As políticas culturais autárquicas num contexto de globalização: processos e dinâmicas do património em Ílhavo e em Loures
Marta Anico, Elsa Peralta (Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas - Universidade Técnica de Lisboa)

A globalização, nas suas dimensões económica, social e cultural, refere-se não só à expansão dos grandes sistemas mundiais, mas também às transformações operadas em contextos locais, devido à influência exercida por fenómenos que ocorrem à escala mundial. Com efeito, a evolução das tecnologias de informação, dos meios de transporte e a economia global, constituem apenas alguns dos factores que vieram contribuir para a designada "economia de fluxos" (Waters, 1995), cujas consequências se fazem sentir ao nível da reestruturação das relações sociais em contextos locais, quer em termos espaciais, quer em termos temporais.
As transformações resultantes deste processo de globalização compreendem um crescente distanciamento e alheamento dos indivíduos face às suas raízes e origens locais, factores que conduzem ao que Fortuna (2000) denomina de "sujeitos descentrados", que procuram mecanismos e instrumentos de identificação e vinculação locais. Neste contexto, as autarquias em Portugal, a par da tendência verificada noutros países, têm vindo a desenvolver, crescentemente, políticas culturais que se pautam por uma lógica da afirmação das singularidades locais e do fortalecimento dos sentimentos de apego à comunidade.
Face às tendências de homogeneização cultural e à perda das referências de estabilidade, com a consequente "desautorização" da tradição na regulação da vida social, assiste-se frequentemente, por parte do poder local, a um resgate do passado, ou de um "pseudo-passado" (re)construído pelo presente mediante a patrimonialização dos elementos culturais locais. Neste contexto, não só o passado é recuperado, como também são exaltadas todas as actividades e expressões que, assumindo uma dimensão explicitamente territorial, se possam converter num instrumento ao serviço do fortalecimento da identidade de uma comunidade. Estas iniciativas protagonizadas pelos agentes políticos locais assumem também um carácter instrumental, pois permitem contribuir para a legitimação dos poderes instituídos, na medida em que a oferta de actividades e bens culturais responde aos anseios de uma população carente de vínculos de identificação para com o território e o passado. Por outro lado, no caso das cidades de pequena e média dimensão, que procuram afirmar-se como um espaço significativo (Auge, 1998) no contexto das escalas de prestígio das cidades nacionais, a cultura pode ser utilizada, pela visibilidade e legitimação simbólica que confere, como argumento na negociação do seu posicionamento. Assim sendo, apesar de fixarem uma imagem diferenciada do seu passado, estas cidades promovem simultaneamente uma abertura ao exterior e à modernidade.
Nesta comunicação pretendemos abordar especificamente a relação que se pode estabelecer entre as políticas culturais municipais e a crescente necessidade de identificação com o passado e as raízes locais, enquanto subproduto dos processos de globalização. Pretendemos ilustrar esta relação com a apresentação de dois casos particulares em que as autarquias basearam fortemente as suas políticas culturais no património e nas referências do passado.
No caso de Ílhavo, temos vindo a assistir, especialmente a partir de 1998, a uma política municipal que visa a reconstrução do discurso identitário local, tendo por base a memória e as vivências associadas à pesca do bacalhau à linha, uma actividade que no passado foi estruturante na comunidade. Este discurso consubstancia-se em duas vertentes, uma delas concerne à representação museológica desta actividade em tom épico, outra é relativa às comemorações e festividades associadas a esta temática.
Em Loures, a política patrimonial da autarquia assenta fundamentalmente na salvaguarda e preservação das memórias associadas, por um lado, ao mundo rural e à região saloia e, por outro, a um passado mais recente relativo à vertente industrial do concelho. Esta política concretiza-se através das iniciativas desenvolvidas no âmbito da Rede de Museus de Loures, bem como mediante a oferta de outros elementos integrados no património exterior do concelho e em itinerários culturais temáticos.

