V Ciclo Anual Jovens Cientistas Sociais
2009-2010
16 Dezembro 2009, 17:30, Sala de Seminários do CES
Nuno Teles (SOAS - School of Oriental and African Studies, Universidade de Londres - UK)
Trabalhadores e Finança: A economia política da expropriação financeira
Resumo: Os últimos dois anos foram marcados pela maior crise económica mundial desde a Grande Depressão dos anos 30. Tal como esta, as origens da actual crise situaram-se na esfera financeira. No entanto o epicentro da crise situou-se não numa bolha bolsista, mas sim no mercado crédito imobiliário norte-americano de alto risco, normalmente dirigido aos trabalhadores mais desfavorecidos.
Esta comunicação procurará mostrar como o entendimento da crise financeira necessita de ter em conta o processo de financeirização da economia mundial favorecido pelos processos de liberalização, privatização e desregulamentação dos mercados financeiros promovida nos últimos trinta anos nas principais economias mundiais. Este conceito, forjado pelas correntes mais heterodoxas da teoria económica, traduz a crescente hegemonia da esfera financeira sobre a restante economia, seja no seu peso relativo, seja na forma como comanda todas as esferas da vida económica.
O crescimento exponencial seguido pelo colapso do mercado dito “subprime” norte-americano tornou saliente como o poder hegemónico dos mercados financeiros se traduziu numa nova relação entre estes e os trabalhadores. A estagnação salarial das últimas décadas, aliada ao recuo da provisão pública, forçou os últimos a recorrer ao sistema financeiro como forma de acesso a bens essenciais. Os trabalhadores envolveram-se assim com o sistema financeiros não só como devedores (ex. habitação), mas também como detentores de activos (ex. fundos de pensões). Esta relação configura uma imensa transformação do papel do sistema financeiro na economia e revela uma profunda assimetria de poder, traduzida em transferências de rendimento crescentes, quer através dos juros, quer através da miríade de taxas e comissões, bem reflectida nos lucros do sistema bancário. A actual crise financeira será assim apresentada como resultado da insustentabilidade da expropriação financeira sofrida pelos trabalhadores.
Finalmente, esta comunicação argumentará que a financeirização da economia e os processos que a sustentam não é um exclusivo dos países do centro capitalista, mas um fenómeno global. A África do Sul servirá como para ilustrar o alcance destas transformações no contexto de um país de rendimento médio. Este país, onde a exclusão financeira é ainda dominante, testemunhou no período pós-apartheid um modelo de expansão da provisão privada de habitação que, embora subsidiado pelo Estado, assenta na expansão dos mercados financeiros e titularização dos créditos imobiliários.
Nota biográfica: Licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão – Universidade Técnica de Lisboa (ISEG-UTL), Mestre em Economia Internacional e Regulação pela Universidade Paris XIII, doutorando na School of Oriental and African Studies (SOAS), da Universidade de Londres. Assistente de Investigação no CISEP – Centro de Estudos em Economia Portuguesa do ISEG (2005), e no DINAMIA/ISCTE – Centro de Estudos sobre a Mudança Socio-Económica (2005-2008). Co-autor do blogue "Ladrões de Bicicletas". |