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Adentrando a proximidade
policial
Vera Mónica da Silva Duarte (universidade do Minho)
Hodiernamente, vocábulos como proximidade, parceria, orientação
para os problemas e 'contratualização local' integram a
generalidade dos discursos e são sintoma da evolução
das sociedades e da emergência de novas atitudes face aos direitos.
Falamos de justiça de proximidade, de políticas de proximidade,
porque não, de polícia de proximidade...
Esta preocupação cada vez maior com o cidadão e a
aproximação entre as necessidades sociais e os objectivos
policiais requer um novo modo de 'fazer polícia', uma polícia
mais próxima que ajude a amenizar as tensões locais e que
altere a forma reactiva de intervir, interiorizando uma perspectiva de
natureza mais proactiva, de cooptação e cooperação.
A reorientação estratégica para funções
de serviço à comunidade exige que se repense o modelo organizacional
burocrático da Polícia, de modo a combater as consequências
imprevistas e indesejadas que têm conduzido a uma crise de eficácia
e de legitimidade social, agravada por um contexto social delitógeno,
produtor de violências e inseguranças.
Sabemos que o antigo modelo organizacional da polícia está
condenado a não ser capaz de dar resposta às demandas de
um ambiente completamente diferente, mas sabemos também que aos
governos têm faltado condições para atender eficientemente
a todos os pedidos da sociedade. Sobram pressões para que a sociedade
seja melhor, manifestando-se crucial que as organizações
sejam eficientes no uso racional dos recursos, eficazes na produção
dos resultados e transparentes na prestação de contas. O
que é pedido é que se produza mais com o que se tem e, se
possível, com redução dos recursos. Para tal, as
soluções são assustadoras, quer para a burocracia
governamental, que parece não estar ainda em condições
de dotar as forças policiais de maior autonomia e discricionaridade
para encetar estratégias de prevenção, quer, especificamente,
para as burocracias policiais que tentam conservar a integridade profissional
mantendo uma subcultura policial eivada de valores de autonomia e de profissionalismo
corporativista desajustados com os valores da proximidade e da cooperação.
Importa romper com o ciclo de ineficácia, mas com a consciência
de que a optimização da função policial deve
ser estruturante e estruturada, atravessando toda a cultura organizacional
e actualizando-se nas práticas diárias que corporizam a
missão da organização. Destarte, compreender as estruturas
de significado, as imagens e os discursos sobre a cultura policial e a
forma como essa identidade própria marca as subculturas ocupacionais,
afigura-se como um desafio caracterizado pela complexidade, mas crucial
para que a organização policial possa dispor de uma cultura
adequada para enfrentar e ultrapassar quer os problemas de adaptação
ao seu meio externo (crescimento das cidades, aumento da insegurança,
(des)equilíbrios demográficos e respectivas repercussões
sociais, enfraquecimento dos meios de controlo informais, aumento das
taxas de criminalidade, violência e cifras negras), quer os problemas
de integração do seu meio interno (excesso de burocratização,
problemas ao nível da avaliação de desempenho e promoção
de carreira, limitações orçamentais incompatíveis
com as exigências no campo da modernização dos equipamentos,
subsídios de risco...) . Convém ressaltar que a cultura
organizacional pode constituir uma vantagem, mas também um obstáculo
à tão propalada proximidade que se enforma na semiologia
interpretativa da relação eu/outro.
Esta reflexão tem vindo a inspirar uma investigação
desenvolvida no âmbito da minha dissertação de mestrado
em Sociologia: Especialização em Organizações
e Desenvolvimento de Recursos Humanos, intitulada "Ser polícia:
contributos para o estudo da cultura organizacional da Polícia
de Segurança Pública". Proponho-me apresentar, no Congresso,
alguns dos resultados entretanto obtidos.
Espaço e crime: manifestações e percepções
em uma cidade média brasileira
Sueli Andruccioli Félix (UNESP - Universidade Estadual Paulista
"Júlio de Mesquita Filho"
sueli.felix@uol.com.br
A "Revolução da Geografia Humana" (anos 70) propagou
a idéia de que fazer Geografia é preocupar-se com os grandes
problemas sociais, ultrapassando análises do crescimento demográfico,
da expansão espacial e da identificação de funções
econômicas. Não são os valores numéricos crescentes
que indicam os problemas urbanos, mas os processos de distribuições
espaciais irregulares, os níveis de concentração
e, sobretudo, o grau de velocidade das suas transformações.
Na pauta das preocupações geográficas estão
os processos sóciopolíticos, os conflitos de classes, os
comportamentos e as formas de percepção social, política
e econômica do espaço.
