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Pontos de transição
e mudança social: discursos práticas e trajectos na construção
do campo cultural português
Helena Santos (Faculdade de Economia da Universidade do Porto)
O carácter tardio da modernidade cultural portuguesa revê-se
na frágil estruturação do campo de produção
e criação cultural e na sua chegada recente à institucionalização
política. O 25 de Abril de 1974 constitui uma incontornável
referência para a actual dinâmica cultural na sociedade portuguesa,
marco de vida para uma parte importante dos actuais protagonistas de criação
e produção e das redes múltiplas em que se inserem.
Utilizaremos materiais recolhidos através de um trabalho de campo
que teve lugar na segunda metade dos anos 990, centrado na cidade do Porto,
nalguns segmentos prolongado para lá daquele marco temporal. Procuraremos
apreender algumas das marcas herdadas de uma história recente e,
como afirmámos, ainda viva - de um tempo em que a cultura, a arte
e a política se mesclavam profundamente na vida individual e social.
Privilegiámos, assim, o recurso a depoimentos individuais, obtidos
através de entrevistas em profundidade (cerca de três dezenas),
destinados à reconstituição de trajectórias
sociais, no plano biográfico-profissional, e das suas relações
com a emergência de alguns espaços de expressão artística
da cidade.
Alguns dos entrevistados não detêm, actualmente, qualquer
actividade artística. Uma parte importante exerce actividades indirectamente
de criação. Nuns casos, exprimem claras refracções
de trajectória dentro do campo cultural, em áreas como a
promoção, gestão, produção e pós-produção,
programação, suporte técnico, escrita e adaptação
de argumentos - classificações profissionalizantes que fazem
hoje mais sentido do que há quinze ou vinte anos, e que por isso
nem sempre correspondem aos estatutos profissionais auto-designados. Com
menor ambiguidade classificatória, mas segundo idêntido processo
de refracção, encontramos alguns que protagonizam hoje actividades
de mediação e formatação institucional-política
no campo cultural. Noutros casos, dão conta sobretudo do prolongamento
de relações informais fortemente personalizadas, herdadas
de anteriores partilhas de percursos fundadores de iniciativas e organizações.
Para estes, a sua acção, quando reconhecida (e eventualmente
valorizada para lá do plano simbólico), representa-se essencialmente
como do domínio das relações afectivas.
Uma outra parte, não menos importante, permanece activamente na
criação, relativamente exterior aos circuitos institucionais,
prolongando na sua maioria uma espécie de marginalidade artística,
expressão de recusa ou incapacidade de identificação
com os novos formatos da implicação social da cultura.
Não se tratará maioritariamente, portanto, de protagonistas
"classificados", isto é, de "artistas", e,
como intentámos referir, as suas implicações recentes
nos espaços de criação não são idênticas.
Todos eles, porém, tendem a constituir uma rede de percursos cruzados
fortemente implicada na reconfiguração das artes que se
seguiu à revolução de Abril - compondo o que, noutro
lugar da investigação que nos serve de suporte, designámos
como parte de uma "primeira geração". Esta possibilita-nos,
ainda, a oportunidade de reconstituir alguns germes de iniciativas (então)
futuras, especialmente, mas não apenas, na cidade do Porto.
É por esta última via, essencialmente "geracional",
que cremos na pertinência de analisar elementos dos seus discursos,
práticas e trajectórias, com o objectivo desenvolver um
esboço interpretativo em torno de algumas transições
que se imprimem e exprimem na nossa contemporaneidade.
O contributo histórico-geográfico do Concelho de
Lamego no desenvolvimento da Região Demarcada do Douro.
Lucília Pereira (Escola Superior de Educação
de Viseu, Instituto Politécnico de Viseu)
Localizado na região de Trás-os-Montes e Alto Douro, numa
zona rural profunda, com um relevo e um clima pouco atractivos, o concelho
de Lamego tem vindo a sofrer, nas últimas décadas, perda
de população devido ao êxodo rural, à emigração
e ao declínio das sociedades rurais ainda aí existentes.
