Novas Poéticas de Resistência: o século XXI em Portugal

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cristina néry



entre os figos que arqueiam

e a negra crista de um capricórnio morto e

uma lua cega um plátano rosa

e um pavão em mosaico.

 

tenho os pulmões como varais de sal

que os guizos perfumam o meu cérebro

sob a abóbada de um punhal

e os ombros em azeite.

 

que um pássaro me embriague o coração de flautas

e uma fabulosa palavra se as primaveras

e uma cotovia magnífica

e um sudário.

e uma ilha em laranja onde os peixes brancos

querem o cenário das cerejas e os hinos aquáticos do mel.

 

que eu vista para sempre uma cidade

as taças de espuma e floridos príncipes

porque ardem as roseiras na língua

e um nadador nocturno dourado.

 

um coral de mosto púrpura para vestíbulo

das minhas sementes húmidas

e as borboletas sumptuosas.

 

nas órbitas de unguento

borboletas sumptuosas derramam

e a possessiva cabeça de um rio

e uma noite de liras graves

e raízes de garganta.
































um planeta como uma maçã lírica

e a queima da carne

por rainhas de luvas negras.

tenho nos ombros cavalos que descem o rio

e as concertinas vermelhas das paradas de ciganos

nutrição da lua.

 

na cervical de um leopardo inchado nos músculos os ângulos do poema.

cumpro a árvore de vidro

como se lambesse uma cela eterna.

há uma parábola nos violinos pequenos e o mosto das orações.

enfeito as varandas dos falcões com o cobre dos guizos e a argila

e deito-me a crescer em casulo.

 

limpo os partos de uma concha tenra

à hora das guelras e dos campos de cevadas.











Cristina Néry Monteiro
é membro co-fundador do Grupo “Oficina de Poesia”, desde 1995, e integra actualmente o conselho de redacção da Revista com o mesmo nome. Fundou o Grupo Poético "Sarau dos Danados", em 2005, e é membro do grupo experimental e poerformático “Aranhiças e Elefantes”, publicando regularmente no blog com o mesmo nome.
Colaborou com o encenador Celso Cleto em teatro e traduziu A Educação de Rita, de Willy Russel, levada a cena em 2002, As Três Mulheres, de Sylvia Plath e escreveu a peça Monólogo para Mariana Alcoforado.
É autora de O Ciclo das Sedas (prefácio por Graça Capinha, Palimage, 2005), A Sepultura das Romãs (no prelo) e As Histórias do Céu da Boca (no prelo), livro de histórias para crianças e publicou on-line a micronarrativa “O vício da cabeceira”, na edição nº. 10 da revista  Minguante (Maio, 2008).

 


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