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Sindicalismo
Hermes Augusto Costa

Frequentemente considerado “parente pobre” das relações laborais, o sindicalismo é também particularmente visado em situações de crise económica e de emprego como a resultante da COVID-19. Alguns dos recursos de capacitação sindical são, por isso, colocados à prova, como o foram durante o período de “desvalorização interna” que acompanhou o resgate financeiro e intervenção da Troika em Portugal. É em torno desses recursos (fontes de poder) que se geram os principais problemas.

De um ponto de vista estrutural, afigura-se como diminuta a capacidade de negociação dos trabalhadores em contexto de trabalho, desde logo porque o desemprego e as ameaças de despedimento coletivo em empresas de trabalho temporário, em setores como a hotelaria e turismo, etc., assumem contornos dramáticos. Por outro lado, do ponto de vista organizacional, tende a ser menor a propensão para a captação de associados, pois não raras vezes o clima de incerteza económica e até de medo levam a melhor sobre a adesão a projetos coletivos. Em terceiro lugar, a suspensão do direito à greve (durante o estado de emergência), ou a suspensão da audição das organizações sindicais em matéria de elaboração de leis do trabalho tornaram evidentes as fraquezas sindicais do ponto de vista institucional.

Ante aqueles três tipos de bloqueios (muitas vezes impostos de “fora para dentro”) nos planos estrutural, organizacional e institucional abrem-se possibilidades de resposta no domínio societal, isto é, da construção de coligações e redes na sociedade civil e da valorização de estratégias inovadoras.

Por um lado, atendendo ao facto de trabalhadores temporários, em período experimental, com contratos a prazo, a recibo verde, entre outros, serem os mais vulneráveis nesta crise pandémica, torna-se urgente ousar uma outra política de alianças entre os “velhos” sindicatos e as “novas” organizações de trabalhadores precários. Importa, por isso, apostar em fatores potenciadores de convergência e aprendizagem recíproca: pressão conjunta de denúncia e resistência perante situações de desemprego e precarização; clamor contra uma nova era de austeridade; combinação entre o sentido tático das lutas sindicais e a virtuosidade do ativismo digital típico das associações de precários, etc.

Por outro lado, os sindicatos precisam de tirar o melhor partido das redes sociais não só para recrutar novos membros, como para comunicar e falar “ao coração” da sociedade. Esta pandemia veio pressionar implicitamente os sindicatos a mobilizarem os seus associados no apoio a campanhas “à distância”, usando recursos e estratégias de comunicação digital. Mesmo reconhecendo que o foco do sindicalismo deve continuar a residir no local de trabalho e na proximidade com os trabalhadores, um reforço da comunicação digital, ainda que de modo supletivo, torna-se cada vez mais necessário.



Como citar:
Costa, Hermes Augusto (2020), "Sindicalismo", Palavras para lá da pandemia: cem lados de uma crise. Consultado a 21.11.2024, em https://ces.uc.pt/publicacoes/palavras-pandemia/?lang=1&id=30293. ISBN: 978-989-8847-24-9