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Economia do sistema comunitário
- Objecto de investigação e divulgação
Carlos Armando Gonçalves Gomes
O conhecimento mais aprofundado dos fenómenos económicos
sucede-se à grande expansão do comércio mundial,
após a abertura das rotas marítimas do Atlântico ao
Pacífico e, mais tarde, e ao irromper da Revolução
Industrial, ou seja, coincide com o próprio advento do capitalismo.
Apareceram então grandes pensadores que erigiram as bases desta
nova ciência da área sociológica. Tal não significa
que, muito antes, numerosos pensadores, filósofos, sociólogos,
teólogos ou historiadores, não se tivessem interessado em
analisar com profundidade a influência dos factores de natureza
económica na formação e na evolução
das sociedades humanas. Porém, a bibliografia económica
existente tem-se quase limitado a dar a conhecer os fenómenos económicos
ou financeiros inerentes ao próprio sistema capitalista e à
sua evolução, ou a debruçar-se apenas sobre temas
de gestão empresarial.
Poderá concluir-se que a investigação económica
tem assumido uma atitude restritiva ou apologética de uma ordem
social predefinida; não abrange todos os sistemas e estruturas
que se interligam e sucedem umas às outras, no tempo e no espaço;
não incluem todos os povos, limitando-se apenas a analisar aqueles
que, numa determinada época histórica mais intensamente
participam numa fase do desenvolvimento mundial, como é o caso
do Continente Europeu. Fica de fora a investigação sobre
as formações económicas e sociais anteriores ao sistema
capitalista, com excepção do modo de produção
feudal e, mesmo neste caso, limitada ao espaço social europeu.
Vários economistas e historiadores têm reconhecido que o
facto de não ter sido ainda suficientemente estudado em pormenor
a economia do sistema comunitário, e a de alguns modos de produção
surgidos em períodos posteriores, cria dificuldades extremamente
sérias aos investigadores.
Os avanços adquiridos na investigação da história
e da antropologia, da sociologia e da tecnologia, e a divulgação
do seu conhecimento a nível mundial, permitem aprofundar muitas
áreas da ciência económica com novos dados que não
estavam disponíveis há um século atrás. Torna-se
viável ultrapassar muitas das limitações existentes
e reanalisar a ciência económica de uma forma abrangente,
extensiva a todos os continentes, a todas a civilizações,
épocas históricas e modos de produção. Desses
novos conhecimentos surgem muitas interrogações susceptíveis
de preocupar os investigadores que se ocupam das áreas sociológicas.
Com a deslocação das populações e a sua fixação
em regiões favoráveis à satisfação
dos seus meios de vida começa a despontar um traço específico
histórico que é o desenvolvimento desigual. Os povos passam
a encontrarem-se em níveis diferentes de civilização,
uns a evoluírem com mais lentidão e outros a adiantarem-se
no seu desenvolvimento. Porém, a diferença reside basicamente
no início temporal dos modos de produção subsequentes.
Por outro lado, surgiram complicadas interacções, os povos
receberam muitas influências do exterior, assimilaram técnicas,
crenças, costumes que adaptaram ao seu meio e circunstâncias
locais.
A evolução da humanidade não pode conceber-se como
um processo de crescimento idêntico ao de um corpo orgânico
passando por várias fases cada uma das quais substitui inteiramente
a anterior. Cada nova formação adquire um papel preponderante,
mas nela permanecem processos produtivos e relações sociais
existentes na formação anterior e anunciam-se os novos elementos
da formação futura. Depois da comunidade primitiva, em cada
período histórico e em espaços determinados, têm
coexistido vários modos de produção, um dos quais
é dominante. O aparecimento de novos modos de produção
não conduz ao desaparecimento automático dos anteriores.
É de concluir que há um amplo material para ser objecto
de investigação e divulgação que pode interessar
aos economistas e ser tema de futuros debates.
Candongeiros, kinguilas, roboteiros e zungueiros
uma digressão pela economia informal de Luanda
Carlos M. Lopes (CEA/ISCTE)
carlosele@yahoo.com
As actividades informais constituem sem dúvida um tema de inegável
interesse, embora controverso.
