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Conceição Osório Poder político e protagonismo feminino (texto não editado)
Introdução «A mí me ha tocado transitar el camino desde la marginalidad hasta el Estado y, en ese camino, conocer las distintas expressiones del poder. El poder de las sin poder y el poder de no poder», Virreira (1999). O Estado Providência, «corporizado» em Moçambique por uma ideologia revolucionária de natureza colectivizante, permite a visibilidade da mulher no espaço público, alterando, relativamente ao passado colonial, o seu acesso à reivindicação pela igualdade de direitos. Esta igualdade deve ser entendida mais como expressão formal do discurso político revolucionário do que como alteração nas relações sociais de poder que percorrem as relações de género. Como procurarei analisar na 1ª secção deste capítulo, as estratégias políticas dos primeiros quinze anos da independência, ao mesmo tempo que revelam a «mulher com direitos», reforçam, no quadro do modelo político, a sua posição subordinada. Isto significa que o acesso das mulheres aos direitos no contexto do Estado-providência, é balizado por normas e discursos que realojam a mulher em papéis delimitados por uma lógica de subordinação, ou seja, os direitos das mulheres passam pelo conformismo ao estatuto que lhe confere o androcrático (Seidler, 1994). As evidências da discriminação feminina exprimem-se neste período, nos discursos, nas formas de ocupação do campo do poder e no exercício político. O «essencialismo» da natureza feminina torna-se o fundamento para a legitimação de uma dominação traduzida nos múltiplos constrangimentos que impedem a acção política das mulheres fora do quadro normativo que lhes define as competências como mãe e esposa de. Na situação concreta de Moçambique nos anos 70 e 80, a luta das mulheres pelo acesso ao poder político é configurada por uma ideologia que não permite individualizar mecanismos de afirmação política, sob pena de exclusão do projecto nacional-revolucionário. Com a ruptura da ideologia revolucionária e a sua substituição pela ideologia liberal a partir do fim da década de 80, acentua-se o carácter regulador e neutral do Estado que tem como consequência a ocultação da dominação (Stetson e Mazur, 1995: 9). Em Moçambique, as políticas liberais têm como resultado, no campo dos direitos humanos das mulheres, o reforço de uma concepção que, acentuando a necessidade da presença institucional da mulher, esvazia politicamente a luta pelas alterações das relações sociais de género. As mudanças legais a que temos vindo a assistir, para além de insuficientes, pretendem encobrir os mecanismos fundadores da desigualdade. Por outro lado, o aumento quantitativo da presença feminina no aparelho de Estado e nos partidos políticos tem sido utilizado, por si só, como motor da mudança, sem que sejam questionadas a estrutura, as hierarquias e os sistemas de valores que circulam e organizam o estatuto da mulher nas instituições. É neste sentido que a questão das quotas pode ter o efeito perverso de reduzir a alteração das relações sociais de género à presença feminina nos espaços de poder, se não se tiver em conta que a transformação das formas de dominação passam pela incorporação (no discurso e na acção política) dos sistemas de diferenciação que configuram a identidade feminina (Pitanguy, 1999). A capacidade de transformar as organizações políticas por dentro do modelo dominante tem constituído, a partir dos meados da década de 80, um dos focos da atenção do movimento feminista. Face à multiplicação das ONGs (Organizações Não Governamentais) e à sua transformação em meras executantes das políticas governamentais ou das agendas internacionais, os movimentos das mulheres têm procurado reflectir a utilidade da participação da mulher nas instituições de poder (Astelarra, 1999). O debate tem sido desenvolvido em torno de duas posições: a primeira, que nega às actuais instituições qualquer capacidade de transformação, considerando que a sua manutenção como espaço de poder é estruturalmente justificada pela androcracia que alicerça o modelo social; deste ponto de vista, e na medida em que a partilha do poder «procura» a igualdade formal, a participação das mulheres visa ocultar a permanência da desigualdade e esvazia o movimento feminista da sua capacidade de afirmação autónoma. A segunda posição (que defende a ocupação do poder político pela mulher) destaca a necessidade de ocupação de espaços de decisão política, procurando simultaneamente influenciar e alterar não apenas o quadro legal que suporta a subalternidade da