A crise degrada as condições de vida e o bem-estar, tornando as populações mais suscetíveis ao adoecimento físico ou mental. Mas nem todos são atingidos da mesma forma e com a mesma intensidade. Os idosos, os doentes crónicos, as famílias com baixos rendimentos, os desempregados de longa duração, os dependentes de apoios sociais, os imigrantes não legalizados e as suas famílias ou os sem-abrigo são apenas alguns dos que integram uma lista, que todos os dias se alarga, dos que são mais vulneráveis aos efeitos da crise. Inclusive não poupa uma parte crescente da chamada classe média, que, até há pouco tempo, se julgava protegida desses efeitos.
Esta situação é agravada por medidas tomadas pelos governos nacionais e impostas por entidades supranacionais como a União Europeia ou por organizações financeiras internacionais, que incluem a redução do investimento público nos sistemas de saúde e pela privatização destes (ou da sua gestão), o aumento de taxas moderadoras e a diminuição da comparticipação em medicamentos. Para além das limitações de acesso aos cuidados e do aumento da comparticipação dos cidadãos no seu pagamento, é imposta uma diminuição da quantidade e qualidade dos serviços prestados, em nome da saúde financeira do Estado.
Independentemente das justificações apresentadas, as atuais propostas de reforma dos serviços nacionais de saúde em diferentes países europeus, incluindo Portugal, configuram um processo de transformação da saúde num setor económico altamente lucrativo, com uma presença crescente e dominante do setor privado e da regulação pelo mercado, coexistindo com um sistema público reduzido, orientado principalmente para a assistência àqueles que não podem pagar. Em Portugal, o Serviço Nacional de Saúde é uma das mais importantes conquistas da democracia, e uma das expressões mais importantes da cidadania social e económica. A sua defesa aparece, por isso, no centro da ação cidadã de resposta à crise.
João Arriscado Nunes