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Espaço público inclusivo
Gonçalo Canto Moniz

O espaço público das cidades está em profunda transformação, em Portugal, na Europa e no mundo. A rua, a alameda, a praça ou o jardim que construíram os centros das cidades não são hoje necessariamente espaços públicos, ou seja, são muitas vezes espaços que perderam o seu caráter, uso e representação pública. Por um lado, o turismo ocupou os centros urbanos, principalmente as áreas históricas, afastando os cidadãos para as áreas periféricas, devido ao aumento exponencial do valor do solo e do custo dos serviços. Por outro lado, o rápido crescimento das cidades, com sucessivas áreas de expansão, provocou investimentos nas infraestruturas viárias, gerando espaços abertos sem vida urbana.

A pandemia de COVID-19 tornou visível este problema com o esvaziamento do centro urbano por falta de turistas e de cidadãos, e com o esvaziamento da periferia, por falta de um espaço público qualificado e inclusivo.

Hoje, é aqui que está a grande oportunidade das cidades que pretendem um outro modelo de desenvolvimento e governança extensivo a todas as suas áreas urbanas, mais atento às necessidades dos cidadãos e que garanta maior densidade, conexão, integração e inclusão.

As cidades mais densas promovem a rentabilização de recursos e a intensificação da vida urbana. Desenvolve-se, assim, um maior equilíbrio entre o território construído e as áreas naturais – floresta, campo, parques, rios, mar – promovendo um corredor ou um anel verde que a regenera, aproximando os cidadãos da natureza.

As cidades mais conectadas estabelecem uma forte ligação entre os seus diversos centros através de uma rede de mobilidade rápida para o transporte privado e público, e uma rede de mobilidade lenta para o cidadão que percorre o espaço público a pé ou de bicicleta. Esta mobilidade lenta tem um forte impacto no bem-estar dos cidadãos, é socialmente mais inclusiva e torna o uso do espaço público mais intenso e seguro.

As cidades mais integradas desenvolvem uma rede de serviços e de espaços públicos mais equilibrada, permitindo que os cidadãos tenham acesso às suas necessidades num raio de proximidade da sua casa ou local de trabalho. Assim, a cidade promove o direito dos cidadãos à habitação, educação, saúde e cultura.

As cidades mais inclusivas estabelecem um diálogo com cidadãos, nomeadamente os mais vulneráveis, de modo a garantir, não só o seu acesso ao espaço público como também o seu envolvimento e empoderamento no processo de planeamento e de tomada de decisão. Deste modo, as cidades mais inclusivas garantem que as decisões e os planos urbanos têm um impacto efetivo nas vidas dos cidadãos.

Assim, os sacrifícios impostos pelo vírus despertaram a consciência para a emergência de um outro paradigma de espaço público, mais inclusivo, onde os cidadãos se organizam para ativar laboratórios vivos e promover processos de cocriação, que respondem aos desafios da sua cidade.



Como citar:
Moniz, Gonçalo Canto (2020), "Espaço público inclusivo", Palavras para lá da pandemia: cem lados de uma crise. Consultado a 21.11.2024, em https://ces.uc.pt/publicacoes/palavras-pandemia/?lang=1&id=30115. ISBN: 978-989-8847-24-9