Teses Defendidas

Identidade, Autodeterminação e Relações Internacionais: O Caso do Saara Ocidental

Maria João Barata

Data de Defesa
29 de Outubro de 2012
Programa de Doutoramento
International Politics and Conflict Resolution
Orientação
José Manuel Pureza
Resumo
Esta tese pretende demonstrar que a autodeterminação constitui os selves que a reivindicam. Esta hipótese é articulada teoricamente nos termos do construtivismo da disciplina de Relações Internacionais (RI) e ilustrada empiricamente com o caso do Saara Ocidental.
Por autodeterminação entende-se aqui, ao mesmo tempo, uma ideia geral de direito à liberdade dos povos e uma norma específica para a delimitação e governação de comunidades políticas. A partir de uma revisão da literatura, identificam-se as principais tensões e contradições subjacentes à autodeterminação no sistema internacional, bem como as principais tendências na sua abordagem política e jurídica contemporânea.
Feita esta revisão, entra-se em questões teóricas de RI propriamente, nomeadamente em dois debates centrais do construtivismo: o do papel das normas na conexão entre o sistema e o actor e o da construção das identidades. A partir deste enquadramento teórico, propõe-se que a questão mais convencional sobre 'o que' e 'quem' é um povo - questão central na literatura sobre autodeterminação e que remete para a literatura sobre nacionalismo e identidade nacional - seja reformulada na questão da emergência, constituição e reconhecimento de uma identidade corporativa, representativa de uma identidade colectiva e que assume um estatuto de actor no âmbito do sistema internacional. Uma assunção fundamental de todo este enquadramento é a de que o actor e o sistema se constituem mutuamente. Nesta perspectiva, entende-se aqui que os selves se constroem reflexivamente por referência às instituições e às normas do sistema.
Esta conceptualização é aplicada ao caso do Saara Ocidental, através da análise do modo como aí se tem vindo a construir um projeto de independência política. Mostra-se como essa construção é significativamente informada tanto pela ideia geral como por uma norma mais específica de autodeterminação.
Começa-se o estudo de caso com uma caracterização do conflito pela soberania do território do Saara Ocidental, a qual evidenciará a importância de se considerarem questões de identidade para compreender a sua situação de irresolução. Depois, a partir de uma análise qualitativa de fontes primárias e secundárias, avança-se para uma interpretação do significado do conceito de autodeterminação na identidade saaráui que aspira à independência política, bem como os seus efeitos normativos na construção de uma identidade corporativa saaráui nos seus diversos componentes - instituições políticas, delimitação territorial e composição populacional. Para finalizar, tecem-se algumas considerações sobre as implicações desta análise quanto à questão da resolução do conflito, incluindo uma crítica da actualmente preponderante abordagem realista à sua resolução, a qual se tem centrado numa ontologia de actores institucionais, negligenciando questões de poder que emanam de factores mais intersubjectivos e normativos.
Em conclusão, mostra-se que o caso empírico ilustra e evidencia a pertinência do argumento teórico e, inversamente, mostra-se também que só a consideração de questões de identidade e de normas internacionais - nomeadamente o modo como o self saaráui incorporou a ideia e a norma de autodeterminação - permite compreender a resiliência do seu projecto de independência política e a complexidade do conflito em causa.