mulher, mas fundamentalmente os mecanismos de legitimação e de reconhecimento do campo político, como um campo masculino, onde a mulher é aceite mas não incluída. Em todo o mundo, a prática política das mulheres tem demonstrado, até à saciedade, que a maioria das mulheres que chegaram a funções de direcção nos aparelhos políticos tem adoptado como sua a masculinização do poder. A lógica lobista, a manipulação da informação e as estratégias de persuasão aumentam a eficácia do funcionamento das instituições, sem que os padrões de pensar e de agir politicamente se alterem. Alcançando importantes vitórias no campo legal, o movimento, através destas mulheres, inviabiliza a revitalização das propostas feministas. E é neste contexto que nos finais da década de 90 se procura reflectir a questão da participação política das mulheres, de modo a articular a presença institucional com formas de acção (como por exemplo a participação conjunta com outros movimentos políticos) que salientem, convoquem e reconheçam as diversidades e diferenças existentes. Do ponto de vista teórico, este debate permite redimensionar a produção do conhecimento numa maior pluralidade de objectos e aparelhos conceptuais, sem medo de atingir a legitimidade dos quadros de referência universais. Como afirma Virginia Guzmán, o feminismo enfrenta o desafio de debilitar as barreiras que se interpõem à difusão dos conhecimentos produzidos para influenciar de forma mais sistemática a produção cultural e académica, sem perder a sua criatividade, nem ser domesticado no momento de escolher as suas áreas de interesse, os temas e as formas de os abordar (Guzmán, 1999: 5). Se a democracia moderna, acentuando a necessidade da pluralidade ideológica e, nesta, a existência de conflito, é um imperativo necessário para a participação política da mulher, os modos e os «quadros» que tornam essa participação possível constrangem o aparecimento de novas formas de exercício de poder. Como procuro ilustrar através das falas das entrevistadas, o campo político, da maneira como hoje está configurado, não estimula a inclusão da mulher como sujeito. Sendo os conflitos socialmente construídos, o reconhecimento do que é conflito passa pela conformidade com o modelo patriarcal, isto é, a contestação da mulher à dominação é percebida como desvio de identidade. A mulher que não se conforma com as formas como se estrutura e se hierarquiza a acção política é sancionada pelo membros da organização e pela sociedade. Em Moçambique com a introdução do sistema multipartidário em 1994, o acesso e a ocupação de novos espaços de poder por parte da mulher inscreve-se numa lógica democrática de carácter globalizante que procura acordar-se com as agendas internacionais hegemónicas. É assim que o «empoderamento» feminino aparece fundamentalmente como forma de legitimar o modelo da acção política, na medida em que, não se alterando as formas de estruturação dos espaços de poder, se consolidam - pelo menos aparentemente - as regras do jogo político. Por exemplo, actualmente, em Moçambique, 27% dos parlamentares são mulheres, sendo que o partido maioritário é representado por cerca de 40% de mulheres, sem que este número revele, primeiro, diferenças entre a participação feminina entre as duas forças parlamentares e,segundo, alguma alteração na percepção e na acção parlamentar no que se refere a abordagens, referências e propostas de novas estratégias políticas. No entanto, a continuada presença das mulheres no campo do poder potencializa a redefinição do espaço político. No caso moçambicano, se ainda não existe um questionamento colectivo dos critérios de acesso ao poder e das posições ocupadas pela mulher, começam a surgir, nos discursos individuais das lideranças femininas, um certo desconforto face à desigualdade de estatuto e uma insatisfação/angústia perante a não incorporação do sistema feminino de diferenciações nas práticas de poder. É assim que, na medida em que aparecem fissuras na intimidade do modelo político masculino, surgem estratégias, embora fragmentadas, de questionamento da legitimidade das fontes e das modalidades de exercício desse poder. Este capítulo pretende analisar, através da composição dos papéis e das funções realizadas pelas mulheres na direcção dos partidos políticos, o modo como se realiza o acesso ao poder político, a representação do poder e as formas de ocupação do campo político, traduzidas em diferentes expectativas face ao exercício do poder. Para a análise destas três dimensões destaco a necessidade de articular as seguintes componentes: a impossibilidade de isolar a participação