No início de 2020, no meio de um importante processo de reforma do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e da aprovação de uma nova Lei de Bases da Saúde – orientadas para a restituição ao SNS, depois dos efeitos da crise de 2008 e das políticas de austeridade impostas pela Troika, do seu papel central na garantia do direito à saúde e ao acesso a cuidados de saúde contra a sua privatização –, eclode a pandemia de COVID-19. Esta mostrou a importância crucial do Estado social, das políticas sociais e, em particular, dos sistemas públicos universais de saúde. Mas revelou igualmente limitações e vulnerabilidades, que, tornando-se mais visíveis em tempos de crise, se manifestam de maneira particularmente aguda quando o cenário do colapso se torna uma possibilidade, com consequências desigualmente distribuídas.
Uma emergência de saúde pública como aquela que se vive em 2020 cria uma pressão sobre o sistema que pode levar ao seu colapso, se não existir capacidade de contenção da situação –através de medidas baseadas em vigilância, rastreamento de casos, testagem, medidas de higiene e proteção pessoal e isolamento. E quando considerado necessário, recorrendo à quarentena e ao lockdown de territórios e das populações que neles vivem, com as consequências sociais, económicas e políticas daí resultantes.
Da pandemia de COVID-19 e do seu enfrentamento é possível tirar várias lições, a começar pela compreensão das relações mutuamente constitutivas dos problemas de saúde pública, ecologia, economia política, relações sociais, Estado e participação política.
É sobre essa compreensão que poderá assentar o apoio às políticas públicas para reforçar a ação do SNS e da saúde pública em situações de emergência:
- Afirmação da saúde como dimensão transversal a todas as políticas públicas;
- Reforço do financiamento do SNS e das instituições e serviços de saúde pública e da investigação orientada para as vulnerabilidades e políticas públicas dirigidas a estas;
- Preparação de unidades de saúde para emergências sanitárias de grande dimensão e impacto, atentas ao contexto territorial e social das suas intervenções;
- Proteção dos profissionais e trabalhadores em saúde, através da criação de stocks de equipamentos e da sua correta distribuição;
- Desenvolvimento de uma maior articulação entre o SNS e as suas unidades e a área de saúde pública, para assegurar resposta atempada e eficaz a emergências sanitárias;
- Maior envolvimento das instituições de saúde com a sociedade e com as organizações e movimentos ligados à saúde ou envolvidos com populações vulnerabilizadas, em articulação com a proteção civil e o SNS, e maior capacidade de intervenção em situações de vulnerabilidade;
- Oferta de formações, através de atividades de extensão – baseadas na colaboração entre instituições de ensino superior, de investigação e de saúde e a proteção civil, para intervenção em ações e emergências de saúde pública;
- Educação em saúde dirigida à capacitação para resposta a situações de emergência e à promoção da saúde, em escolas e em ambientes não-escolares.