Quando alguém nos faz um favor, nos cede um bem, ou simplesmente nos ajuda, dizemos “obrigado”. O gesto feito em nosso benefício obriga-nos a reciprocar no futuro. O “obrigado” proferido assinala que reconhecemos uma dívida. Este é o entendimento amplo de “dívida”. No entanto, a par deste, existe um entendimento mais estreito – comercial ou financeiro – que é evocado no caso de transações que não são saldadas no momento. O adiamento da contraprestação pode, ou não, ser acompanhado de um prémio atribuído ao credor pela espera. Contraem-se dívidas quando a contrapartida da prestação de serviços ou cedência de bens fica adiada ou quando se toma dinheiro de empréstimo.
As crises atuais têm a dívida no seu cerne. A dívida que em 2007 deu origem ao afloramento bancário da crise foi a de locatários de habitações adquiridas a crédito nos EUA, pressionados por amortizações e juros crescentes e pela desvalorização dos imóveis decorrente do rebentamento da bolha especulativa do imobiliário. Como estas dívidas haviam sido disseminadas por todo o sistema financeiro mundial, sob a forma de produtos financeiros derivados, o rebentamento da bolha do imobiliário transformou-se numa crise financeira sistémica. A contração do crédito que daí resultou fez com que a crise financeira se tornasse uma recessão económica à escala global.
Em consequência da recessão e dos resgates dos bancos pelos Estados, os défices e as dívidas públicas cresceram muito rapidamente. Nos EUA, a dívida cresceu de 62% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2007, para 101%, em 2011, no Japão, de 167% para 206%, no conjunto da União Europeia, de 66% para 88%. Embora a zona euro estivesse em melhor situação do que os EUA e o Japão, foi precisamente na União Europeia que eclodiu a chamada crise da dívida soberana. A partir de Março de 2010 as taxas de juro da dívida da Grécia, Irlanda e Portugal iniciaram uma escalada. Com taxas de juros proibitivas, os governos destes países escolheram procurar financiamento junto do FMI e da União Europeia, ficando sujeitos a programas de austeridade.
José Maria Castro Caldas