das mulheres, no campo político, dos mecanismos de socialização na família, que configuram a identidade feminina em torno de valores que a excluem dos modelos actuais de intervenção política; qualquer análise da participação política das mulheres tem que ter em conta a articulação entre a definição formal dos direitos humanos da mulher e o modo como são socialmente apropriados e reconhecidos; a ocupação do campo político pela mulher tem que ter em conta as dimensões particulares do comportamento feminino, como a maior disponibilidade para o trabalho colectivo e o para o diálogo. Neste sentido, utilizo o conceito de poder na perspectiva foucaultiana de acção sobre a acção numa relação de violência que agindo sobre o outro provoca resistência e confrontação e desencadeia a luta contra a sujeição do sujeito (Foucault, 1990). Relativamente ao acesso ao poder por parte das mulheres, considerarei duas questões centrais: uma que se relaciona directamente com os mecanismos de socialização que constrangem o acesso da mulher ao poder, ou seja, de que modo as «disposições gerais» levam a que o campo político seja um campo de intervenção «estrangeiro» e pouco motivador. Outra questão prende-se com a influência que as redes familiares podem ter no acesso ao poder pelas mulheres, tanto do ponto de vista da sua escolha ter sido determinada por interesses do grupo, como a sua presença no espaço do poder político resultar de uma motivação individual alheia à influência da rede parental. Pretendo também abordar o(s) modo(s) como o poder político é representado por mulheres que ocupam lugares de destaque nas organizações políticas, ou seja como as dirigentes dos partidos dão «uso» ao poder, principalmente no que consideram fundamental na sua acção. Procurarei ainda identificar os mecanismos que estruturam as relações sociais de género nos partidos políticos, distinguindo as funções desempenhadas por homens e mulheres, o «valor político» que lhes é conferido, e os diferentes espaços de intervenção. Considero duas hipóteses principais. A primeira é que o acesso da mulher à direcção dos partidos políticos é orientado por um contexto global que, se por um lado, reconhece a necessidade de a tornar visível, por outro lado, constrange a participação política da mulher, enquanto sujeito. A segunda hipótese é que se, por um lado, a ocupação do campo político pela mulher se faz em conformidade com as estratégias de dominação masculina (isto é a presença da mulher na direcção da acção política não só não põe em causa os mecanismos de funcionamento e estruturação do poder político, como revela a manutenção da subalternidade através das relações de poder que aí se organizam), por outro lado, a desigualdade de critérios no acesso à carreira política, aos financiamentos e a desilusão com as regras de jogo permitem à mulher o desenvolvimento de estratégias conducentes à produção de alternativas ao modelo político. O período analisado neste artigo vai de 1992 a 1999, correspondendo à mudança do sistema político. As unidades de análise foram: os dois maiores partidos do espectro político nacional, FRELIMO e RENAMO; a Frente de Acção Patriótica (FAP), um dos partidos criados após os acordos de paz de cariz fundamentalmente urbano e intelectual. Se a escolha da FRELIMO e RENAMO, como unidades de análise, se deve ao facto de, para além de serem os dois maiores partidos (em termos de visibilidade e de expectativas de conquista do poder), terem protagonizado um conflito armado, a escolha da Frente de Acção Patriótica (FAP) deve-se a razões menos objectiváveis. Como um partido pequeno, visível apenas em meios muito restritos (sem ambições aparentes de conquista do poder), com um discurso político de questionamento do funcionamento do sistema democrático em Moçambique, pensamos que a testagem, na FAP, das hipóteses propostas nos poderá fornecer uma nova e interessante perspectiva do problema. Foram realizadas 35 entrevistas, sendo 28 de mulheres e 7 de homens, no período compreendido entre Outubro de 1998 e Junho de 1999. As entrevistas foram todas semi-estruturadas, procurando-se aprofundar e articular, numa perspectiva de género, a construção das relações sociais na família com o acesso e o modo de ocupação de lugares de destaque nos partidos. Relativamente ao nosso grupo alvo, foram entrevistadas 14 mulheres da FRELIMO, 9 da RENAMO e 5 da FAP, com idades compreendidas entre os 25 e os 70 anos. A idade média do total das informadoras é de 40,4 anos, sendo as do partido FAP as mais jovens. A formação académica das entrevistadas varia entre o ensino superior (4), o ensino