Com um património natural e construído capaz de constituir
uma forma complementar de rendimento aos agricultores através do
seu aproveitamento para o turismo em espaço rural, pode, através
dele, contribuir para o tão preconizado desenvolvimento rural sustentável,
por forma a que os agricultores possam usufruir dum rendimento adicional
que lhes permita elevar a sua qualidade de vida ao mesmo tempo que cria
outro tipo de emprego obstando, assim, à saída de contingente
humano para as zonas litorais.
Possuindo um total de 12 casas de Turismo em Espaço Rural, estas
têm vindo a registar uma notória evolução desde
1979 até 2002 oferecendo, aos turistas que as procuram, espaços
de lazer, quer internos, quer externos, sendo procuradas, preferencialmente,
por classes etárias compreendidas, na sua maioria, entre os quarenta
e cinco e os sessenta e quatro anos.
Com objectivos bem definidos, estas unidades TER pretendem, acima de tudo,
resolver problemas ligados aos aspectos sociais e económicos familiares,
divulgação da região e dos produtos produzidos e
cultivados na quinta, proporcionar repouso aos turistas em ambiente rural
e obter ajuda para recuperação e manutenção
do edifício apesar de só algumas terem beneficiado de apoios
financeiros.
Quanto à desertificação demográfica e à
pobreza do concelho, apesar das características históricas,
ambientais, patrimoniais e culturais capazes de a tirar do subdesenvolvimento
a que tem estado votada nestes últimos cento e cinquenta anos,
o facto é que isto não acontece e a comprová-lo estão
os censos analisados e referentes aos últimos quarenta anos onde
se pôde verificar nitidamente a perda de população
que o concelho tem vindo a sofrer informando-nos que o turismo que se
tem vindo a registar e a aumentar no concelho pouco ou nada tem contribuído
para melhorar o nível económico e social da população
obrigando-a a abandonar o concelho em detrimento das zonas mais atractivas
do litoral e do estrangeiro.
As lacunas responsáveis por tal situação prendem-se,
essencialmente, com os graves problemas ao nível das infra-estruturas
e concernentes à ausência de divulgação e apoio
aos produtos da região e às tradições gastronómicas,
(re)qualificação dos recursos humanos, criação
de espaços de lazer e recreio capazes de atrair o turista, graves
problemas ao nível das acessibilidades, ausência de sinalização
adequada e falta de participação e envolvimento das entidades
e actores sociais locais e regionais.
Com estas enormes carências, o Turismo em Espaço Rural no
concelho de Lamego, criado para contribuir para a resolução
dos graves problemas económicos, sociais e demográficos
da região não tem atingido os objectivos pretendidos permanecendo,
esta, na mesma situação de pobreza e desertificação
que tanto a tem caracterizado ao longo de todos estes anos.
Sou daqui, da Caieira da Barra do Sul: espaço e parentesco
como definidores de pertença entre os nativos de uma comunidade
ao sul do Brasil
Raquel Wiggers (Universidade Estadual de Campinas)
raqwig@unicamp.br
A Caieira da Barra do Sul é um bairro de Florianópolis,
localizado as margens da baía que se forma entre a ilha e o continente,
no sul da Ilha de Santa Catarina (Brasil). Ele guarda algumas características
de sua colonização por famílias provenientes das
Ilhas dos Açores ocorrida no fim do séc XIX. Até
poucos anos atrás a principal atividade econômica das famílias
residentes no bairro era a pesca e o cultivo da terra. Devido à
distância de aproximadamente 30 km entre o bairro e o centro de
Florianópolis - capital do Estado de Santa Catarina - e porque
o acesso apenas era possível por mar ou por uma trilha no mato,
naquela praia desenvolveu-se uma comunidade relativamente isolada das
regiões urbanizadas da cidade. Em 1975 uma estrada foi aberta,
que favoreceu a integração entre estes moradores nativos
e pessoas provenientes de diversos outros lugares da cidade, do Brasil
e do mundo, que buscaram o bairro para morar e, em sua maioria, para construir
suas casas de veraneio. Foi a abertura da estrada que trouxe estes novos
moradores, permanentes ou sazonais, que através da compra de terrenos
das famílias nativas, estabeleceram um novo tipo de relação
que favoreceu o contato daquela população com elementos
da urbanidade, e promoveu a aceleração de um processo de
modificações econômicas, sociais e culturais importantes
para a dinâmica social da comunidade. Assim, com o acesso à
cidade facilitado, os moradores "nativos" foram deixando de
ser agricultores e passaram a se dedicar à prestação
de serviços nas áreas centrais da cidade e nas casas dos
moradores "de fora", tornando-se assalariados.
