Seminário Internacional

Capital versus Vida. Dimensões do debate agroecológico na América Latina

Gladstone Leonel Júnior

Luísa de Pinho Valle

13 de dezembro de 2022, 16h00

Sala 2, CES | Alta

Introdução e Comentários: Teresa Cunha (CES)


Apresentação

De acordo com o Relatório da Desigualdade no Mundo 2022 (Chancel, Piketty, Saez, Zucman, et al: 11), elaborado pela equipa interdisciplinar de cientistas que compõem o World Inequality Lab (Laboratório de Pesquisa associado às Escola de Economia de Paris, França, e Universidade de Berkeley, Califórnia, Estados Unidos) a desigualdade é uma escolha política. A nossa política económica global está a levar-nos à fome e à destruição, afirma o Relatório (Ibid.: 95). O aumento de conflitos / guerras internas e internacionalizadas, a crescente variabilidade e os extremos climáticos, a morosidade e desaceleração económicas e a inacessibilidade a uma dieta saudável são os principais motores da insegurança alimentar e da desnutrição, que continuam a aumentar à escala planetária, em frequência e intensidade comumente combinadas (FAO, IFAD, UNICEF, WFP; WHO, 2021, p. vi). Como contraponto à pobreza extrema das pessoas e da Terra, neste seminário será apresentada a experiência brasileira da produção alimentar agroecológica e a luta pela afirmação do direito humano à alimentação e o direito da natureza à gestão adequada.

1/ Primeiramente, para perseguir o desejo pós-colonial e a luta anti-colonial (Rivera Cusicanqui, 2016, p. 3), será desenhado o entrelaçamento da colonialidade do poder (Quijano, 2000) e do saber (Lander, 2000), combatidas desde as epistemologias do Sul (Santos, 2014) na construção de esferas políticas de libertação (Dussel, 2009) na América Latina;

2/ Para enfrentar o conflito capital versus vida (Pérez Orozco, 2017, p. 116), serão discutidas, dentre outras dimensões propostas ecofeministas (Plumwood, 1990; Shiva, 2013; Mies, 2019; Svampa, 2019; Valle, 2021) que traduzem políticas marcadas pela indivisibilidade da vida e assumem que a responsabilidade compartilhada coletivamente abre à possibilidade da emergência de um conjunto de condições e metodologias de transferabilidade e aplicabilidade dos conhecimentos presentes em socioeconomias como a agroecologia (Cunha; Valle, 2019).

3/ A prática agroecológica (Leonel Júnior, 2016) pode ser vista como possibilidade de efetivação do direito da natureza, sujeita de direitos, para além da noção antropocêntrica de valoração sobre a vida (Gudynas, 2019, p. 103) ou ser vislumbrada como enfrentemento à lógica do capital, que demonstra uma falha metabólica (Foster, 2005), visto que a agroecologia tem o potencial de reconectar o ser humano e a natureza, campo e cidade, sem apelar para acumulação e reprodução do capital.

 

Notas biográficas

Teresa Cunha é doutorada em Sociologia pela Universidade de Coimbra. É investigadora sénior do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra onde ensina em vários Cursos de Doutoramento; co-coordena a publicação 'Oficina do CES' e o Programa de Investigação Epistemologias do Sul. Co-coordenou os ciclos do Gender Workshop entre 2012 e 2022. Coordena a Escola 'Ecologias Feministas de Saberes' É professora-coordenadora da Escola Superior de Educação do Instituto Superior Politécnico de Coimbra e investigadora associada do CODESRIA – Conselho para o Desenvolvimento da Investigação em Ciências Sociais em África - e do Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane, Moçambique. Tem publicados vários livros e artigos científicos em diversos países e línguas dos quais se destacam: Mulheres, Territórios e Identidades vol 1, 2 e 3; Women InPower Women. Outras Economias criadas e lideradas por mulheres do sul não-imperial; Never Trust Sindarela. Feminismos, Pós-colonialismos, Moçambique e Timor- Leste; Ensaios pela Democracia. Justiça, dignidade e bem-viver; Elas no Sul e no Norte; Vozes das Mulheres de Timor; Timor-Leste: Crónica da Observação da Coragem; Feto Timor Nain Hitu - Sete Mulheres de Timor»; Andar Por Outros Caminhos e Raízes da ParticipAcção.