Bibliografia:
AUGÉ, Marc (1998) Os não-lugares, Ed. Bertrand, Lisboa.
FORTUNA, Carlos (2000) "La sociedad, el consumo y la crisis de los museos", Revista de Museología, Monográfico Museos y Museología en Portugal. Una Ruta Ibérica para el Futuro, Febrero, pp.27-29.
WATERS, Malcom (1995) Globalization, London, Routledge.

 

Da cidade ideal à cidade intencional. Cidade ABC, a Utopia Colaboradora
Matilde Maria Almeida Melo (PUC São Paulo)

O trabalho tem como tema geral o Planejamento Urbano, versando mais precisamente sobre o Planejamento Estratégico de Cidades. Analiso esse tema no quadro do Plano Regional Estratégico do Grande ABC Paulista.
Palco do maior parque industrial do país a Região do Grande ABC, situa-se na Região Metropolitana de São Paulo, Brasil e congrega atualmente sete municípios , concentrando uma população de 2.354.722 habitantes . Destacou-se no cenário nacional e internacional no final dos anos 70 e durante toda a década de 80, por abrigar a reação política organizada dos setores populares, particularmente do movimento operário na luta pela democratização do país.
A partir da década de 1990 para fazer frente à crise do modelo de desenvolvimento industrial implementado na região desde os anos 50 e na busca de novos modelos de governabilidade regional os municípios do Grande ABC inauguram um modelo de planejamento regional calcado na metodologia do Planejamento Estratégico de Cidades.
Qual a proposta de desenvolvimento contida no Plano Regional Estratégico do Grande ABC? Quais os objetivos estratégicos a serem alcançados e quais as ações estratégicas a serem implementadas para assegurar o modelo de desenvolvimento regional proposto? Conteria esse modelo elementos que possibilitassem a ampliação de um projeto de emancipação social explícito em diferentes momentos da vida política da região? Quais os sujeitos sociais identificados e privilegiados para a implementação do projeto de desenvolvimento proposto? E enfim, até que ponto este projeto, assim como o modelo de planejamento estratégico de cidades, apresenta-se como uma nova alternativa ao planejamento e ao modelo de desenvolvimento historicamente implementado nacional e regionalmente ou, se trata, apenas, de uma nova roupagem para o velho modelo historicamente instituído? Problematizar estas questões constituiu o objetivo da tese em questão.
Após enfocar as bases históricas e conceituais da noção de estratégia e de Planejamento Estratégico, as análises foram realizadas em dois eixos principais.
No primeiro eixo, buscou-se explicitar os princípios estratégicos implícitos nos diferentes momentos do pensamento da cidade no mundo ocidental, até se conformarem em metodologia de planejamento. Para tanto, retrocede-se às idéias que alimentaram a concepção de cidade desde a Grécia Antiga - a polis grega - até chegar à cidade intencional dos dias atuais - a city "pós-moderna". Nesse momento, são explicitados os princípios teóricos e metodológicos do Planejamento Estratégico de Cidades e as novas propostas e perspectivas de gestão urbana no final do século XX e início do XXI.
No segundo eixo, após uma reconstrução histórica do processo de (re) constituição identitária da região do Grande ABC Paulista apresenta-se a análise do conteúdo de seu Plano Regional Estratégico, procurando-se explicitar a tensão emancipação-subordinação contida nas estratégias presentes em suas propostas de ação. São enfocadas especialmente as temáticas referentes à ampliação da competitividade sistêmica da região a partir da análise das propostas atinentes a criação de nova dinâmica produtiva e de nova centralidade metropolitana, à implementação de práticas de desenvolvimento sustentável e construção de nova identidade regional. As idéias de comunidade cívica e capital social, novas forças sociais referenciadas no ideário regional constituem também objeto da reflexão.
Qual a nova cidade-região que se pretende intencionalmente construir? Qual a natureza da utopia presente na idéia da Cidade ABC? Regeneração ou colaboração, emancipação ou subordinação? Estas questões alimentam e fazem interagir as diferentes reflexões contidas no estudo e que constituirão a tônica da comunicação ora proposta.

