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Nº 48
Junho de 1997
Número não temático
ISSN 0254-1106 e ISSN eletrónico 2182-7435
  Identidades - Bela Feldman-Bianco
 
 
Boaventura de Sousa Santos
  Por uma concepção multicultural de direitos humanos  (pp. 11-32)
 Poderão os direitos humanos preencher o vazio deixado pelo socialismo? O objectivo do presente trabalho é identificar as condições em que os direitos humanos podem ser colocados ao serviço de uma política progressista e emancipatória. Para tal, há que começar por entender a tensão dialéctica entre regulação social e emancipação social que caracteriza a modernidade ocidental— uma tensão bem presente nas filosofias e nas práticas dos direitos humanos. Defende-se neste artigo que os direitos humanos só poderão desenvolver o seu potencial emancipatório se se libertarem do seu falso universalismo e se tornarem verdadeiramente multiculturais.
 
Georges Fouron e Nina Glick Schiller
  "Laços de sangue": os fundamentos raciais do estado-nação transnacional  (pp.33-66)
 Em diversos países exportadores de emigração, há políticos e dirigentes governamentais que estão a tentar revitalizar o nacionalismo e o conceito de estado-nação no contexto de uma economia global definindo os estados-nação como transnacionais. No presente artigo, defendemos, a partir do exemplo do Haiti, que esses esforços denunciam o facto de, subjacente ao conceito de identidade nacional, estar o conceito de raça. As identidades nacionais são identidades raciais no sentido em que assentam em conceitos de descendência através de laços de sangue, o que leva a encará-las como tendo uma base biológica. Os estados exportadores de emigrantes estão actualmente a definir a sua nacionalidade através da ascendência, e não por uma língua, uma história política, uma cultura ou um território partilhados. A ligação entre nação e raça, profundamente enraizada na teoria do estado-nação, está a tornar-se o traço distintivo necessário e suficiente da identidade nacional perante a migração transnacional.
 
Angela Gilliam
  Globalização, identidade e os ataques à igualdade nos Estados Unidos: esboço de uma perspectiva para o Brasil  (pp. 67-101)
 Tanto nos Estados Unidos como no Brasil, estão a surgir novos cruzamentos quanto ao entendimento geral daquilo que se entende por "raça". Partindo de uma reflexão sobre as formas de erosão do princípio da igualdade resultantes da dinâmica de globalização económica, percorrem-se vários aspectos da actual (re)construção social do conceito de raça nos dois países; as diferentes reformulações a que tem vindo a ser sujeito o princípio da affirmative action na luta política dos anos noventa são um sintoma revelador das tensões violentas que atravessam a questão da identidade e, desde logo, da identidade racial, tanto na sociedade norte-americana como na brasileira.
 
Graça Capinha
  Ficções credíveis no campo da(s) identidade(s): a poesia dos emigrantes portugueses no Brasil  (pp. 103-146)
 Através da análise de poemas escritos por emigrantes portugueses no Brasil, este artigo procurou revelar as ambiguidades e contradições resultantes de um equívoco permanente entre inclusão e exclusão, entre assimilação e resistência, entre interioridade e exterioridade, entre dominante e dominado: um processo de descobrimento e de simultâneo encobrimento que traduz sempre o processo de diferenciação entre "o mesmo" e "o outro" — colonizador e colonizado, centro e periferia. A identidade portuguesa coloca-se no espaço do jogo ambíguo "entre" as imagens de Próspero e Caliban — um jogo em que a questão da Língua e sua materialização ficcional de formas imaginadas (como as de uma "irmandade e/ou identidade luso-brasileira") assumem um papel fundamental na definição difícil do lugar da subalternidade numa situação pós-colonial diferenciada pela natureza específica do colonialismo português.
 
Mary Garcia Castro
  Trans-identidades no local globalizado. Não-identidades, margens e fronteiras: vozes de mulheres latinas nos EE.UU.  (pp. 147-174)
 Visita-se o teatro do trânsito entre fronteiras identitárias, partindo (1) de textos de autores brasileiros sobre latinos; (2) e de textos de mulheres latinas nos Estados Unidos — escritoras e militantes sindicalistas, sobretudo porto-riquenhas — pelo seu não-lugar: nação trans-territorializada, estado-apêndice, mulher em mundo de homens, cor escura em espaço branco. O objectivo é observar a (re)(trans)configuração de identidades em terra de outro, estranho: no ser estrangeiro estranhando-se na selecção de lealdades e de combinações conflituantes em representações de raça, etnicidade, nacionalidade e diferença sexual.
 
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