Pesquisando a relação espaço/crime em uma cidade
média brasileira - Marília/SP, dentro da linha teórica
da Geografia da Percepção (Humanista) de Yi-Fu Tuan, nota-se
uma espécie de seletividade temporal: enquanto no momento da ocupação
os espaços de população de baixa renda exibiram altos
índices de criminalidade, à medida que o tempo de ocupação
aumentou e o espaço se transformou com as reformas (ampliações)
nas residências, surgiram os movimentos organizados para reivindicar
melhorias estruturais e diminuíram os distúrbios sociais
e até mesmo a criminalidade.
Sentimento de territorialidade e interação social da vizinhança
são elementos positivamente relacionados entre si e contribuem
na redução da sensação de medo e insegurança.
As pessoas tendem a julgar a qualidade do seu ambiente muito mais pelo
relacionamento com os vizinhos que pelas condições físicas.
Excetuando-se alguns poucos condomínios, de um modo geral a classe
média não sente o seu bairro como extensão do lar,
mas apenas como um pedaço de terra, cuja qualidade afetará
o valor comercial do seu imóvel. Em contrapartida, a classe baixa,
principalmente a operária, sente o seu bairro (com os seus espaços
de recreação, bares e centros comunitários) como
um segmento de seu lar. A rua também é percebida como um
elemento comum do sentimento de vizinhança.
A migração também é um processo que atomiza
as estruturas e enfraquece a coesão social, um forte componente
da convivência pacífica entre os homens. A dinâmica
migratória, externa ou intra-urbana, não apenas transfere
pessoas, mas problemas, necessidades, valores e expectativas, e por espaços
diversos. Ainda que em alguns casos proporcione boas condições
de vida ao migrante, regra geral propicia a eclosão de uma gama
de problemas relacionados à desintegração dos laços
sociais - exclusão e violência.
Analisando a relação espaço/crime sob outro prisma,
percebe-se que a dinâmica criminal é um dos fatores de transformação
e reorganização espacial (o crime transforma o espaço
e seus significados). A manifestação espacial do crime altera
valores e percepções espaciais, deteriora os espaços
urbanos, altera os níveis de concentração ou esvaziamento
e cria espaços de medo, tão bem explorados pelo marketing
imobiliário e até eleitoreiro.
Excetuando-se a região central da cidade, com a criminalidade característica
de oportunidades e adensamentos temporários, a dinâmica criminal
exibe especificidades óbvias: enquanto os espaços de ocorrências
de crimes patrimoniais caracterizam-se por níveis elevados de renda,
educação, e boa qualidade de vida, em geral, os espaços
de residência dos criminosos são os de condições
sócio-econômicas muito precárias.
Sem dúvida, o espaço não é um gerador de problemas
per se e nem deve ser privilegiado em detrimento da dimensão social,
base dos problemas criminais. Porém, há concentrações
de crimes e de criminosos, e a identificação desses espaços,
geográfica e socialmente delimitados, propicia a intervenção
do poder público e o desencadeamento de políticas públicas
que vão desde a prevenção primária de atendimento
às necessidades humanas básicas até a reestruturação
urbana (prevenção secundária) Os programas de base
exclusivamente espacial (de área) podem favorecer a prevenção
temporária do delito, deslocando-o para outras áreas, mas
não agem na raiz da questão criminal, que é essencialmente
social.
Polícia e comunidade: conflitos e consensos
Marceu Dornelles Toigo (Universidade Estadual Paulista)
marceu@click21.com.br
Drª. Sueli Andruccioli Felix (Universidade Estadual Paulista)
sueli.felix@flash.tv.br
O atual cenário social brasileiro apresenta a 'equação
binômia' violência e criminalidade com papel de destaque em
todas as esferas de convívio e em todas as classes sociais. Através
da mídia - jornais, revistas e noticiários (apesar dos enfoques
usualmente sensacionalistas e direcionados) e de dados divulgados em relatórios
governamentais e científicos, percebe-se um aumento acentuado,
em escala mundial e local, da violência e da criminalidade. Este
crescimento da violência e da criminalidade urbana nos últimos
anos, impulsionado por fatores sincrônicos que encontram suas raízes
na problemática sócio-econômica e no contexto histórico
e cultural, associado à falência dos modelos tradicionais
adotados pelos sucessivos governos na tentativa de conter e reprimir ações
criminosas, que via de regra mostram-se ineficientes, têm gerado
amplo sentimento de descrença na capacidade das instituições
públicas de reter o crescimento da violência e da criminalidade
e levado a Segurança Pública a tornar-se um dos assuntos
de maior repercussão midiática no País, colocando
a problematização do papel desempenhado pelas organizações
policiais como uma das principais pautas. Entretanto, a popularização
dos debates sobre a questão, exceto em situações
ainda isoladas e locais, parece não atingir amplamente a opinião
pública para assumir um papel mais participativo nas ações
de prevenção à violência e criminalidade urbanas,
sobrepondo-se ainda na sociedade civil a idéia de que o seu combate
e redução cabem à ação mais efetiva
das policias, principalmente do seu aparato repressor, caracterizado pelas
polícias militares, responsáveis pelo policiamento ostensivo.
