O mecanismo de estabilização criado pela União Europeia em maio de 2010, com base no artigo 122 do Tratado de Lisboa, para alegadamente responder às expressões nacionais da crise do euro – as chamadas “crises de dívida soberana” – consistiu numa garantia de créditos repartida por três fontes: o orçamento da União, o Fundo Europeu de Estabilização Financeira e o Fundo Monetário Internacional. A troika é o rosto institucional desta abordagem da crise do euro, que articula a Comissão Europeia com o Banco Central Europeu e com o Fundo Monetário Internacional.
Do ponto de vista substantivo, a troika é o veículo da aplicação na Europa das receitas neoliberais ensaiadas anteriormente na Améria Latina e em África: privatizações de setores essenciais, corte abrupto da despesa social, flexibilização da legislação laboral e austeridade recessiva. Sublinham-se dois traços nesta orientação. Em primeiro lugar, a insistência em resgates financeiros nacionais, insistindo portanto na tese de que a crise é resultado das políticas económicas nacionais dos Estados e não do sistema de regras que enquadra o euro como moeda única. Em segundo lugar, uma conceção da governação económica europeia baseada numa disciplina centrada no controlo do défice e da dívida pública, articulada com uma lógica intrusiva e penalizadora das opções orçamentais dos Estados-Membros que privilegiem o crescimento económico e a coesão social.
Enquanto veículo daquela conceção de governação económica da UE, a troika é por isso mesmo expressão da rejeição política de um modelo de coordenação económica europeia assente em dois pressupostos substancialmente distintos dos atualmente hegemónicos: por um lado, um orçamento comunitário com dimensão adequada ao financiamento das políticas necessárias à coesão territorial e social em escala comunitária; por outro, um mandato do Banco Central Europeu centrado sobre o financiamento do crescimento e do emprego e não sobre o controlo da inflação.
José Manuel Pureza