Teses Defendidas

Vale quanto pesa? A emergência de novos espaços de governação em megaprojetos de mineração no Brasil, Canadá e Moçambique

Isabella Lamas

Data de Defesa
30 de Maio de 2018
Programa de Doutoramento
International Politics and Conflict Resolution
Orientação
Paula Duarte Lopes
Resumo
A difusão do poder na governação global tem dado crescente protagonismo para a importância da inclusão das corporações multinacionais (CMNs) nas analises sobre política internacional. Mas, apesar da abertura da área das Relações Internacionais (RI) para a complexidade da governação a nível mundial, a maioria das investigações têm como foco os níveis de analise da macro política global e há pouquíssimos trabalhos empiricamente fundamentados sobre CMNs, particularmente sobre os seus efeitos na vida cotidiana de populações. Esta tese contribui para responder a essa lacuna de conhecimento sobre o fenómeno do crescente envolvimento de corporações na governação e é o produto de um trabalho empírico extenso feito a partir do caso da atuação da CMN mineradora brasileira Vale S.A. em distintos estados hospedeiros/sede em contextos de paz formal: Brasil, Canadá e Moçambique. Partindo dos quadros teórico-conceituais da Economia Política Internacional (centrada no papel das CMNs localmente), da Ecologia Política (centrada na relação entre conflitualidade e recursos naturais) e das ferramentas analíticas foucaultianas de disciplina, biopoder e governamentalidade, a tese contribui para lançar luz ao envolvimento cotidiano da CMN no governo da vida das populações atingidas por suas atividades. Sendo assim, o argumento central avançado nesta investigação é o de que, a partir da concessão de exploração, CMNs da área de extração de recursos naturais passam a ter funções de governação no ordenamento político de territórios onde se estabelecem. E isto, apesar de ser negociado com os diferentes estados hospedeiros, é uma dinâmica violenta não só na forma como é imposta, como também é violenta no dia-a-dia, na aplicação cotidiana em populações que têm que viver nos ou interagir com estes complexos minerários. A governação cotidiana da população atingida pela CMN tem duas facetas principais que incluem o 'papel de governo', no qual a corporação assume a função de provedora de serviços que classicamente seriam atribuições da esfera pública de governo, e o exercício alargado do ordenamento político a partir de mecanismos e tecnologias de governo diversos. Estas são formas de controle social da população e legitimação da autoridade da CMN frente a uma crescente pressão publica para a tradução dos benefícios económicos da exploração de recursos naturais em bem-estar para as populações. Mas, ao contrario da prosperidade decorrente da abundância mineral, salvo raras exceções, as pesquisas de campo nos três estados hospedeiros/sede revelaram cenários de conflitualidade que emergem como crítica e contraconduta das populações atingidas a estas dinâmicas de violência. As semelhanças entre os contextos são resultado do aumento da influência do capital transnacional, fruto da adoção de politicas neoliberais de crescente liberação e desregulamentação de investimentos. Dito isto, a investigação contribui para o desenvolvimento dos Estudos para a Paz e de uma vertente crítica das RI a partir de três eixos principais que a distanciam de teorias ortodoxas: as CMNs como atores centrais para a compreensão das relações internacionais; a análise da conflitualidade a partir de contextos de paz formal; e a incorporação do valor analítico do cotidiano para a compreensão da politica internacional.

Palavras-chave: corporação multinacional; governação; conflitos socioambientais; mineração; Vale S.A.