Theses defended

Auto-determinação nacional para além do controlo político de um território: uma proposta de análise à emancipação colectiva e à autonomia individual em sociedades multi-étnicas.

Pascoal Pereira

Public Defence date
March 7, 2016
Doctoral Programme
International Politics and Conflict Resolution
Supervision
Maria Raquel Freire
Abstract
Nesta tese, procuramos responder à pergunta "como conceber um ideal de auto-determinação em sociedades multi-étnicas, ultrapassando a leitura clássica desse conceito enquanto mera independência política?" e analisar as fragilidades e incoerências da sua aplicação prática em contextos em que não haja uma correspondência linear entre território e identidade. Uma aplicação uniforme do princípio da auto-determinação nacional (enquanto independência política) a todos os povos que tenham essa ambição requer uma congruência entre unidade política e unidade cultural que raramente é possível. Por conseguinte, argumentamos que uma concepção de auto-determinação nacional equivalente ao acto de independência política seria incompleta por se afastar do potencial emancipador de que é portadora. Primeiro, não concebemos a auto-determinação enquanto independência política como um fim, mas antes um meio para alcançar a auto-determinação enquanto emancipação individual e colectiva. Segundo, essa concepção de auto-determinação enquanto emancipação pressuporia o seu exercício como um processo aberto e dinâmico que se prolonga para além do acto de independência. Terceiro, a insistência numa concepção de auto-determinação enquanto independência política centrar-se-ia no controlo politico de um território pelas comunidades e secundarizaria dimensões económicas, sociais e privadas da vida dos seus membros individuais. Argumentamos, por fim, que a exclusão mútua entre comunidades étnicas que partilham o mesmo território pode ser funcionalmente reproduzida se se entender a auto-determinação "sem o outro" ao invés de "com o outro".
Neste contexto, consideramos o nacionalismo como uma prática discursiva que consubstancia o ideal de auto-determinação nacional enquanto independência política de uma comunidade. Tal discurso constitui-se também como um senso comum massificado que dissemina modos de falar, pensar e agir num determinado contexto social, cultural e político e no qual os indivíduos tanto são constituídos por, como constituem as identidades colectivas. Adoptamos uma perspectiva pós-modernista sobre o discurso nacionalista, crítica de uma continuidade dupla (inter-geracional e inter-pessoal) sobre a qual assenta esse discurso e crítica de modelos interpretativos concebidos num paradigma académico modernista.
Após a desconstrução crítica do princípio da auto-determinação nacional e demonstrando os limites da sua aplicação prática, exploramos novas possibilidades de re-equilíbrio entre indivíduo e colectivo, de aprofundamento do carácter emancipatório desse conceito e do seu enriquecimento com outras dimensões para além da política e da cultural. Será, assim, possível associar o conceito de auto-determinação à construção de uma sociedade inclusiva e plural. Recorremos à situação específica de uma sociedade multi-étnica como a da República da Macedónia, fazendo uma análise exploratória que ultrapassa as dimensões politico-institucionais das relações entre comunidades, para tal juntando outros vectores de análise que permitem aferir a qualidade da convivência inter-comunitária e das vivências inter-pessoais. De entre esses vectores, salientamos as políticas educativas como um elemento crítico para o alargamento conceptual da auto-determinação enquanto emancipação, sublinhando, por um lado, o seu carácter binário (identitário e utilitário) e o seu papel no combate a uma ignorância dupla: a ignorância de conhecimentos e a ignorância do "outro". Para esse efeito são usados os dados obtidos do diálogo cíclico e tripartido que dá forma ao processo de monitorização da Convenção-Quadro para a Protecção das Minorias Nacionais do Conselho da Europa.
Pretendemos que este trabalho possa contribuir, por um lado, para a problematização de um conceito cujo entendimento mais exclusor pode aprofundar desigualdades estruturais entre grupos, sem que ignoremos o seu entrosamento com outros tipos de desigualdades sociais e económicas. Por outro lado, pretendemos analisar mecanismos de construção da paz e da convivência inter-étnica em sociedades multi-étnicas, distanciando-nos de análises que tomam a diversidade étnica como um factor de violência patológica.

Palavras-chave: auto-determinação; emancipação; nacionalismo; República da Macedónia; educação.