O conceito de flexibilidade do mercado de trabalho, da legislação laboral, das relações de trabalho em geral, parte do pressuposto de que a rigidez, associada à proteção legal, dificulta o crescimento económico e o aumento da competitividade. A fixação do cânone da flexibilidade tem decorrido de um processo reformador institucionalizado desde a década de 1980, e acentuado no quadro da atual crise, através das propostas e estratégias de emprego sustentadas pela OCDE, Banco Mundial e FMI, BCE e União Europeia.
É possível identificar três registos nesta discussão. O primeiro, o dos defensores da dimensão social do trabalho e das relações laborais, para os quais o “ trabalho não é uma mercadoria” e, por essa razão, os trabalhadores carecem de uma proteção especial, a qual deve estar consignada na legislação laboral nacional e internacional. O segundo, o neoliberal – que tem estado a ser vencedor –, assente no princípio de que a flexibilidade e a adaptabilidade são inevitáveis e desejáveis, por convergirem com a defesa do princípio do mercado. O terceiro, o dos defensores de uma síntese entre a flexibilidade e a segurança que encontraram no conceito de “flexigurança” um modelo de reforma capaz de combinar a flexibilização do mercado de trabalho com mecanismos de proteção para os trabalhadores. Este último modelo despontou para o debate público em 2006, com a iniciativa da Comissão Europeia do Livro Verde: Modernizar o direito do trabalho para enfrentar os desafios do século XXI.
As controvérsias associadas a esta proposta oriunda da Terceira Via permanecem. No atual contexto de crise, uma versão musculada de flexibilidade vai afirmando-se, tendo por base uma retórica de proteção de direitos sociais mínimos, que tem como efeito uma harmonização regressiva, e conduzindo, em paralelo, ao processo de desmantelamento do edifício do direito do trabalho. Contrariamente ao que vem sendo defendido pela OIT, por sindicatos e ONG, o caminho seguido no designado combate à crise assenta na radical flexibilização das relações laborais e dos direitos dos trabalhadores.
António Casimiro Ferreira