geral (15) e o segundo grau do ensino primário (9). As militantes da FAP e as da FRELIMO são as que têm maiores habilitações académicas. Foram entrevistados 4 homens da FRELIMO, 1 da FAP e 2 da RENAMO, com uma média de idade de 40 anos e com habilitações, que variam desde o ensino superior (2) até ao primeiro ciclo do ensino geral (2), e segundo ciclo do ensino geral (3). Os militantes da RENAMO são os que possuem menos habilitações. Os discursos das mulheres foram, de forma geral, mais abertos, existindo, com frequência, uma postura crítica relativamente ao funcionamento do partido, particularmente em relação às diferenças de acesso da mulher aos recursos do partido e à hierarquia partidária. Este discurso entrava muitas vezes em contradição com afirmações de exaltação ao partido, o que permitiu revelar as contradições entre o «politicamente correcto» e as práticas nas organizações partidárias. Os discursos masculinos, mais elaborados, reflectiram as posições positivas dos partidos acerca da inclusão da mulher, acentuando, no entanto, através de metáforas e alegorias, a masculinidade do campo político e, a «aceitação e boa vontade» dos homens em permitir a visibilidade política das mulheres.
1. Construindo utopias: os primeiros quinze anos... As alterações no modelo político introduzidas em 1994, concretizadas com a realização das primeiras eleições multipartidárias, criaram novos campos de intervenção pública, permitindo a produção de novas formas de acesso e ocupação do espaço político. A história recente do país foi marcada por uma orientação político-ideológica simultaneamente definidora da amplitude e dos limites da actuação política dos cidadãos, «encerrando-a» num quadro normativo que estruturou, durante os primeiros quinze anos da independência, o acesso ao espaço público. Os sistemas dos valores políticos foram suportados por todo um conjunto de ritos, símbolos que, tendo como função a integração/exclusão das cidadãs e dos cidadãos no projecto de construção da nação socialista, são determinantes para a compreensão das questões hoje colocadas pela introdução do sistema democrático. A igualdade revolucionária como legitimadora da ordem social foi, no que se refere à mulher, o fundamento para a luta pela emancipação (nas suas diferentes dimensões). A oposição às formas de organização colonial, acompanhadas pela contestação aos elementos da estruturação tradicional (que aquela soube manipular/manter/reproduzir) realizadas através de um projecto político revolucionário e moderno, produziu rupturas violentas na estrutura social. A ocupação do poder foi orientada por fidelidades e solidariedades construídas durante a luta armada, num contexto em que se pretendia substituir a relação parental e a ordem «natural» em que assentava a autoridade tradicional, por «ideais políticos revolucionários». Para a mulher, esta conjuntura abre-lhe aparentemente novas possibilidades de afirmação: por um lado, a liberdade de direitos é garantida, do ponto de vista legal, principalmente através da Lei Fundamental, por outro lado, o discurso político acentua a emancipação da mulher como condição da sustentabilidade da nova sociedade. A visibilidade pública da mulher aparece, assim, num contexto de libertação do país da dominação colonial e da imposição de um sistema que pretende, a partir dos novos objectivos políticos, configurar as práticas sociais. A Organização da Mulher Moçambicana (OMM) surge como entidade que congrega as aspirações emancipatórias da mulher. O discurso produzido pela organização é reivindicativo face ao que o novo poder político considerava como objecto de contestação: a sociedade colonial/tradicional. A mistura, pelo poder, das duas formas de estruturação social no mesmo combate político, cria ao nível do discurso das mulheres activistas da OMM uma dupla ambiguidade: de um lado, a rejeição da modernidade colonial (aqui incluídas as igrejas) e, de outro lado, a representação negativa de formas de organização tradicional, como o lobolo e a poligamia. Ao mesmo tempo, este discurso que acentua a exigência da igualdade entre homem e mulher no acesso aos bens e recursos, fundamenta-se na paternidade do partido político que está no poder. As campanhas de alfabetização das mulheres, a luta contra a violência, o envolvimento das mulheres nas tarefas de reconstrução nacional, coabitam sem aparente contradição com a função de «animadoras culturais» nos comícios dirigidos por homens. Revendo-se num discurso social progressista, a luta pela emancipação da mulher é condicionada pela linguagem, pelas categorias de análise e pelas