A violência é normalmente associada à subversão da ordem, a um aconteci-mento disruptivo e excecional que provoca danos (físicos, materiais, psico-lógicos) em alguém ou em algo, sendo a sua forma mais extrema a guerra. No entanto, a violência também pode ser exercida e experienciada sem que seja reconhecida enquanto tal. O seu caráter aparentemente excecional transforma-se em algo normal, banal e até aceite socialmente.
Existem várias abordagens quanto à forma como a violência é produzida pelos sistemas social, cultural, económico ou político. Uma delas é a noção de violência estrutural, ou seja, a violência produzida pela organização eco-nómica e política das sociedades. Esta violência expressa-se na desigual dis-tribuição do poder e, consequentemente, em oportunidades desiguais, na discriminação e na injustiça (na distribuição do rendimento, no acesso à edu-cação, por exemplo). Johan Galtung define-a como uma violência que não é praticada por um agente concreto com o objetivo de infligir sofrimento, mas é gerada pela própria estrutura social, sendo as suas formas mais relevan¬tes a repressão, em termos políticos, e a exploração, em termos económicos.
A violência estrutural não se define necessariamente como um processo ativo e deliberado, mas pode revelar-se pela ausência de proteção e garan¬tia de direitos e necessidades. Pode até desembocar na impossibilidade de manutenção da própria vida dos indivíduos/cidadãos (como no caso da negação do acesso à saúde ou à alimentação). São exemplos de violência estrutural, decisões políticas como as ditas “medidas de austeridade” que conduzem a um empobrecimento coletivo e a um retrocesso nos direitos sociais (apoio no desemprego, saúde, educação) e no acesso a bens essen¬ciais (como a água). A violência estrutural sentida no domínio económico pode favorecer o surgimento ou o aprofundamento de atos de violência direta (criminalidade, violência juvenil, violência doméstica), bem como de violência política (xenofobia, discriminação, repressão de resistências e contestação violenta).
Sílvia Roque