Da cidade ideal à cidade intencional. Cidade ABC, a Utopia Colaboradora"
Matilde Melo (PUC São Paulo)
matimelo@uol.com.br

O trabalho tem como tema geral o Planejamento Urbano, versando mais precisamente sobre o Planejamento Estratégico de Cidades. Analiso esse tema no quadro do Plano Regional Estratégico do Grande ABC Paulista.
Palco do maior parque industrial do país a Região do Grande ABC, situa-se na Região Metropolitana de São Paulo, Brasil e congrega atualmente sete municípios , concentrando uma população de 2.354.722 habitantes . Destacou-se no cenário nacional e internacional no final dos anos 70 e durante toda a década de 80, por abrigar a reação política organizada dos setores populares, particularmente do movimento operário na luta pela democratização do país.
A partir da década de 1990 para fazer frente à crise do modelo de desenvolvimento industrial implementado na região desde os anos 50 e na busca de novos modelos de governabilidade regional os municípios do Grande ABC inauguram um modelo de planejamento regional calcado na metodologia do Planejamento Estratégico de Cidades.
Qual a proposta de desenvolvimento contida no Plano Regional Estratégico do Grande ABC? Quais os objetivos estratégicos a serem alcançados e quais as ações estratégicas a serem implementadas para assegurar o modelo de desenvolvimento regional proposto? Conteria esse modelo elementos que possibilitassem a ampliação de um projeto de emancipação social explícito em diferentes momentos da vida política da região? Quais os sujeitos sociais identificados e privilegiados para a implementação do projeto de desenvolvimento proposto? E enfim, até que ponto este projeto, assim como o modelo de planejamento estratégico de cidades, apresenta-se como uma nova alternativa ao planejamento e ao modelo de desenvolvimento historicamente implementado nacional e regionalmente ou, se trata, apenas, de uma nova roupagem para o velho modelo historicamente instituído? Problematizar estas questões constituiu o objetivo da tese em questão.
Após enfocar as bases históricas e conceituais da noção de estratégia e de Planejamento Estratégico, as análises foram realizadas em dois eixos principais.
No primeiro eixo, buscou-se explicitar os princípios estratégicos implícitos nos diferentes momentos do pensamento da cidade no mundo ocidental, até se conformarem em metodologia de planejamento. Para tanto, retrocede-se às idéias que alimentaram a concepção de cidade desde a Grécia Antiga - a polis grega - até chegar à cidade intencional dos dias atuais - a city "pós-moderna". Nesse momento, são explicitados os princípios teóricos e metodológicos do Planejamento Estratégico de Cidades e as novas propostas e perspectivas de gestão urbana no final do século XX e início do XXI.
No segundo eixo, após uma reconstrução histórica do processo de (re) constituição identitária da região do Grande ABC Paulista apresenta-se a análise do conteúdo de seu Plano Regional Estratégico, procurando-se explicitar a tensão emancipação-subordinação contida nas estratégias presentes em suas propostas de ação. São enfocadas especialmente as temáticas referentes à ampliação da competitividade sistêmica da região a partir da análise das propostas atinentes a criação de nova dinâmica produtiva e de nova centralidade metropolitana, à implementação de práticas de desenvolvimento sustentável e construção de nova identidade regional. As idéias de comunidade cívica e capital social, novas forças sociais referenciadas no ideário regional constituem também objeto da reflexão.
Qual a nova cidade-região que se pretende intencionalmente construir? Qual a natureza da utopia presente na idéia da Cidade ABC? Regeneração ou colaboração, emancipação ou subordinação? Estas questões alimentam e fazem interagir as diferentes reflexões contidas no estudo e que constituirão a tônica da comunicação ora proposta.

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