prioridades que orientam o campo político. Este, ao querer romper com as posições conservadoras, não põe de facto em causa o modelo social que orienta os papéis e as funções dos actores sociais através da desigualdade de género. Procurando legitimar-se através de uma igualdade entre homens e mulheres o poder encobre de facto a manutenção de um estatuto de subalternidade da mulher. A luta desenvolvida pelo movimento das mulheres, podendo fazer-se apenas no quadro da organização partidária, tem como resultado a filiação das expectativas de emancipação ao ideário de um partido dominado por homens, na composição da sua direcção, nas suas práticas totalitárias e na exclusão da diferença. Portanto, o movimento das mulheres, não se constituindo como movimento social, com a sua identidade, submete-se (sob pena de ser excluído do projecto nacional) a um poder político que lhe define os objectivos e as estratégias. Isto significa que, não sendo postas em causa as formas de dominação masculina, o poder reserva à mulher o papel de «companheira do homem engajado» ou «a que alimenta os combatentes». O modelo androcrático é assim legitimado. As possibilidades de o combater são limitadas pelas categorias utilizadas para se pensar a situação da mulher: ela deve ter acesso ao espaço público, ela deve poder exercer os seus direitos, mas os seus direitos e o acesso ao público devem ser orientados pelos interesses que se constroem na esfera privada. Isto significa que à mulher estão reservados, em primeiro lugar, os papeis de mãe, esposa e companheira («a camarada») sendo a partir deles que se lhe reconhece ou não o seu direito à respeitabilidade pública. As mulheres são julgadas, sancionadas ou premiadas pela fidelidade partidária e pelo desempenho moral. Não foi raro, durante a campanha de estruturação do partido, em 1977, que as acusações mais frequentes feitas às mulheres acentuassem a moralidade judaico-cristã. Por outro lado, as mulheres que acedem à direcção das organizações do partido são, na sua maioria, as esposas ou familiares dos dirigentes políticos, ou as mulheres (uma minoria) que, de um modo ou outro, constituem a reserva política que veio da luta de libertação nacional. No aparelho de Estado as poucas mulheres que aí desempenham funções de direcção não se distinguem na luta pelo acesso aos direitos das mulheres, tomando muitas vezes posições extremamente conservadoras face a problemas como o aborto, o divórcio ou a união de facto. A inclusão das mulheres no campo político, faz-se, pois, através da reprodução do modelo patriarcal e da conservação de uma ordem social que o mantém como campo, o masculino. As relações sociais de género, entendidas enquanto relações de poder, construíram-se, pois, em torno de um discurso de igualdade que condicionava a visibilidade das mulheres às estratégias de dominação masculina. No entanto, a acção política não se realiza sem contradições e ambiguidades, visíveis principalmente na OMM, onde o controlo partidário, feito através das antigas militantes, começa a ser contestado, dando origem, recentemente, à sua tentativa de separação do Partido FRELIMO.
2. As quotas da globalização e os contextos locais no acesso das mulheres ao poder político. Em 1992, com a alteração do regime, novos partidos políticos foram criados, potencializando o surgimento de novos problemas, novas questões e novas e diferenciadas formas de encontrar solução para a participação política das mulheres. Contudo, uma investigação realizada em 1994 sobre a participação das mulheres no campo político, mostra que a perspectiva de género na composição das direcções dos partidos é expressa através de um discurso «politicamente correcto», mantendo-se uma perspectiva paternalista da direcção dos partidos, relativamente ao papel da mulher. No contexto da descentralização da administração do Estado, realizaram-se em 1998 as primeiras eleições autárquicas. Pelos seus objectivos, o poder local, ao potencializar a participação dos cidadãos para a resolução dos problemas concretos do município, permite o questionamento do funcionamento do campo político, como campo do «abstracto ideológico» e da competição política, criando possibilidades de abertura ao envolvimento directo das pessoas. Se a pesquisa realizada sobre o comportamento político das mulheres e sua intervenção no poder local mostra, por um lado, que o seu acesso aos lugares de decisão continua a ser orientado pelas redes familiares a que pertencem, visibiliza, por outro lado, a forma como se produz a ocupação deste espaço de poder aumenta a qualidade da intervenção feminina (Osório et al, 