Gladstone Leonel Júnior é professor adjunto da Faculdade de Direito e do Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense. Doutor em Direito pela Universidade de Brasília (2014). Estágio doutoral na Facultat de Dret da Universitat de València, Espanha. Pós-doutorado no Programa de Direitos Humanos e Cidadania da Universidade de Brasília. Membro da Secretaria Nacional do IPDMS - Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais (2018-2021). Mestre em Direito pela Universidade Estadual Paulista (2011). Especialista em Sociologia Política pela Universidade Federal do Paraná (2008). Graduado em Direito pela Universidade Federal de Viçosa (2007). Coordena o grupo de pesquisa Crítica Jurídica Contemporânea; integrante do grupo O Direito Achado na Rua.

Luísa de Pinho Valle é doutoranda do programa Democracia no Século XXI, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. É graduada em direito (USU/RJ, Brasil), especializada em direito público e gestão pública (UniCEUB, Brasil), mestra em direito (UnB, Brasil) e em ciências sociais e jurídicas (UPO, Espanha).

 

Referências

Chancel, Piketty, Saez, Zucman, et al. World Inequality Report 2022, World Inequality Lab. Disponível em https://wir2022.wid.world/.

Cunha, Teresa; Valle, Luísa de Pinho. O respeito à economia da vida e as pedagogias ecofeministas. Reflexões sobre a prática da agroecologia e do hamutuk. Otra Economía, vol. 12, n. 22, 2019, pp. 238-252.

Dussel, Enrique. Política de la liberación: arquitectónica. Madrid: Trotta, vol. II, 2009.

Escobar, Arturo. La invención del Tercer Mundo: Construcción y deconstrucción del desarrollo. Trad. Diana Ochoa. Caracas: Editorial el perro y la rana, 2007.

FAO, IFAD, UNICEF, WFP; WHO. The State of Food Security and Nutrition in the World 2021. Transforming food systems for food security, improved nutrition and affordable healthy diets for all. Rome: FAO, 2021.

Foster, John Bellamy. A Ecologia de Marx: materialismo e natureza. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.

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Leonel Júnior, Gladstone. Direito à agroecologia: a viabilidade e os entraves de uma prática agrícola sustentável. 1ª ed. Curitiba: Editora Prismas, 2016.

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Plumwood, Val. Women of the mysterious forest : women, nature and philosophy : an exploration of self and gender in relation to traditional dualisms in western culture. Open Access Thesis: Australian National University, 1990. Disponível em https://openresearch-repository.anu.edu.au/handle/1885/123810. Acesso em 08Set2016.

Pérez Orozco, Amaia. Subversión feminista de la economia. Aportes para un debate sobre el conflicto capital-vida. Madrid: Traficante de Sueños, 2017.

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Rivera Cusicanqui, Silvia. Debate sobre el colonialismo intelectual y los dilemas de la teoría social latinoamericana. In Silvia Rivera Cusicanqui; José Mauricio Domingues; Arturo Escobar y Enrique Leff. Cuestiones de Sociología, n. 14, 2016, pp. 1-22.

Santos, Boaventura de Sousa. Epistemologies of the South. Justice against Epistemicide. Boulder-Londres: Paradigm Publishers, 2014.

Shiva, Vandana. Making Peace with the Earth. London: Pluto Press, 2013.

Svampa, Maristella. As fornteiras do neoextrativismo na América Latina: conflitos socioambientais, giro ecoterritorial e novas dependências. Trad. Lígia Azevedo. São Paulo: Elefante, 2019.

Valle, Luísa de Pinho. Ecofeminismo e buen vivir: dois movimentos propulsores da expansão da racionalidade ambiental. In Reinventar o social: movimentos e narrativas de resistência nas Américas. Isabel Caldeira; Maria José Canelo; Gonçalo Cholant (Orgs.). Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2021, p. 137-172.