Estas perspectivas podem ser associadas ao histórico permeado de
conflitos, preconceitos e animosidade entre as organizações
policiais e as suas respectivas comunidades e vice-versa. Neste contexto,
se insere este trabalho, buscando a compreensão da percepção
da população sobre o desempenho e atuação
da Policia Militar, analisando in loco o caso de Marília, município
do estado de São Paulo - Brasil. Para tanto, realizou-se uma pesquisa
de campo, de caráter quantitativo, abrangendo de forma eqüitativa
em esquema de micro-censo, toda a área e população
do perímetro urbano do referido município. A análise
teve seu foco na avaliação da comunidade mariliense sobre
os policiais militares. Levou-se em conta a confusão sobre os elementos
que envolvem a Segurança Pública, já que as noções
e conceitos que a sociedade possui sobre este tema englobam até
mesmo a defesa nacional. Assim como, uma não compreensão
da população sobre o papel da polícia ou suas competências
(conforme apontam alguns autores), ou mesmo o comportamento desconfiado
que a sociedade como um todo possui em relação às
organizações policiais, que não são resultado
apenas das tensões e fatos atuais, mas sim de toda uma conjuntura
histórica. De um modo geral, contradizendo os apontamentos do cotidiano
atual, que caracterizam de modo amplamente negativo as polícias
militares brasileiras - dentre elas a policia militar do estado de São
Paulo, os resultados se mostraram deverás positivos à esta
instituição. Cabe pincelar a questão, abordada de
modo mais extenso no texto integral, de que tal resultado não seja
conseqüência em parte do desconhecimento sobre a função
policial, galgada em uma visão mítica sobre as organizações
policiais? Em tempo, saliento que alguns dos resultados alcançados
vieram a subsidiar as estratégias e programas de implantação
da filosofia de policiamento comunitário (desenvolvidos em parceria
com o G.U.T.O. - Grupo de Pesquisa e de Gestão Urbana de Trabalho
Organizado/UNESP), incitando a comunidade a superar sua condição
de usuária dos serviços da policia, tornando-se parceira
em uma atuação orientada para a manutenção
da segurança pública e melhoria da qualidade de vida.
Ocio, cultura y conflicto por el espacio. El caso del botellón.
Artemio Baigorri Agoiz, Mar Chaves Carrillo, Ramón Fernández
Díaz, José Antonio López Rey (Universidad de Extremadura)
En los últimos años, una práctica juvenil ha devenido
en fenómeno social y sociológico de primer orden, mereciendo
la atención de los medios de comunicación de masas de manera
creciente: el botellón. Éste consiste en la ocupación
por parte de los jóvenes de un espacio público (plazas,
calles, jardines, etc.) y de un tiempo estipulado tradicionalmente como
de descanso (la noche) para reunirse, tomar alcohol y, en menor medida,
otro tipo de drogas. El abandono de los lugares socialmente establecidos
para estas prácticas (bares, pubs, etc.) por la vía pública
supone la conformación de diversos colectivos definidos en función
de cómo les afecta el fenómeno. Los actores, entonces, no
solamente son los jóvenes que protagonizan el botellón,
sino también los vecinos que lo sufren, los comerciantes y, también,
las diferentes administraciones.
El presente trabajo aborda el botellón a través de cuatro
aspectos que lo dimensionan sociológicamente. En primer lugar,
se ofrece una definición operativa del fenómeno que permite,
por un lado, contextualizarlo y, por otro, conocer sus características
particulares.
En segundo lugar, se identifican a los actores, tanto a través
de las acciones que protagonizan como de las reacciones que plantean a
las mismas. La acción social es conformada por los hechos observables,
pero también por las valoraciones que éstos suscitan en
los distintos colectivos afectados. En este sentido, se ha analizado abundante
material de diverso tipo, desde noticias de prensa hasta declaraciones
oficiales, pasando por la información que circula por Internet
en distintos formatos (documentos, chats, etc.), con objeto de ofrecer
una descripción adecuada de las posturas que concurren en el fenómeno.
En tercer lugar, se atiende a la extensión del fenómeno.
