O presente capítulo centra-se no operariado de um sector industrial - o sector do calçado - caracterizado pela fragmentação da produção e pela fraca efectividade dos direitos laborais. A análise equaciona a existência de dois processos de articulação sobre os quais tem vindo a incidir o modelo de regulação dominante, procurando identificar em cada um deles as potencialidades de acção emancipatória no actual quadro de globalização. Esses processos serão interpretados a partir das experiências e modalidades de acção do sindicato do sector.

O primeiro diz respeito à articulação entre a indústria e a comunidade. Nele se procura, por um lado, mostrar em que circunstâncias a lógica industrial se impôs e modelou as dinâmicas comunitárias da região do calçado e, por outro lado, identificar experiências e modalidades de intervenção de base, coordenadas pela estrutura sindical. É através destas experiências que poderão ser encontradas potencialidades criativas - de denúncia, de luta, e de mobilização -, que têm vindo a orientar-se no sentido da participação associativa e da dinamização cultural, geradoras de novas capacidades de acção. As novas articulações promovidas pela liderança sindical entre as relações laborais (na esfera fabril) e a dinâmica associativa (na esfera da comunidade) são consideradas de grande significado enquanto novos caminhos para a acção emancipatória.

O segundo processo relaciona-se com a articulação entre o global e o local. Por um lado, a expansão da indústria do calçado e os seus impactos locais obedeceram essencialmente às exigências económicas do mercado internacional e, nessa medida, os seus efeitos configuram-se como um "globalismo localizado". Mas, por outro lado, e como consequência disso, tem vindo a ter lugar um novo conjunto de respostas a partir de baixo, apoiado num novo sentido de comunidade cosmopolita, que tenta promover novas coligações de actores sociais direccionadas para as novas redes e movimentos de luta e solidariedade - de âmbito global, mas veiculando problemas e reivindicações locais. Estas respostas serão interpretadas como novas formas e potencialidades para uma globalização emancipatória.