de dinâmicas e atores internacionais na produção da violência, assim como a negligenciar uma análise das dinâmicas de resistência e de não-violência no quotidiano, privilegiando-se uma análise do comportamento dos atores formalmente entendidos como políticos. Pelo contrário, adota-se neste estudo uma perspetiva alternativa de análise a partir de dois contextos distintos: El Salvador e Guiné-Bissau. Partindo das experiências e perceções de jovens não privilegiados, em contextos urbanos marcados por adversidades constantes, questiona a utilidade e pertinência dos enquadramentos de reflexão e de intervenção baseados na identificação entre pós-guerra, pós-crise e pós-violências e revela a permanência e incrustação da guerra, da crise e da violência no quotidiano. As vivências quotidianas de violência, de sofrimento e de impossibilidades nestes contextos refletem fragmentos de guerra na paz, assim como fragmentos de resistência na reprodução da violência e da dominação. Refletem, ainda, uma genealogia das violências e da distribuição do poder à qual não são alheios atores e políticas internacionais. Esta análise leva-nos assim a reconsiderar a distinção rígida entre velhas e novas violências, entre violência política e não política, entre atores políticos e não-políticos, entre agressores e vítimas, entre grupos mais e menos relevantes, entre local e internacional.