Reinvenção da Emancipação Social RES  
Reinventing Social Emancipation  English 
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Apresentação

1. Objectivos
As Vozes do Mundo são uma parte importante do projecto. A ideia básica das Vozes do Mundo é concretizar a posição epistemológica de que são muitos os conhecimentos possíveis do mundo e que o conhecimento científico é apenas um entre eles.

Estes conhecimentos não científicos designam-se frequentemente por conhecimentos alternativos. Esta designação é problemática, uma vez que o conceito "alternativo" dá a ideia de algo que se opõe à norma e a norma aqui será o conhecimento científico. Ora a verdade é que a quase totalidade da vida de grande parte da população mundial é regida por conhecimentos práticos não científicos e, sendo essa a norma, então o conhecimento científico é que deve ser considerado como alternativo.

As Vozes do Mundo visam tornar presentes neste projecto manifestações concretas de conhecimentos concretos, práticos, vulgares. Trata-se dos conhecimentos envolvidos nas práticas sociais que designamos como práticas de emancipação social. Se fosse necessário dar-lhes um nome geral, talvez a melhor escolha fosse senso comum emancipatório.

Ter acesso a conhecimentos deste tipo é sem dúvida um dos objectivo deste projecto. Mas esse objectivo deve ser precisado e ser sujeito a uma constante vigilância epistemológica. É que de outro modo corre-se o risco de cair na tentação da epistemologia imperial, ou seja, na tentação de aceder a esse conhecimento para o transformar em matéria prima do conhecimento científico. O objectivo aqui é claramente distinto. Parte-se da ideia de que o conhecimento científico é incompleto e não é susceptível de ser completado por recurso exclusivo aos seus instrumentos próprios. Como esta ideia se aplica a todas as formas de conhecimento, procura-se com as Vozes do Mundo suscitar a hermenêutica diatópica. Ou seja, procura-se suscitar um diálogo tanto quanto possível igualitário entre formas de conhecimento diferentes, na expectativa de que esse diálogo seja útil para os diferentes titulares dos diferentes conhecimentos na prossecução dos seus respectivos objectivos. Na medida em que os investigadores e activistas convergirem no objectivo de promoverem a reinvenção da emancipação social, essas diferentes formas de conhecimento contribuirão eventualmente para formas híbridas de conhecimento emancipatório.

Através das Vozes do Mundo procura-se ter acesso a conhecimentos práticos para os confrontar com os outros conhecimentos gerados por este projecto, quase sempre a partir do meio académico, sobre movimentos, organizações, iniciativas sociais. O confronto entre estes diferentes tipos de conhecimento pode contribuir para enriquecer a discussão sobre os novos caminhos da emancipação social.

2. Sobre os entrevistados
Os entrevistados ou entrevistadas são activistas ou líderes de movimentos, organizações ou práticas sociais analisadas no projecto.

A dificuldade havida em definir o perfil dos entrevistados merece uma reflexão sociológica. Ela decorre do definitivo fracasso (para uns) ou do actual descrédito (para outros) dos grandes mapas de emancipação social, tais como a libertação nacional, o socialismo e o comunismo. Com o abandono definitivo ou provisório desses mapas, desapareceram os grandes agentes históricos da emancipação social, os grandes líderes da libertação nacional, os líderes dos partidos comunistas e outros partidos e movimentos operários ou operário-camponeses. Há vinte anos seriam eles talvez os potenciais entrevistados. Mas, provavelmente, também há vinte anos não seria possível pensar na recíproca incompletude dos conhecimentos e por isso talvez a entrevista fosse impensável, quer porque se consideraria que só o conhecimento científico era válido, e nesse caso a entrevista não era necessária, quer porque se consideraria que só o conhecimento dos líderes era válido e nesse caso não havia que interrogá-los; havia apenas que segui-los. A época actual é de pequenos mapas e de pequenos guias. Com isso aumentou enormemente o número potencial de entrevistados, mas simultaneamente tornaram-se muito mais ambíguos os critérios de selecção.

Procurámos escolher activistas ou líderes de causas, movimentos, iniciativas, organizações progressistas de resistência contra a opressão e em luta por uma sociedade mais justa e uma vida colectiva melhor; líderes ou activistas que tiveram êxito nas suas lutas e que nelas ganharam uma experiência e um saber práticos que quiseram partilhar connosco. O importante é serem detentores de um saber prático que, apesar de decorrer de experiências e lutas muito concretas, pode ser útil, tanto para outros activistas noutros lugares e envolvidos em outras lutas, como para cientistas sociais genuinamente interessados no confronto entre diferentes conhecimentos.

2. Metodologias
As Vozes do Mundo não são um projecto de história oral. Assentaram em entrevistas longas, semi-estruturadas, ou seja, num conjunto de questões abertas, uma check list, que foram sendo postas pelo(a) entrevistador(a) de acordo com a dinâmica da entrevista e que funcionaram sobretudo como convites aos entrevistados para desenvolver livremente as suas ideias.

Sempre que possível tentou-se obter um registo áudio ou, se possível, audiovisual da entrevista sempre que tal registo não fosse considerado intrusivo e prejudicasse o fluir da entrevista. Fotografias do entrevistado(a) e do ambiente e local da entrevista foram também obtidas sempre que possível.

As entrevistas foram realizadas na língua em que o entrevistado se sentia mais à vontade. As transcrições para inglês e/ou português tiveram de ser realizadas tendo em conta as dificuldades encontradas em obter uma "tradução" adequada às situações e aos factos narrados.

O texto da entrevista é antecedido de um pequeno texto de apresentação do(a) entrevistado(a) e seguido de um breve comentário pessoal do(a) entrevistador(a) sobre o que mais o/a impressionou, instigou, intrigou ou surpreendeu na entrevista, um comentário a que chamamos Exercício de Autoreflexividade.

 
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