Heranças coloniais em tempos de 'Black Lives Matter'
Estudos CES
Spectacles of violence: passivity and agency in photographs of the Civil Rights and Black Lives Matter movements
Maria José Canelo
Everything is a Story: Creative Interactions in Anglo-American Studies
Apresentação
Trata-se de um estudo comparativo entre o Movimento dos Direitos Civis (MDC) e o Black Lives Matter (BLM) a partir de representações fotográficas. É muito frequente serem apontadas semelhanças entre estes dois movimentos sociais, uma vez que a causa da justiça racial é comum. Tendo em conta, porém, a recusa dessa aproximação pelo próprio BLM, proponho-me, no artigo, e com base noutros estudos, analisar em que medida as representações fotográficas que circulam nos media (algumas icónicas, do MDC), nomeadamente da interação entre manifestantes e forças policiais, são diferentes em cada um dos casos; reflito ainda sobre a possibilidade de dessa diferença emergirem percepções acerca da capacidade de intervenção ativa da comunidade negra, mobilizada para a mudança.
Na minha óptica, as fotografias icónicas do MDC da década de 60 sugerem um progressivismo seguro, ainda muito comprometido com o racismo sistémico, que emerge nas fotografias através de representações de passividade e vitimização da comunidade negra. O poder icónico destas representações resulta da normalização de uma história deste período centrada no movimento pela não-violência liderado por Martin Luther King e o NAACP e da invisibilização de outros grupos ativistas com orientações muito diferentes, como os Black Panthers. É desta linha de representação que o BLM se demarca; as representações do movimento tendem a sugerir formas de contestação, denúncia e relação com as forças da ordem que destacam a agência dos membros do movimento. A meu ver, as fotografias constituem um discurso visual não menos poderoso do que o das exposições em museus ou das estátuas públicas; na verdade, são todos eles constituintes do mesmo regime visual que atribui significados a imagens e complementa ou contesta a narrativa dominante.
Analiso, pois, questões de poder e agência a partir de uma leitura crítica das imagens, propondo que as representações fotográficas do BLM sugerem significados que podem perturbar o regime visual dominante e avançar alternativas à significação das relações e dinâmicas sociais, neste caso, nos Estados Unidos.