Seminário
Arcana Imperii e o desvendar do oculto: o caso da Guerrilha Rural e dos arquivos secretos da ditadura militar brasileira

Hugo Studart, Doutorando: Universidade de Brasília – CES

11 de Maio de 2010, 17:00, Sala de Seminários do CES, 2º Piso, Coimbra

No âmbito do Núcleo de Estudos Culturais Comparados (NECC)

Entrada livre

 
Apresentação

Conhecida pelo nome de Guerrilha do Araguaia, a guerrilha rural brasileira foi a mais relevante insurreição interna desde o Movimento de Canudos, no século XIX, e onde se viu a maior mobilização das Forças Armadas desde a Segunda Guerra Mundial, na Itália. É também um dos episódios mais obscuros. Os conflitos tiveram início em março de 1972, quando os primeiros militares chegaram à região do sul do Pará, na Amazônia, e só terminariam em setembro de 1974, quando os últimos guerrilheiros foram abatidos. De acordo com o Partido Comunista Brasileiro, o PC do B, que organizou a guerrilha, teriam tombado 75 pessoas, sendo 58 guerrilheiros e 17 camponeses. Os militares têm outra contabilidade. Teriam matado 85, dez a mais. Somados aos militares e guias do Exército, o movimento ceifou 95 vidas. Só dois corpos de guerrilheiros foram encontrados até a presente data. Ainda há 80 desaparecidos, dos três lados da luta.

Quase quatro décadas depois, tanto o Exército quanto o PC do B continuam em silêncio, se recusando a abrir seus próprios arquivos. Por quê? Há muitos esqueletos a desenterrar – de ambos os lados. Os militares violaram os Direitos Humanos e as Convenções de Genebra. Fizeram prisões arbitrárias, torturaram prisioneiros, deixaram corpos insepultos para trás. Mais de 20 guerrilheiros teriam sido executados depois de presos. Os guerrilheiros também têm o que esconder. O principal esqueleto é a prática dos "justiçamentos", eufemismo utilizado para justificar a execução sumária dos “inimigos da revolução”. O PC do B cometeu pelo menos quatro justiçamentos, de um companheiro e de três camponeses.

Terminada a guerra, houve ordem expressa dos generais comandantes, incluindo o presidente Ernesto Geisel, de destruir os documentos que dessem pistas sobre a localização dos corpos – e até mesmo sobre a própria existência da guerrilha. O Brasil vivia no ápice de um regime que praticava o “oculto” como regra, fenômeno definido pela Ciência Política por arcana imperii. Entretanto, milhares de páginas de documentos secretos restaram, ou dispersos em arquivos oficiais, ou nas gavetas pessoais de militares que combateram na selva. Restou, em especial, as memórias dos sobreviventes.

Em Coimbra, está a organizar os documentos secretos remanescentes em parceria com o Centro de Documentação 25 de Abril. É sobre esses fatos, documentos e memórias que esta Oficina vai tratar.

 
Nota Biográfica

Hugo Studart (studart@studart.blog.br) é jornalista, cronista e historiador brasileiro. Foi repórter, editor, colunista ou director nos jornais O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo, e nas revistas Veja, Dinheiro e IstoÉ. Colaborou com colunas ou artigos em revistas como Exame, Playboy, República, Brasil História e, actualmente, no jornal O Estado de S.Paulo. Ganhou diversos prémios de jornalismo, como o Prémio Esso.

Foi professor na Universidade Católica de Brasília e é pesquisador da Universidade de Brasília, UnB, onde cursa o doutoramento em História. Optou pelo campo da História Cultural e pelos estudos do Imaginário, em pesquisas sobre a guerrilha e a ditadura militar brasileira. Representa a UnB, como Ouvidor e Observador Independente, no grupo de trabalho da Presidência/ Ministério da Defesa que busca os corpos dos desaparecidos da guerrilha.

Tem três livros publicados; o mais recente, "A Lei da Selva: Estratégias e Imaginário dos Militares sobre a Guerrilha do Araguaia" (Geração, 2006), recebeu o Prémio Herzog de Anistia e Direitos Humanos e foi finalista do Prémio Jabuti 2007, que elege os melhores livros do ano do Brasil. Os apontamentos do livro sobre as mortes dos guerrilheiros são citados no livro “Direito à Memória e à Verdade”, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, relato oficial sobre os desaparecidos políticos da ditadura.

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