1999). Se as peculiaridades da acção política autárquica podem potencializar novas formas de exercício de poder - no sentido mais amplo de exercício da cidadania - e, portanto, favorecer a participação política feminina, a ocupação de espaços organizados, estruturados e hierarquizados segundo o modelo masculino de poder (como é o caso dos partidos políticos), provoca o surgimento de diferentes constrangimentos, tanto no que se refere ao acesso ao poder, como nas formas de expressão desse poder. A análise dos programas dos partidos políticos mostra que em todos eles se refere a importância do acesso da mulher ao poder, mas apenas a FRELIMO definiu um sistema de quotas. Por outro lado, a participação feminina, embora apareça nos princípios partidários como um imperativo democrático, o facto é que lhe é quase sempre reservado «lugares» femininos, isto é, procura-se que a mulher transponha para o espaço de poder as competências que lhe são reconhecidas na esfera privada. A mulher continua a ser uma espécie de garante da ordem e do bem estar familiar, tanto no discurso oficial como nos incentivos para a participação política. Independentemente dos partidos políticos analisados, o acesso das mulheres ao poder faz-se, essencialmente, ou através das redes familiares/partidárias, ou das redes familiares/parentais/étnicas, isto é, o surgimento da mulher no campo político tem quase sempre a ver com o seu meio de pertença familiar, donde lhe vem o reconhecimento e o valor. O modelo androcrático não apenas intervém no acesso das mulheres a um espaço que lhes é estranho, como orienta e determina a forma como a mulher percebe e está na política. Como detalharei na secção 3, a maioria das mulheres do universo que constitui este trabalho, independentemente dos partidos ou das características étnicas ou outras, acedem ao poder por via masculina seja ele mediado por factores étnicos, religiosos ou de grupo social. «A minha família tem nome no partido [...] o meu pai foi um lutador [...] chamaram-me [...] precisavam de mim [...]», afirmou-nos uma dirigente partidária. A identificação com o partido faz-se quase sempre através de uma figura masculina, sendo que o próprio partido representa a figura paterna, a obediência e a fidelidade. A exploração/transposição de mecanismos de socialização na família para o partido, como entidade abstracta, reflecte a necessidade da mulher de reconhecimento social para a participação num espaço fortemente masculinizado (onde a violência nas relações de poder aparece como virtude masculina). É interessante constatar que o acesso ao poder das mulheres que foram militares durante a luta armada de libertação nacional ou durante a recente guerra civil, se realiza também numa lógica que secundariza a importância dos actos de bravura ou de sacrifício para acentuar, de uma forma ou de outra, a pertença ao grupo. Isto significa que a afirmação conseguida durante os momentos de instabilidade (guerra) não se traduz numa real ocupação de poder. De uma forma geral, o lugar reservado a estas mulheres, após a(s) guerra(s), (e com a recomposição dos poderes políticos e militares) é, ou nas organizações de mulheres, ou em posições subalternas nos partidos. À «desordem» da guerra sucede-se a partilha ordenada e «natural» dos espaços e das funções. Ao contrário dos homens (mais jovens) com estatuto semelhante, a idade das mulheres na liderança política situa-se entre os 35 e os 40 anos, são viúvas, divorciadas ou solteiras. Uma parte relativamente importante das entrevistadas tem uma formação académica de nível médio e provas dadas de fidelidade ao partido. Há uma tendência clara de utilização de diferentes critérios no recrutamento de homens e mulheres, expresso, por exemplo, na existência de maior circulação e distribuição de poder entre homens, surgindo com alguma frequência «caras novas» ocupando posições importantes nas hierarquias partidárias. A inflexibilidade dos aparelhos face à renovação dos espaços de poder tem a ver com a impermeabilidade (impossibilidade?) das instituições à alteração/incorporação de modos diferentes de viver o político, ou seja, a manutenção/resistência à mudança, surgindo como condição de sobrevivência, põe em evidência a ambiguidade/conflito de um discurso de equidade e de igualdade com a forma como as organizações as exprimem (Gaspard, 1995). Por outro lado, o aumento da presença das mulheres no campo do poder político provoca o surgimento de algum desconforto, traduzido na utilização de argumentos relacionados com o respeito pela coesão partidária e na tentativa de limitar a participação ou envolvimento