Nos países da África ao Sul do Sara, as actividades informais
adquiriram um carácter estruturante, quer das economias quer das
sociedades.
Em Luanda, como noutras capitais africanas, tem-se verificado um contínuo
crescimento da economia informal.
As actividades económicas informais têm-se revelado cada
vez mais importantes para assegurar o acesso à ocupação
produtiva, aos rendimentos e à inserção socioeconómica
dos seus agentes e dos respectivos agregados familiares para os quais
constituem, com grau de importância crescente, uma das principais
fontes de recursos financeiros, materiais e sociais.
Trata-se de uma realidade complexa, heterogénea e em acelerada
transformação, na qual coexistem, em contextos híbridos,
elementos da ordem sociocultural endógena com os valores, modelos
e padrões comportamentais que emanam da ordem sociocultural global.
É neste enquadramento ambiental que evoluem e são condicionados
os comportamentos e as práticas económicas dos diversos
actores da economia informal.
Neste texto, que tem como suporte informação empírica
recolhida em Luanda entre Setembro e Dezembro de 2003, são apresentadas
quatro actividades diferentes e são caracterizados os seus intérpretes,
com o objectivo de desmistificar algumas das ideias preconcebidas mais
cristalizadas em torno do fenómeno informal e de suscitar algumas
pistas para reflexão sobre uma realidade ainda tão insuficientemente
conhecida.
Etnias e redes sociais na concepção da empresarialidade
Anabela Soriano Carvalho
(ISEG, Universidade Técnica de Lisboa)
Na sequência da herança dos clássicos, Weber, Sombart,
Schumpeter ou Marx, entre outros, a figura do empresário capitalista
tenderia a desaparecer quer pela perda do Ethos capitalista quer pelas
qualidades psicológicas que o caracterizavam enquanto figura singular
no exercício da actividade económica capitalista. Por sua
vez, as próprias características do desenvolvimento do capitalismo
assumindo uma dimensão cada vez mais rotineira e burocratizada
tenderia não só a fazer desaparecer o clássico "capitão
da indústria", substituindo-o pelo gestor~funcionário,
mas igualmente os pequenos e médios empresários nos diversos
sectores da actividade económica.
Esta representação manteve-se praticamente intocável
durante a primeira metade do séc. XX, apesar das reformulações
realizadas pelo estruturo funcionalismo e pela própria teoria económica.
É apenas com a crise do fordismo, que os cientistas sociais se
voltam para uma realidade que sempre existiu: a capacidade empresarial
das designadas minorias étnicas. Da problemática da assimilação
e da homogeneidade do mercado de trabalho passa-se 11 admitir que nem
todos os -imigrantes se destinam às profissões mais baixas
da escala social. Os chamados recursos étnicos conotados com a
tradição e consequentemente como obstáculos à
modernidade permitem observar a sua capacidade em constituir aquilo que
alguns autores designam por economias étnicas e/ou economias de
enclave. Família, redes de parentesco, empréstimos "informais",
códigos de honra e lealdade são, entre outros, os recursos
de que se servem estes empresários no desenvolvimento dos seus
negócios. Recursos estes que não são, no entanto,
exclusivos das "minorias étnicas" como prova, por exemplo,
o chamado modelo da "Terza Itália."
A formação do capital social em uma comunidade
de baixa renda
Breno Augusto Souto-Maior Fontes
Klaus Eichner
Este artigo objetiva analisar as inserções em redes egocentradas
de indivíduos de uma comunidade de baixa renda na cidade do Recife.
A partir de algumas considerações iniciais sobre redes egocentradas,
ensaiamos uma análise de redes construídas em uma comunidade
de baixa renda. Os dados de que dispomos para análise foram extraídos
de uma pesquisa empírica em uma comunidade de baixa renda na cidade
do Recife. O nosso objetivo é verificar o quão de particular
existe nessas populações de baixa renda, e o que se pode
extrair de regularidades em redes egocentradas, e também observar,
a partir de índices de capital social construídos, que posições
diferenciadas na estrutura social podem existir quando se introduz a variável
"rede social". Interessa-nos particularmente discutir as hipóteses
de FLAP sobre relações sociais como recursos ou como capital.
