Serviço público que supervisiona o cumprimento da legislação laboral, a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) tem por objetivo a melhoria das condições de trabalho em todos os setores de atividade privados. A sua missão é preventiva (da ocorrência de incidentes, conflitos, acidentes de trabalho e doenças profissionais), fiscalizadora (das condições em que o trabalho é realizado) e reparadora (i.e., indutora de melhorias legislativas).
Em tempos de pandemia, a ACT confronta-se com o agravamento de problemas já existentes que, em grande medida, desafiam a sua função de fiscalização. Disso são exemplo: situações em que os trabalhadores são forçados a trabalhar em condições de insegurança sanitária (como os trabalhadores de call centers), ou a aceitar revogações contratuais por mútuo acordo, ou a verem os seus contratos a termo caducados (mesmo nas situações em que as empresas beneficiam de apoios do Estado durante o período de vigência do lay-off); o risco real de despedimentos coletivos à margem da lei; a profusão de formas precárias em setores mais vulneráveis da força de trabalho (trabalhadores temporários, em outsourcing, a recibo verde, em período experimental); crescentes apelos ditados por uma economia digital despida de regras regulatórias; inseguranças associadas à realização de trabalho à distância, etc. Estes e outros exemplos vieram colocar a nu a escassez de recursos humanos e técnicos da ACT, que há muito tem sido reclamada e só mais recentemente (maio de 2020) foi corrigida com a inclusão de 80 inspetores admitidos por concurso externo (iniciado em 2016) e mais quatro dezenas de inspetores admitidos por concurso interno (em 2019).
É inquestionável a utilidade das 19 recomendações emanadas da ACT no final de abril de 2020 como forma de (re)adaptação aos locais de trabalho num quadro de regresso à “normalidade”. Mas seria desejável que a “transmissão” de competências dos Tribunais de Trabalho (em matéria de suspensão de despedimentos que apresentem indícios de ilegalidade) para a ACT fosse objeto de confiança política redobrada, capaz de ir além de um registo meramente transitório. De igual modo, a valorização dos inspetores com formação em direito laboral deve ser prioritária face ao recrutamento (mesmo que temporário) de inspetores noutros serviços. E é crucial que as ações inspetivas sejam o mais possível sinónimo de visitas reais às empresas e não realizadas por telefone ou email.
Sendo a crise sanitária um problema global, é também tempo de conferir efetividade à Autoridade Europeia do Trabalho. A COVID-19 estimulou processos de confinamento no interior das fronteiras nacionais, mas os processos de mobilidade transnacional (acima de 17 milhões entre Estados-Membros da União Europeia) não podem deixar de mobilizar governos no sentido do reforço de inspeções conjuntas, permitindo salvaguardar direitos de mobilidade e acesso sem restrições a mecanismos de proteção social.
Como citar: Costa, Hermes Augusto (2020), "Autoridade para as Condições de Trabalho", Palavras para lá da pandemia: cem lados de uma crise. Consultado a 14.12.2024, em https://ces.uc.pt/publicacoes/palavras-pandemia/?lang=1&id=30224. ISBN: 978-989-8847-24-9