das lideranças partidárias femininas, sempre que se trata de avançar com propostas legislativas a favor dos direitos das mulheres. Como procurarei analisar na secção 4, se a inquietação produzida pela presença política das mulheres não se traduz ainda numa mudança do modelo de exercício de poder, há sinais de conflitualidade com o modelo de participação - tanto a nível do discurso como das estratégias -, visíveis, por exemplo, na circulação da informação e na concertação de posições entre as lideranças femininas, para além dos interesses partidários. As motivações para a participação política feminina, independentemente do grupo político, variam entre o reconhecimento que os outros fazem da sua capacidade e da necessidade da sua presença (o que as leva a aceitarem ou melhor a conformarem-se com a decisão), a resposta a injustiças individuais ou colectivas e o facto de serem sujeitas a escrutínio eleitoral. Como nos afirmou uma dirigente partidária da FRELIMO: «antes éramos nomeadas [...] não havia eleições. [...] Também quase sempre as mulheres só serviam par bater palmas [...], preencher o número. [...] Agora têm que nos ouvir, discutimos [...]. Sendo o campo político um espaço profundamente estranho às formas de socialização e de construção da identidade feminina, a vontade individual da mulher em participar em processos de decisão é encarada como desvio social. É assim que as poucas mulheres que lutam pelo poder são representadas no imaginário social como «homens» ou como «más mulheres». Esta representação negativa confirma-se quando são apenas mulheres a disputarem a mesma posição. Como nos afirmaram vários entrevistados e entrevistadas de diferentes partidos políticos, «as lutas de poder entre mulheres são consideradas como resultado da inveja que sempre existe entre mulheres, do ódio que têm pelas outras [...] e porque sempre preferem um homem a dirigir [...]». Os principais constrangimentos no acesso da mulher ao poder político situam-se, assim, no conflito entre os diferentes processos de socialização e entre estes e o modelo de organização política que, limitando a participação política da mulher, provocam o surgimento de conflitualidades entre os seus desejos e expectativas e as respostas que o campo político lhe oferece.
3. Representação do poder: do imaginário colectivo e da construção social da diferença As percepções que mulheres e homens têm do poder devem ser analisadas em função da experiência social de cada um dos grupos que podem, ou não, estar de acordo com os sistemas de valores dominantes. Por outro lado, sendo as representações elementos de coesão de um grupo face a outro grupo e, nesse sentido, expressando o sistema de diferenciações, são também componentes abertas à instabilidade e mudança. Isto significa que os conflitos entre representações no seio do mesmo grupo e espaço ou entre grupos e espaços diferentes ilustram não apenas estratégias de adaptação a contextos históricos particulares, mas respostas colectivas a formas de dominação ou, pelo contrário, constituem um meio de conservação da dominação. No que se refere à representação do poder pelas mulheres que desempenham, em Moçambique, tarefas de liderança, o discurso da grande maioria (independentemente das formas de acesso e motivação política) remete para os fundamentos normativos que orientaram a socialização. Neste discurso estão presentes duas variáveis: uma ligada à construção social da desigualdade «o homem nasce com poder» e outra que releva da acção política e que aparece como produto do exercício de poder pelas mulheres. As «disposições» inscritas nos «habitus» de mulheres e homens que levam à apropriação diferenciada das finalidades da acção política têm, como resultado, a exclusão das mulheres do poder, seja na esfera privada (embora as funções de conservação da família sejam principalmente garantidas pelas mulheres), seja na esfera pública, onde se reproduzem as disposições de um «habitus» não reconhecido como nuclear à ordem ou, antes, cujo reconhecimento social lhe vem precisamente da sua submissão ao modelo androcrático. Quer dizer que as mulheres, ou acordam o privado com o público numa lógica de submissão produzida na família, ou rompem com ela, adoptando os mecanismos de acção política que lhes confere uma aparente igualdade. Várias líderes da FRELIMO e da RENAMO afirmaram: «As mulheres têm que conquistar o poder. [...] Os homens não. [...] Nós temos que mostrar muito trabalho [...], não podemos dormir. [...] Quando cometemos falhas, todos apontam porque somos mulheres». Do mesmo modo, os homens dirigentes entrevistados dos diferentes partidos (apenas com diferenças na maior ou menor elaboração do discurso) acordaram no «valor» do trabalho político das mulheres sem, contudo, porem em causa os mecanismos de funcionamento da organização partidária ou os papéis tradicionais das mulheres. Como nos disse um dirigente partidário: ela é chefe, eu respeito-a, também a respeito em casa, mas ela é mãe e esposa e eu sou o chefe de família, são duas esposas diferentes. [...] As mulheres estão sempre a bater-se entre si [...]