Apresentação
COORDENAÇÃO: Margarida Calafate Ribeiro, Patrícia Branco e Paulo Peixoto
O programa de doutoramento 'Pós-Colonialismos e Cidadania Global' tem como objetivo proporcionar formação avançada numa perspetiva crítica pós-colonial sobre a complexidade das relações políticas, sociais e culturais no mundo de hoje. Geopoliticamente, privilegia uma análise comparada e interdisciplinar da herança colonial e dos desafios pós-coloniais, com incidência no espaço de língua oficial portuguesa. O horizonte epistemológico do programa centra-se na discussão de novas formas de conhecimento suscetíveis de abranger diferentes modos de compreender o mundo e de estar no mundo.
Da história, antropologia, sociologia e direito aos estudos literários e artísticos, o programa promove a produção de um conhecimento contextual capaz de equacionar alternativas aos desafios que marcam os tempos que correm. Destacam-se temas como as crises ambientais, as mobilizações populares em luta pela dignidade e o respeito pelos Direitos Humanos e os discursos culturais, como base para a promoção de uma cidadania global e de ativa transformação do mundo.
O programa de Doutoramento em Pós-colonialismos e Cidadania Global teve início em 2004-2005 e foi acreditado pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES) em 2020 por 6 anos. O programa é oferecido bienalmente, abrindo assim uma nova edição cada dois anos. As edições de 2013/2014, 2015/2016 e 2017/2018 foram financiadas pela FCT.
O programa vai para a sua 8ª edição, tendo já doutorado 50 estudantes hoje espalhados pelo mundo e exercendo funções em universidades, instituições científicas e políticas nacionais e internacionais, e em organizações da sociedade civil.
O programa toma por tema a herança colonial e os desafios pós-coloniais do presente, com atenção especial ao estudo das relações geradas pelo encontro colonial no espaço de língua oficial portuguesa. Tem por objetivo, partindo da crítica pós-colonial, desenvolver estudos avançados centrados em questões fundamentais para uma análise da complexidade da estrutura das relações políticas, sociais e culturais no mundo contemporâneo. O seu horizonte epistemológico nutre-se da discussão sobre a possibilidade de formas de conhecimento suficientemente amplas para abarcarem a diversidade e a pluralidade híbridas de modo diferentes de ser no mundo. A sua hipótese de partida é que a narrativa da modernidade não esgota a complexidade e heterogeneidade do mundo e dos modos de conhecer o mundo, antes reprimiu e silenciou outras narrativas concorrentes, remetendo-as para uma posição subalterna no seio de relações de poder desiguais e frequentemente violentas. A tarefa a cumprir reside, pois, na produção de um conhecimento contextual e posicional capaz de formular possibilidades alternativas que possam servir de base ao surgimento de uma cidadania verdadeiramente global assente na superação da injustiça cognitiva.
O mundo moderno foi configurado de modo decisivo pela expansão colonial. Além disso, o fim dos impérios coloniais não pôs fim à colonialidade, isto é, à persistência de relações de poder e perceções da diferença que continuam a ser dominadas decisivamente pelo modelo colonial, como demonstram, por exemplo, as atuais estruturas da globalização hegemónica. A crítica do eurocentrismo proporcionada pelo pensamento pós-colonial constitui uma base sólida para a exploração de novas condições de articulação de epistemologias alternativas e para um questionar das narrativas dominantes que têm dado forma à nossa compreensão do mundo, abrindo, assim, a possibilidade de promover uma cooperação igualitária entre investigadores do “Norte” e do “Sul” do sistema-mundo.
O pensamento pós-colonial é, por definição, transdisciplinar. Entende-se a si próprio como um pensamento fronteiriço capaz de transgredir as fronteiras disciplinares e de desestabilizar as dicotomias estabelecidas. Em conformidade, o programa de doutoramento, situado firmemente na interface entre as ciências sociais e as humanidades, está estruturado de modo a percorrer transversalmente um espectro amplo de áreas do saber, dos estudos literários e culturais à sociologia, à história, à antropologia e à ciência política. Esta abordagem plural reflete-se produtivamente no modo como o programa concebe o paradigma pós-colonial. Na verdade, a forma plural “Pós-colonialismos” pretende chamar a atenção para o facto, quase sempre negligenciado, de que a primeira modernidade, a modernidade ibérica, e os impérios a que deu origem se desenvolveram historicamente em sentidos que, em muitos aspetos, não são abrangidos pelas teorias pós-coloniais dominantes de raiz anglo-saxónica. O efeito de invisibilidade assim gerado redunda num vasto “desperdício da experiência” (Boaventura de Sousa Santos), no sentido em que as especificidades desses contextos, explícita ou implicitamente classificados como subalternos, não são tidas em conta ou tendem a ser assimiladas pela narrativa padrão, redundando numa redução da complexidade muitíssimo problemática.
Ao pôr em destaque um amplo conjunto de questões tornadas invisíveis pelos paradigmas hegemónicos, o programa concebe-se a si próprio como o espaço reflexivo e autorreflexivo de uma formação para a complexidade. A metáfora da tradução descreve adequadamente o objetivo perseguido pelo programa de se confrontar com a diversidade da experiência e as diferentes abordagens ao conhecimento de uma forma suscetível de proporcionar condições de articulação e inteligibilidade mútua sem sacrificar a diferença em nome de uma assimilação cega. Ao mesmo tempo, ao centrar-se no contemporâneo através da atenção que dá às questões relacionadas com o Estado, a sociedade e a cultura no sistema-mundo atual, o programa concebe a noção de contemporâneo como a constelação de uma semântica densa do tempo histórico e, assim, recorre em permanência à contextualização histórica.
O programa fomenta o pensamento crítico e interdisciplinar sobre os legados coloniais, o racismo, genocídios e desigualdades atuais. É um espaço potente de diálogos Sul-Sul e Norte-Sul, com pessoas de diversas origens engajadas em lutas pela reparação histórica, equidade e justiça socioambiental.
Livia Almendary, em tese (Brasil)
"A escravatura e a colonização produziram um violento sistema-mundo que urge transformar. O POSCOL permite-me refletir profundamente esta realidade, destacando-se por um engajamento sério tanto na produção de conhecimentos transformadores como nas lutas atuais que exigem perguntas, respostas e ações cada vez mais articuladas, transdisciplinares e sofisticadas."
Apolo Carvalho, em tese (Cabo Verde)