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Nº 40
Outubro de 1994
Número não temático
ISSN 0254-1106 e ISSN eletrónico 2182-7435
Erik Olin Wright
  Análise de Classes, História e Emancipação  (pp. 3-35)
 Apesar de, em sentido estrito, o descalabro dos regimes comunistas não implicar uma refutação do marxismo enquanto teoria social, a verdade é que os acontecimentos dos finais dos anos 80 contribuiram para acentuar, no espírito de muitos intelectuais radicais, um sentimento crescente de autoquestionamento e de perplexidade quanto à viabilidade e à utilidade futura do marxismo. Embora continuando a acreditar que o marxismo é ainda hoje uma tradição vital a partir de dentro da qual se torna possível produzir uma ciência social emancipatória, o autor considera que, para poder continuar a desempenhar este papel, o marxismo tem de ser reconstruído em moldes diferentes. Para tanto, esboça neste trabalho, em traços gerais, os contornos fundamentais dessa reconstrução, com especial incidência no problema da análise de classes.
 
Michael Burawoy
  Dois Métodos à Procura da Ciência. Skocpol versus Trotsky  (pp. 37-88)
 Nos termos dos critérios formulados por Popper para o crescimento do conhecimento, tentei demonstrar a superioridade da metodologia dos programas de investigação sobre a metodologia da indução. Apesar de ter usado como ilustração as teorias da revolução elaboradas por Skocpol e Trotsky, construí asserções gerais organizadas em torno dos contextos da descoberta (indução versus dedução) da justificação (verificação versus falsificação e previsão) e do cientista (exterior ao objecto do conhecimento ou como parte integrante desse mesmo objecto). Enquanto os filósofos da ciência se preocuparam com descobrir o método científico puderam, com êxito, compartimentar estes contextos. Contudo, logo que se preocuparam com explicar o desenvolvimento do conhecimento científico, rapidamente descobriram, como nós, que estes contextos estão irremediavelmente interligados. Assim sendo, são necessárias categorias alternativas para comparar metodologias.
 
António Pedro Pita
  O Marxismo na Constituição Ideológica e Política do Partido Comunista Português  (pp. 89-108)
 O artigo esboça a análise dos princípios teóricos constituintes do pensamento de onde emergiu o colectivo do Partido Comunista Português. A abordagem dos escritos doutrinários de Bento Gonçalves, de alguns artigos de José Rodrigues Miguéis e do jornal Liberdade é o meio para levantar algumas hipóteses: 1. a moldagem da ideologia política do PCP, desde 1929, pelo leninismo na sua versão estaliniana; 2. o compromisso entre este "marxismo-leninismo" e o positivismo dominante na área republicana; 3. os efeitos múltiplos de um tal compromisso: as necessidades da unidade anti-fascista como elemento de bloqueio de uma elaboração autónoma do marxismo, no período referido.
 
José Veiga Torres
  Da Repressão Religiosa para a Promoção Social. A Inquisição como instância legitimadora da promoção social da burguesia mercantil  (pp. 109-135)
 Neste artigo pretende-se demonstrar, com dados, estatísticos sobre as nomeações dos elementos dos quadros burocráticos da Inquisição Portuguesa, que a actividade histórica (1536-1821) dessa instituição não pode ser perspectivada apenas em termos de repressão, mas que terá também de ser perspectivada em termos de promoção social. Esta demonstração implica a necessidade de uma teorização global do papel histórico desempenhado pela Inquisição na sociedade portuguesa, que passe pela especialização funcional adquirida pela burocracia inquisitorial na investigação linhagística, e do seu objectivo instrumental, que era o da diferenciação e exclusão social da "impureza de sangue".
 
João Freire
  O Auto-emprego: alguns comentários sobre dados recentes  (pp. 137-151)
 Aborda-se o fenómeno do auto-emprego, uma modalidade de actividade económica cujo significado nas sociedades industriais de economia de mercado não tem recebido reconhecimento social equivalente à sua importância efectiva. Após identificar uma série de factores que permitem contextualizar a relevância actual do fenómeno em análise, o autor, apoiando-se nos dados do Censo de 1991 já disponíveis e nos resultados de um inquérito recente, ensaia um conjunto de comentários com vista à caracterização sociológica da situação portuguesa neste domínio.
 
José Manuel Mendes
  As Identidades Sociais como Políticas e como Estratégias: o caso dos Açores  (pp. 153-172)
 Partindo da distinção entre identidades primárias e identidades secundárias ou imaginadas, procura delinear-se algumas hipóteses sobre o processo de (re)produção das identidades sociais, tendo como contexto o caso dos Açores. A análise foca dois planos distintos: a construção institucional e oficial (por parte do Governo Regional) do conceito de "açorianidade" (identidade imaginada); o processo de construção da identidade pelos agricultores, que, a partir da integração europeia, conduziu a clivagens acentuadas entre gerações. Conclui-se que, no plano teórico, conceitos como cultura e identidade nacional e/ou regional não demonstram grande riqueza heurística. A análise das "idioculturas", no sentido de Gary Alan Fine, parece apresentar maiores virtualidades, ou seja, as formas culturais devem ser conceptualizadas como tendo origem no contexto dos pequenos grupos e/ou nas redes sociais existentes.
 
Clara Keating
  A Construção da Polémica da Hegemonia e da Diferença nos Estudos sobre Linguagem e Diferença Sexual (A propósito de You Just Don’t Understand, de Deborah Tannen)  (pp. 173-189)
  A questão da construção da diferença sexual na linguagem tem vindo a ser objecto de intensas controvérsias, às quais a sociolinguística não é indiferente. Partindo de uma leitura crítica do recente bestseller da norte-americana Deborah Tannen, procede-se a uma avaliação de várias abordagens presentes no debate em curso.
 
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