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"Não nos lixem": a luta contra a co-incineração de resíduos industriais perigosos nos arredores de Coimbra Marisa Matias - Portugal Este capítulo analisa o conflito de conhecimentos no processo de decisão política sobre o tratamento de resíduos industriais perigosos e na opção pela co-incineração. Embora a história do tratamento dos resíduos industriais em Portugal conte já com quinze anos de existência, a luta de Souselas (Coimbra) contra a instalação de uma co-incineradora, sendo o seu "capítulo" mais recente, foi aquela que, até ao presente momento, arrastou um conjunto mais vasto e complexo de questões que, impulsionadas pela sua maior amplificação, permitiram a um movimento de protesto local, nos seus períodos mais "quentes", a definição da agenda nacional. Para além do interesse decorrente da sua enorme complexidade, a análise de todo este processo parece indiciar que a sociedade portuguesa está a sofrer profundas alterações de âmbito estrutural que, aliás, já se vinham manifestando em outras situações de controvérsia pública recentes. Com efeito, o desbravar das possíveis consequências associadas à decisão governamental permitiu a emergência da controvérsia no interior da comunidade científica, um dos elementos decisivos ao longo de todo o processo. Este movimento reflecte ainda a necessidade de adequação e relacionamento do conhecimento a determinados contextos sócio-espaciais particulares, nomeadamente, ao nível dos problemas ambientais. Num processo como este, que envolveu questões de risco e incerteza, tornou-se explícito que ao manter as discussões no âmbito restrito da ciência se eliminaram muitas das suas potencialidades. Os saberes que foram considerados enquanto válidos para a resolução do problema apontam para uma solução moderna relativamente a um problema pós-moderno, uma vez que os resultados obtidos, para além de não se estenderem para além do conhecimento científico, permitiram uma associação entre os cientistas que produziram estes mesmos resultados e os decisores políticos. Para além desta dimensão da politização da ciência, este capítulo permite-nos ainda explorar as possibilidades emancipatórias da democratização do saber dito científico e da confrontação deste com os saberes leigos. |
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