Lo que en origen no dejaba de ser una práctica de un colectivo
muy concreto, se ha extendido por gran parte de la geografía del
estado. Se trata de ver entonces cuáles son las variables que posibilitan
la aparición del botellón, así como de identificar
las particularidades propias en cada zona. En este sentido, se compara
también el botellón con fenómenos similares del entorno
europeo y latinoamericano, prestando atención a los posibles significados
diferentes que tiene en cada país y a las características
que los condicionan.
Finalmente, se estudia el tipo de acciones que desde las instituciones
públicas se han emprendido con respecto al problema. En esta parte
se indaga acerca de la posibilidad de que existan determinadas variables
que caractericen patrones de respuesta similares por parte de las administraciones
estatal, autonómicas y locales.
Se expone además la metodología puesta en marcha para abordar
este problema, que constó tanto de técnicas cualitativas
como cuantitativas en el marco de la investigación acción
para la implementación de políticas públicas, lo
que la configura como una investigación única en el entorno
peninsular.
A juventude universitária e a nova sociabilidade: continuidade
ou ruptura?
Loriza Lacerda e Almeida (Universidade Estadual Paulista)
A expansão das oportunidades de acesso à universidade,
após os anos 70, levou o ensino a um processo de massificação,
mudando a fisionomia do estudante universitário e do próprio
ensino.
No que se refere à qualidade, ficou garantido ao ensino superior
um nível mínimo necessário, de tal forma que fossem
oferecidas as possibilidades de competitividade no polo trabalho, ao mesmo
tempo em que fosse mantida a expectativa de ascensão social como
forma de negar o antagonismo existente entre as classes sociais. Se por
um lado, a expansão de oportunidades de acesso ao ensino superior
se efetivaram, a partir da reforma e das pressões sociais externas
à instituição universitária, por outro lado
a massificação do ensino superior promoveu uma alteração
qualitativa na formação dos estudantes, que detonou a chamada
'crise da universidade'.
Neste sentido, o jovem universitário se depara hoje, muito mais
com a preocupação relativa a sua inserção
futura como força de trabalho, do que com a vida universitária
propriamente dita. De tal forma esta preocupação se avizinha
no cotidiano do estudante universitário que ele, invariavelmente,
tende a se afastar de formas coletivas de ação no âmbito
da universidade, preocupado que está com sua própria sobrevivência
enquanto força de trabalho.
Tal comportamento possibilita análises de natureza pessimista,
dando conta de que atualmente o jovem é desinteressado, apático,
alienado, em suma, que apenas se entrega a interesses individualistas.
Neste sentido, a construção histórica deste sujeito
vem sofrendo alterações decorrentes das mudanças
conjunturais, tornando-se ele mesmo um novo jovem, com focos de preocupações
distintos de outras gerações. Decorrente deste processo,
de alterações profundas tanto da conjuntura econômica,
em especial a partir das crises dos anos 80 no Brasil, quanto das prioridades
a que vai se expondo a juventude, que as formas de engajamento e de representação
política também entram em um processo de crise e de mudança,
em relação às formas tradicionais de ação
e representação política.
Para que a participação política da juventude universitária
seja assegurada, é necessário que ela seja construída
em outras bases, para ter repercussão junto aos estudantes. A crise
das representações de que tanto se fala, não passa
necessariamente por sua legitimidade, mas sim pela pertinência das
causas que são representadas.
Vista de perto, a situação da juventude retrata, de forma
singular, questões que são da vida coletiva, da vida social.
As expectativas da juventude, no que diz respeito à inserção
no mercado de trabalho, não se referem a um momento particular
do ciclo da vida destes sujeitos, mas são sobretudo expressões
singulares de processos sociais que são gerais e que se referem
à crise econômica, à exclusão social, à
ausência de cidadania e à massificação do ensino,
da cultura e do consumo.
Concorre ainda para o afastamento das ações mais voltadas
à participação coletiva, todo um conjunto de assertivas
divulgadas pela mídia, pela universidade e pela ideologia, de que
na contemporaneidade o individualismo é inexorável, que
aos estudantes compete estudar e não fazer política e, sobretudo,
que não existem quaisquer possibilidades de mudanças estruturais,
logo, o envolvimento não vale a pena.
Estas seriam as razões que justificariam uma juventude alheia e
desvinculada da participação política. No entanto,
o imobilismo não é real. O que se insinua são novas
formas de engajamento político, substituindo as formas tradicionais
de participação.
É nesta perspectiva que apontamos a necessidade de agregar outros
instrumentos de análise, que dêem conta de compreender a
mudança de identidade da juventude dos anos 60 para a nova identidade
dos anos 90, assumida pelos jovens. Essa mudança de identidade
se desloca basicamente da radicalidade da polarização entre
o movimento estudantil e a ditadura para a ação mais universalizante
da cidadania.
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