A autogestão é um modelo de organização coletiva, baseado num ideal de democracia direta, em que os trabalhadores asseguram, diretamente ou através de representantes, a gestão da empresa ou instituição a que pertencem. Trata-se de um sistema de governo em que os produtores são decisores no que respeita aos meios e aos fins da produção. É uma proposta social e politicamente mais ambiciosa do que a simples participação (que significa apenas intervir em estruturas preexistentes com finalidades pré-definidas), a cogestão (que significa partilhar responsabilidades de gestão apenas dos meios produtivos) ou o controlo operário (que significa conceder aos trabalhadores apenas o poder de supervisão sobre o processo produtivo).
Fazendo coincidir o fator trabalho com a propriedade dos meios de produção, a autogestão estabelece-se por oposição às relações clássicas de produção capitalista, baseadas num princípio de dependência e submissão recíprocas entre o proprietário dos meios e o produtor de valor a partir daqueles (ou seja, o trabalhador). O ideal democrático da autogestão constitui um projeto de transformação social em si mesmo, podendo a sua pretensão emancipatória estender-se para além do perímetro da empresa: comunidades locais, escolas, hospitais e serviços públicos em geral.
Uma das fontes dos desequilíbrios da economia atual é a total separação entre o capital que investe e o trabalho que produz, i.e., uma economia centrada nos fins e não nos meios. Em contexto de crise, a revitalização da atenção dada aos meios pode ser uma alternativa poderosa ao modelo capitalista dominante, permitindo que pequenas iniciativas locais respondam com eficácia e justiça às necessidades comunitárias. As experiências cooperativas são um bom exemplo de autogestão, ao tentarem manter sob controlo dos trabalhadores as decisões de gestão e a forma como a riqueza gerada é aplicada, reinvestindo na atividade coletiva e remunerando o trabalho, não o capital. A maior ameaça a um novo modelo de organização económica não é a ausência de interessados, mas o desconhecimento das soluções propostas pela tecnologia social e as possibilidades criadoras da nova economia solidária.
Filipe Almeida