A discriminação é interseccional, cumulativa e exponenciada pela vulnerabilidade, o que historicamente tem encerrado pessoas lésbicas, gays, bissexuais, trans e intersexo (LGBTI) em situação de risco acrescido. Na relação entre crise resultante de pandemia, desastre natural ou outros, por um lado, e diversidade sexual e de género, por outro, o problema traduz-se em questões tão transversais como a violência doméstica, sexual e de género sobre jovens LGBTI, acentuada em situação de emancipação tardia e confinamento com a família de origem e/ou ausência de autonomia económica e de redes de sociabilidade e apoio informal por parte de colegas de escola, agentes educativas/os ou do grupo de amigas/os; o agravamento das condições objetivas de existência de quem – por via da homofobia, transfobia e demais formas de discriminação estrutural –, apresenta tradicionalmente uma forte incidência de desemprego ou de emprego invisível, precário e inseguro, em particular pessoas trans e não-binárias; e, igualmente importante, o isolamento de pessoas LGBTI com mais de 65 anos, nos casos em que o envelhecimento, associado à iliteracia digital e à ausência de uma rede de apoio e cuidado adequada, levará a um agudizar dos riscos a que esta população fortemente negligenciada está sujeita, em particular nas situações relacionadas com fragilidade económica e emocional, doença crónica e saúde mental.
Ao impacto interseccional da discriminação sexual em situação de pandemia, desastre natural ou outros deve responder-se com medidas de curto, médio e longo prazo que permitam contrariar a vulnerabilidade económica e emocional, bem como a discriminação estrutural nas áreas do género e da sexualidade. Sabemos que a tendência para criar hierarquias de prioridade empurra as pessoas LGBTI para o fim da lista de espera e que o pós-crise é, em regra, terreno fértil para incursões populistas. Portanto, no estabelecimento de áreas de intervenção prioritária e na definição das medidas consideradas urgentes, os direitos de pessoas LGBTI não podem sofrer uma regressão, devendo a diversidade sexual e de género manter-se enquanto baluarte da democracia e da dignidade humana. Garantindo o respeito e a monitorização de direitos já consagrados, importa acelerar, acompanhando e consolidando, o trabalho em curso de combate à discriminação, principalmente nas áreas da educação, saúde e emprego. Para tal, a articulação com agentes no terreno deve ser reforçada, incluindo organizações não governamentais, movimentos sociais e academia. Nesse desiderato, a produção de conhecimento com base em evidência por parte dos estudos de género e da sociologia será fundamental para informar a decisão política e desarmar o discurso populista. Precisaremos de uma universidade atenta e participativa que garanta mais e melhor cidadania e justiça sexual e de género e intransigente na recusa de práticas sexistas e homofóbicas fundadas na tradição, no respeito integral pelo Princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
Como citar: Santos, Ana Cristina (2020), "Diversidade sexual e de género", Palavras para lá da pandemia: cem lados de uma crise. Consultado a 21.11.2024, em https://ces.uc.pt/publicacoes/palavras-pandemia/?lang=1&id=30272. ISBN: 978-989-8847-24-9