A relação entre os "daqui" e os "de fora"
não carrega em si qualquer tipo de rivalidade a priori que faça
a convivência entre eles ser conflituosa, no entanto a distinção
existe, que aponta principalmente para diferentes formas de pertença
à comunidade. Foi justamente a análise destas distintas
pertenças que motivaram a pesquisa de campo desenvolvida no ano
de 2003.
Os moradores e veranistas "de fora" constroem suas narrativas
sobre sua relação com o lugar que escolheram para viver
ou passar as férias, baseados principalmente em aspectos que os
remetem ao futuro, à qualidade de vida e ao lazer. A tranqüilidade
e a preservação ambiental foram os argumentos usados por
todos os entrevistados para morarem no bairro ou terem ali uma casa.
Ao privilegiar a visão dos moradores "nativos" foi possível
distinguir dois eixos essenciais para análise da pertença:
o tempo e o espaço. As definições espaciais associadas
às relações de parentesco são cruciais para
definição de um sentimento de pertença, importante
para a própria configuração atual do bairro. A pessoa
"daqui" é formulada com base em memórias ancoradas
espacialmente, definidas e delimitadas pelas relações de
parentesco e pelas casas em que nasceram e passaram as primeiras fases
da infância. Também é fundamental para a construção
desta pessoa a proveniência dos seus pais e de seus avós.
O espaço é um lugar praticado por diferentes atores, rememorado
em narrativas com bases genealógicas que lançam os fundamentos
para as sociabilidades atuais.
Enquanto os "de fora" voltam-se para o futuro e para valores
compartilhados por segmentos das classes médias urbanas, como a
qualidade de vida, os "daqui" voltam-se para os antepassados
e para questões territoriais, como o conjunto de residências
em que nasceu, a casa em que foi criado.
Musica em movimento: os palcos do espectáculo musical em
Portugal
Paula Abreu (CES/FEUC)
pabreu@fe.uc.pt
A comunicação propõe-se apresentar e discutir algumas
das linhas de estruturação das dinâmicas territoriais
dos mercados urbanos da cultura em Portugal. Essa reflexão será
feita tendo a forma como essas dinâmicas reflectem tensões
inerentes às lógicas das esferas da criação/produção
cultural e às prioridades impostas pela globalização
dos mercados da cultura, mas também as sinergias estabelecidas
entre as esferas da acção cultural e da acção
política, quer à escala nacional, quer à escala local.
A discussão far-se-á a partir da análise do caso
particular do mercado do espectáculo musical no nosso país,
recorrendo a dados produzidos no âmbito de um projecto de investigação
realizado no CES/FEUC e recentemente finalizado. Os resultados produzidos
possibilitam a identificação de traços marcantes
relativos à geografia, aos tempos e aos contextos da produção
de espectáculos musicais, permitindo a sua discussão no
âmbito das principais linhas de estruturação das actuais
políticas culturais (centrais e locais) e da esfera cultural no
nosso país.
Como olhar o património, hoje
Eduardo Jorge Esperança (Universidade de Évora)
Os anos noventa do séc. XX viram a generalidade dos temas relacionados
com o património cultural atingir o seu auge de notabilidade social.
A simples referencia ao tema suscitava a atenção. Nesta
primeira década do sec. XXI assistimos a um processo de maturidade
dos entusiasmos, boas práticas e más acções
em volta do património. Que avanço ou novo olhar é
necessário empreender para abordar as questões patrimoniais
hoje?
Mudaram alguns contextos; o panorama neo-liberal acentuou-se, em particular
o modo de olhar a patrimonialização sustentável dos
objectos que se queiram preservar. Mas não é apenas no vector
económico que os factos deslizam para esta configuração;
este quadro geral induz outras alterações, em particular
nos quadros nuclerares dos valores que sustentam as acções
e práticas que envolvem a patrimonialização sustentável…
Palavras-chave: patrimonialização sustentável; valores;
comunicação; nova economia
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