Ao longo dos anos 80 do século XX, a Argentina conheceu um processo de baixo crescimento e elevada inflação. Enfrentando uma das maiores dívidas externas do mundo, os governos argentinos tentaram algumas iniciativas de estabilização dos preços. Em 1991, lançaram o Plano de Convertibilidade, adotando a paridade cambial do peso argentino com o dólar americano. O FMI e o Banco Mundial consideraram que se tratava de um exemplo a ser seguido pelos países periféricos. Entre 1992 e 1998, a economia cresceu ao ritmo de 6% ao ano. A privatização das empresas públicas, a desregulação do mercado de trabalho e a abertura incondicional ao capital externo resultaram na acumulação de um défice corrente de mais de 60 mil milhões de dólares, financiado por uma entrada de capitais de cerca de 100 mil milhões de dólares.
Em 2001, a situação atingiu o ponto de rutura com a fuga maciça de capitais. O FMI colocou o país em default, anunciando que não daria nem mais um dólar à Argentina sem que fosse definido um programa económico sustentável. As medidas destinadas a alcançar o “défice zero” sob intervenção do FMI previam duros ajustes, que desencadearam a contestação social.
A 24 de dezembro de 2001, o presidente Saá, declarou a suspensão dos pagamentos de todos os instrumentos de débito. Em janeiro de 2002, o governo argentino decretou o fim da convertibilidade, o que se traduziu na pesificação da economia e numa forte desvalorização cambial. A crise política consumiu quatro presidentes em pouco mais de uma semana. Em 25 de maio de 2003, Néstor Kirchner assumiu a presidência, defendendo a tese da corresponsabilidade dos investidores privados, do próprio FMI e das demais organizações financeiras internacionais na formação da dívida. Em março de 2005, 76,07% dos credores privados concordaram com a proposta de reestruturação da dívida apresentada pelo governo, apesar de representar uma perda de cerca de 73% face ao valor original dos títulos. O FMI classificou de “muito bom” o resultado da troca da dívida externa argentina.
A forma como a Argentina negociou a reestruturação da dívida externa, sem a intervenção do FMI, abre a possibilidade de outros países encararem o incumprimento como uma opção política.
Margarida Gomes