Os índices construídos nos remeterão a três
grandes blocos de questões: (a) o número de relações
onde se inscrevem capacidades potenciais para ajudas; (b) a extensão
das redes de ajuda, função da intensidade das relações;
e (c) os recursos que podem ser alocados a partir dessas relações.
As bases empíricas desse artigo dizem respeito a informações
extraídas de redes egocentradas da comunidade de Chão de
Estrelas, Recife. Foram aplicados 295 questionários, a partir de
amostra aleatória simples em um universo de 1.131 domicílios
(sendo escolhida uma pessoa adulta por domicílio).
As igrejas zione e a cooperação comunitária
no processo de guerra e pós-guera em Moçambique
Jonas Mahumane (Centro de Estudos Africanos - Universidade Eduardo Mondlane)
jonasmahumane@yahoo.com.br
A guerra entre a Frente de Libertação de Moçambique
(Frelimo) e a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) desestabilizou
o tecido social e humano e contribuiu em parte para aumentar as injustiças
e desigualdades sociais em Moçambique. Esta situação
foi agravada pelos processos de transição e pelo impacto
das políticas de globalização em curso.
No âmbito desta conjuntura, a presente comunicação
pretende fazer uma abordagem sociológica sobre o papel assumido
pelas instituições religiosas destacando a forma como as
igrejas Zione se envolveram na procura de soluções ou mitigação
das carências sociais e económicos das populações
em Moçambique. Faz-se uma análise dos problemas enfrentados
no pós - independência, como a adopção de políticas
socialistas, a eclosão da guerra e o liberalismo vigente e a consequente
desorganização do Estado devido a crise social e económica
nos anos 80 e 90.[1] Nesta base, considera-se o envolvimento das igrejas
Zione na procura de soluções para os problemas que afligem
a sociedade, como parte de um conjunto de estratégias adoptadas
pelas populações para fazer face aos efeitos da guerra e
combater a exclusão social e económica crescente em Moçambique.
Esse envolvimento é simbolizado sobretudo pela capacidade que as
igrejas Zione têm de criar e desenvolver formas e mecanismos endógenos
de cooperação e solidariedade como resposta às dificuldades
sociais e económicas das populações.
Este estudo fundamenta-se em fontes secundárias, entrevistas semi
- estruturadas realizadas no Distrito de Homoíne, Província
de Inhambane, no Sul de Moçambique. Recorre também a avaliação
dos dados colectados na observação indirecta feita durante
o processo de pesquisa.
Depois da contextualização do problema, a pesquisa descreve
no primeiro capítulo, o processo de surgimento e expansão
das igrejas Zione em Moçambique, em particular na Província
Sul de Inhambane. No segundo capítulo, analisam-se as relações
entre as igrejas Zione e a comunidade e tenta determinar o seu lugar no
conjunto de mecanismos comunitários de cooperação
e e solidariedade.
Famílias na periferia de Maputo: o social nas estratégias
económicas, o económico nas relações sociais
Ana Bénard da Costa (Centro de Etnologia Ultramarina, Instituto
de Investigação Científica e Tropical, Lisboa)
asbbc@yahoo.com.br
Nesta comunicação analisam-se os processos através
dos quais famílias, residindo em bairros da periferia de Maputo,
obtêm e gerem os rendimentos e produtos necessários à
sua sobrevivência e reprodução social. Num primeiro
ponto definem-se, e caracterizam-se, as estratégias económicas
das famílias dando particular atenção à dinâmica
de relações sociais e de tipos de "troca" que
estas implicam no universo em análise. Ainda neste ponto, defende-se
a necessidade de, nesta análise, se ter em consideração
todos os recursos e relações sociais que podem ser mobilizados,
bem como as diferentes formas possíveis de acesso a esses recursos
e de desenvolvimento dessas relações. O segundo ponto centra-se
sobre as actividades geradoras de rendimentos e produtos desenvolvidas
por mulheres e a sua importância nos orçamentos familiares
e questionam-se as eventuais modificações nas relações
de género daí decorrentes. Por último, e reportando-se
a dados empíricos relativos a actividades geradoras de rendimentos
e produtos desenvolvidas por membros de duas famílias, esta comunicação
reflecte sobre as diferentes formas de gestão e coordenação
existentes nestas famílias e sobre as relações de
poder daí decorrentes.
