Seminário do Núcleo de Estudos sobre Ciência, Tecnologia e Sociedade
Quem não deve, não teme. Naturalização dos riscos e das incertezas nas aplicações forenses de informação genética.
Helena Machado

19 de Fevereiro de 2008, 17:00, Sala de Seminários do CES (2º Piso)


Resumo:

Novas relações entre a genética e a sociedade, proporcionadas pelos crescentes usos da genética em contextos forenses, têm servido de mote a um debate científico, político, académico e social, em torno dos potenciais benefícios, mas também das inquietudes suscitadas pela criação de bases de dados genéticos.
Na retórica política dominante, os riscos e as incertezas associados à aplicação da biotecnologia em contexto forense surgem suavizados ou apagados. Este processo ancora-se numa teia complexa de agendas e de actores diferenciados, que sustentam a acção em recursos simbólicos diversos, que passam tanto pela celebrização da ‘infalibilidade’ da identificação de indivíduos pela tecnologia dos perfis de ADN como suporte moderno à investigação criminal e à administração da justiça; como pela ênfase num projecto de ‘nova cidadania’. Algumas formas de promoção política e institucional dessa ‘biocidadania’, enquanto conjunto de direitos e deveres no contexto dos usos das bases de dados de perfis de ADN, apoia-se em argumentos em torno de conceitos como o consentimento informado e livre dos cidadãos, a responsabilidade individual para o bem comum, a dádiva e do altruísmo dos voluntários que facultam amostras biológicas e a necessidade da existência de modalidades de responsabilidade social coadjuvadas pela biotecnologia.
Considerando a construção social dos riscos e das incertezas inerente às práticas de aplicação forense da informação genética em vários países europeus, pretende-se discutir o projecto técnico-genético mais amplo que sustenta a proposta de lei de constituição de uma base de dados deste tipo. Considerando o caso de Portugal, apontam-se ainda rumos possíveis para uma governança possível desta forma de biovigilância, que integre modalidades de participação do público leigo, de escrutínio independente das práticas policiais, científicas e judiciárias e de promoção da confiança pública alargada e esclarecida relativa aos potenciais usos e impactos sociais e éticos deste tipo de tecnologias.

Nota biográfica:

Professora Auxiliar do Departamento de Sociologia da Universidade do Minho e Directora-Adjunta do Centro de Investigação em Ciências Sociais da mesma instituição. Licenciada em Sociologia (Universidade de Coimbra, 1993), mestre em História das Populações (Universidade do Minho, 1997) e doutorada em Sociologia (Universidade do Minho, 2003). A sua dissertação de Doutoramento, intitulada Tribunais, género, ciência e cidadania - uma abordagem sociológica da investigação judicial de paternidade (2003), foi galardoada com uma Menção Honrosa da 4.ª Edição do Prémio CES para Jovens Cientistas Sociais de Língua Oficial Portuguesa (2005).
É delegada portuguesa do projecto europeu de cooperação designado Género e bem-estar: interacções entre o trabalho, a família e as políticas públicas (European Science Foundation). Actualmente está a desenvolver um estudo de pós-doutoramento no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (em parceria com a Universidade de Durham, Reino Unido) sobre os impactos sociais, éticos e políticos das bases de dados de perfis de ADN. Tem coordenado diversos projectos de investigação científica sobre as relações entre a Justiça, as novas tecnologias de comunicação e informação, a genética forense e os meios de comunicação social, com o apoio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia.
Tem diversas publicações na área das interacções entre o direito e a genética forense, destacando-se o seu trabalho mais recente sobre as implicações éticas, sociais e jurídicas das bases de dados de perfis de ADN, produzida em resposta a um convite dirigido pela comissão editorial da revista inglesa Biosocieties: comentário ao Nuffield Council of Bioethics report "The forensic use of bioinformation: ethical issues" (publicação em Março de 2008, em co-autoria com Susana Silva).