Seminário

Quando o Orçamento Participativo e as Moedas Sociais se encontram

Giovanni Allegretti

Luciane Lucas dos Santos

21 de outubro de 2014, 17h00

Sala 1, CES-Coimbra

Resumo

A moeda social tem adquirido cada vez mais importância no cenário internacional. Vários países a utilizam, seja para evitar a evasão de recursos das comunidades - fortalecendo a economia de proximidade - seja para estimular, no tecido comunitário, o reconhecimento e a circulação de competências e saberes das pessoas. Criadas e geridas pela própria comunidade, o mais comum é que estas moedas complementares sejam adotadas em pequenos circuitos de troca para o intercâmbio de produtos, serviços e saberes. Estes circuitos são conhecidos, em Portugal, como feiras de troca ou mercados solidários. Além de estarem nestas feiras, as moedas sociais aparecem, também, no âmbito das finanças solidárias, como uma forma diferente de apresentar o microcrédito, criando uma outra lógica de circulação dos recursos dentro da comunidade. São os bancos comunitários, geridos pela própria comunidade, na forma de associação de moradores ou outra instância que represente o coletivo.

A perspetiva de gestão partilhada - tanto nos mercados solidários com recurso à moeda social como nos bancos comunitários (em que a moeda social se estende a toda uma comunidade) - permite-nos estabelecer, à partida, uma ponte entre as Moedas Sociais e os Orçamentos Participativos. No caso dos mercados solidários, dada a nova sociabilidade que podem promover, é comum haver maior articulação dos participantes na identificação de problemas diversos (da aldeia, vila, bairro) e na busca coletiva de soluções. Deste modo, a integração dos cidadãos em circuitos de troca, por iniciativa dos mesmos ou por incentivo das autarquias e/ou associações de desenvolvimento local, contribui para o reconhecimento e valorização dos saberes das pessoas, para o fortalecimento de comunidades economicamente frágeis e para atribuir ênfase à chamada economia de proximidade. Estes são elementos que já nos permitem identificar pontes possíveis entre os orçamentos participativos e as moedas sociais. Acrescentaríamos outras: 1) se a democracia participativa é um elemento fundamental no OP, ela também pode ser fortalecida através da implementação de circuitos de troca com recurso à moeda social, sendo uma das mais-valias destes circuitos a articulação comunitária; 2) a moeda social guarda pontos comuns com o orçamento participativo relativamente aos objetivos de maior participação comunitária nas decisões que afetam o coletivo; 3) em alguns países, a moeda social pode ser integrada como instrumento de pagamento (parcial e sobretudo de bônus) aos servidores, criando legitimidade e estimulando maior circulação da moeda social e 4) a adoção ou apoio a uma moeda complementar local pode ser útil para ampliar o budget do OP em situações nas quais a ausência de recursos da autarquia pode ser equilibrada com a emissão da moeda complementar.

A proposta de formação que ora apresentamos busca trazer estas e outras questões para debate, mostrando pontes possíveis e desafios oriundos do diálogo ainda pouco estimulado entre moedas sociais e orçamentos participativos. Poderá a moeda social integrar uma política pública? Em que medida poderão, moeda social e OP, complementar-se no âmbito do desenvolvimento territorial? A moeda social pode ser incorporada no próprio OP?


Notas biográficas

Giovanni Allegretti é investigador no Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, desempenhando ainda as funções de Diretor Executivo do Doutoramento "Democracia no século XXI” e de coordenador do Observatório “PEOPLEs': Participação, Inovação e Poderes Locais”. Integra o Núcleo Democracia, Cidadania e Direito (DECIDe), sendo parte da sua coordenação. Desde 2002 tem sido "assistant professor" de Gestão Urbana e Analise do Território e dos Assentamentos na Universidade de Florença, Faculdade de Arquitetura. É co-presidente da Autoridade Independente para a Promoção da Participação da Região Toscana (Itália), para o mandato 2014-2019. Licenciado em Arquitetura (1996), tem Doutoramento em Planeamento Urbano, Territorial e Ambiental (2000) pela Universidade do Florença, Itália.

As suas áreas principais de pesquisa incluem a participação dos cidadãos na gestão das transformações territoriais e nos Orçamentos Participativos municipais (Europa, América Latina e África), temas sobre os quais tem inúmeras publicações. Outro tema acompanhado diz respeito à cidade informal e à auto-produção do habitat (em Brasil e Cabo Verde). Coordenou cientificamente a área de formação do Programa "Orçamento Participativo Portugal", cofinanciado pela EQUAL, que, desde 2008, formou mais de 600 técnicos e administradores municipais portugueses no campo do orçamento participativo. Também tem a coordenação cientifica do projeto europeu "PARLOCAL" gerido pela Província de Málaga, Espanha.

Luciane Lucas dos Santos é investigadora no Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra. Integra o Núcleo Democracia, Cidadania e Direito (DECIDe), bem como a equipa de investigação do Projeto Alice - Espelhos Estranhos, Lições Imprevistas, projeto internacional financiado pela European Research Council, coordenado pelo Prof. Dr. Boaventura de Sousa Santos. Integra, também, desde 2008, o Grupo de Economia Solidária (ECOSOL/CES), que faz parte do Núcleo de Estudos em Políticas Sociais, Trabalho e Desigualdades do CES/UC. Concluiu o doutoramento em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 2004. Construiu uma longa carreira de docência na Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Atualmente, sua pesquisa está relacionada aos seguintes temas: teoria crítica e pós-colonial do consumo, Economia Solidária, redes solidárias de trocas, economias indígenas, solidariedade internacional.


Atividade no âmbito do Núcleo Democracia, Cidadania e Direito (DECIDe) e do Observatório Participação, Inovação e Poderes Locais (Peoples')