Uma análise da cultura brasileira na microempresa informal
familiar
Thiciane Mary Carvalho Teixeira (Universidade Estadual do Ceará)
No Brasil, o apoio, através de programas de crédito, às
microempresas informais é justificado por representar o segmento
de maior participação demográfica no contexto da
economia, abrangendo quase metade da população economicamente
ativa. Isto representa mais de 20 milhões de brasileiros, seja
os trabalhadores sem registro em carteira e os auto-empregos, representados
pelas micro-empresas informais. Estima-se que essas atividades produtivas
industriais e familiares do setor informal têm contribuído,
não apenas para o PIB, ao comprar insumos, produzir, trocar, vender,
prestar serviços, tal como as empresas do setor formal, mas, sobretudo,
para diminuir as tensões sociais. Essas atividades compõem
a economia informal porque não existem, quer do ponto de vista
oficial, quer do ponto de vista jurídico e contábil.
Esse pesquisa parte da análise das micro-empresas informais, cujo
trabalho é eminentemente familiar, considerando a dicotomia espacial
"casa x rua" (ver em DaMatta, 1997), como uma reflexão
de proprietário e parente se confundem, gerando conflitos gerenciais,
capazes de comprometer o crescimento do negócio. Deste modo, considerou
que as relações de autoridade e controle, no conflito "casa
e rua", já que o local de trabalho dessas micro-empresas é
o mesmo espaço da casa, gerando duplo vínculo e comportamentos
distintos, contextualizando-se dentre as características da cultura
brasileira.
O objetivo é avaliar se a superposição da relação
familiar e profissional dentro da microempresa informal familiar constitui
um dos fatores responsáveis para o insucesso dos programas de apoio
financeiro ao setor informal, através da inadimplência.
Metodologicamente, o trabalho é resultado de uma pesquisa de campo
realizada através de entrevistas com microempresários informais
contemplados com crédito, através do programa PROGER, no
Estado do Ceará. A pesquisa levantou dados relacionados a mão-de-obra
familiar, características da microempresa, situação
financeira e conflito em ambas as situações de adimplência
perante ao financiamento. Este trabalho é assim composto de pesquisa
documental, bibliográfica e de campo. A análise dos dados
se dá através de métodos qualitativos e quantitativos,
entrevistas e questionários junto aos micro-empresários.
Somente através da analogia entre os dados coletados nas microempresas
inadimplentes e nas adimplentes foi possível responder a pergunta
sobre as razões da inadimplência. Os resultados constataram
que as microempresas informais familiares pesquisadas não reconhecem
os problemas profissionais junto aos membros da família, produzindo
os primeiros conflitos gerenciais relacionados à obediência,
tempo de trabalho e utilização do lucro da micro-empresa.
Não se pode afirmar que a estrutura familiar da micro-empresa informal
constitui a causa determinante para a situação de inadimplência,
já que há também micro-empresas informais familiares
que convivem com as mesmas desvantagens do trabalho em família
e estão em situação de adimplência.
O painel quer assim verificar pesquisas similares realizadas em outros
locais sobre esta temática. Quais as similitudes e diferenças
que existem entre a estrutura familiar das micro-empresas e sua situação
perante os programas de micro-crédito? Como está a relação
adimplência, inadimplência? O painel além da inadimplência
analisará os efeitos culturais
Relativos ao gerenciamento das micro-unidades familiares, que são
a maioria das empresas nos países em desenvolvimento
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