Com origem na Grécia Antiga, a cidadania irá desenvolver-se como uma das grandes conquistas da democracia moderna. Mecanismo de integração igualitária e participada, a cidadania rege a relação indivíduo-Estado mediante um conjunto de direitos e deveres recíprocos. Esta ideia moderna de cidadania resulta da politização dos direitos humanos emergentes da Revolução Francesa, com a transformação do súbdito em cidadão no âmbito dos novos Estados-nação.
A cidadania acompanha o desenvolvimento do capitalismo e dos grandes impérios coloniais e os ideais de igualdade e universalidade permanecerão imperfeitos durante muito tempo – que o digam os estrangeiros, as mulheres, os escravos, os súbditos imperiais e as classes baixas. Só no pós-guerra do séc. XX a cidadania defronta o capitalismo com a criação dos direitos sociais e do Estado-Providência (T.H. Marshall). Mas o papel do Estado como garante da cidadania foi sempre marcado pela ambiguidade entre o dever de proteção e a segurança. O ataque às Torres Gémeas inaugurou uma era de estado de exceção que instaurou um clima de medo propício à consolidação das regras do jogo do capital. A ansiedade com a segurança passa a esconder falhas de proteção no cenário da chamada crise global: de violações de privacidade e ataques às liberdades individuais à promoção de reformas estruturais que lesam os cidadãos nos seus direitos mais básicos à saúde, à educação e ao trabalho.
O Estado protetor deu lugar ao Estado indiferente, se não ameaçador, ele próprio refém dos mercados. Hoje, como têm demonstrado os vários movimentos de rua, dos ocupas aos indignados, a cidadania é a indignação ativa, que continua a exigir a atualização dos direitos.
Maria José Canelo