Ângela Canez
perdidamente o rastro
o que fica da ausência rasgada nos aquedutos
na pele voltada à estéril lem
de mulheres que caminham so
e não se afundam não tornam a amanhecer
nem se consomem nas chamas
porque é tarde. demais e acrescentam à vida
uma réstia de silêncio. pouco mais
uma réstia de artefactos objectos comuns
para violentar a dor o que dói e fica
e alastra e é ainda maior porque anoitece
no quarto vazio onde já não vivem
nem se a
que os homens plantam ou fazem cair na memória
baixinho. assim inteira
retirando aos poucos o acaso
o vazio que é e aumenta a certeza de que ninguém virá
lá onde o corpo dói e funda
e aumenta e afunda um pouco mais. porque é tarde
e já deviam ter voltado da incursão
ao centro das águas. dos corpos depostos
onde já não dormem
ninguém vive
onde já não se vive
fartos de lem
tropeçamos no medo
moldado a custo por entre a lem
devasta o assom
e por lá fica e volta a perpetuar o assalto
aos confins onde ninguém vive. onde ainda habitamos
a última metade do escuro onde já não se é
somos por engano ao acaso no que resta
de um império assolado da insónia
que vem um dia. todos os dias e não se pode fugir
a fera ensaia o assalto
para o primeiro compasso do medo
a fera é tudo o que os homens podiam ainda esperar
a face
(calem os espaços que se em
das celas que decaem contra a muralha
contra o vazio que nos permite
o barulho das aves palavras que
decaem ao acaso no vértice de onde
se começa
a não ser)
a face
partiu
e o que mais lhes dói é esta ausência
este primeiro andamento de um espaço
vazio demais
tem a cara deposta contra o medo
é o primeiro sinal do silêncio
(de que hoje não choverá)
Ângela Canez nasceu
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