. Elas não devem esquecer que por detrás de uma mulher está sempre um homem [...]. A prática política tem permitido pôr a nu estas oposições/conflitos entre diferentes percepções do poder e do seu uso, ao mesmo tempo que permite a produção de elementos inovadores da representação de poder pelas mulheres. O poder é fazer coisas para ajudar as pessoas, é trabalho colectivo, é pedir opinião e depois actuar, é autoridade e é acção é acesso ao conhecimento, é ter sensibilidade. [...] Nós trabalhamos na base da passividade, não gostamos de agressividade [...]. Nós não queremos excluir os homens. Queremos que aceitem a diferença. [...] Há uma maneira nossa de estar no poder, não podemos esquecer que somos mães [...]. Eu gosto de ser mãe. Se na maioria das mulheres existe uma representação do poder como missão, como servir os outros, há nas mulheres dos partidos da oposição um maior grau de conflitualidade nas imagens que têm da sua participação política: «eu quero fazer ouvir a minha voz [...]. Criança que não chora, não mama. [...] Para mim poder é não ter medo de ir para a reeducação», disseram algumas dirigentes da Renamo. O sistema democrático aparece para a totalidade das mulheres como a possibilidade de afirmação: «agora me querem essas pessoas que te elegem é porque qualquer coisa gira em ti e a pessoa fica mais tranquila mais acomodada», disseram-nos dirigentes da FRELIMO, RENAMO e FAP. As diferenças na percepção do poder também se manifestam no modo como ambos os sexos descrevem a sua acção política. Se para mulheres e homens as finalidades do exercício do poder são quase sempre articuladas com os objectivos da organização, as dirigentes acentuam, num discurso frequentemente atomizado, acções concretas de mobilização das pessoas para a participação em programas de desenvolvimento social, ocupando a educação um lugar central nas suas preocupações políticas. No discurso masculino, frequentemente mais elaborado, a concentração no dirigente dos desígnios do seu partido como guardião da «ideia justa» surge como legitimação de uma visão de poder centralizada e absoluta. Por outro lado, as características da acção política também são percebidas como diferentes entre homens e mulheres não havendo distinções importantes entre partidos. Dizem as mulheres que os homens são interesseiros e que quando aparecem é porque há qualquer coisa de que querem usufruir. Defendem ainda que as mulheres são mais honestas e que a corrupção é com os homens. Acusam-nos de estarem convencidos de que podem fazer tudo e de, pelo facto de em casa serem chefes, pensarem que têm direito de o ser. Rematam dizendo que ser chefe é, para os homens, um direito. Dizem os homens que o poder está ligado a objectivos gerais e que é um exercício de autoridade. Defendem que as mulheres devem participar mas que elas são muito emotivas e que, depois, têm outras prioridades, como sejam a casa e os filhos. As representações diferenciadas são, pois, o resultado de conflitos que opõem as mulheres ao modelo cultural dominante, contendo estes conflitos ao mesmo tempo propostas de inovação cultural e consciência de uma relação social de dominação.
4. Alternativa(s) na acção política ou consolidação hegemónica do modelo político? Os riscos do reducionismo na explicação das formas de ocupação do campo político pelas mulheres exigem cuidados suplementares no tratamento do problema. Entre mulheres de tão diferentes grupos, etnias, religiões e ideologias, como identificar as regularidades que possam permitir atingir o global sem que o individual se perca? É possível encontrar, na pluralidade de olhares femininos sobre o político vivido e o político apropriado, laços harmonizadores? Em última análise haverá uma articulação entre as múltiplas desigualdades e as diferenças que permitem falar em formas específicas à mulher de ocupar o campo político? Algumas das minhas entrevistadas dos três partidos referiram que as mulheres gostam de ouvir, de pensar muito e que não gostam da guerra, apontando ainda para a necessidade de adaptar aquilo que pensam ao que os outros querem. Estas palavras, elucidando sobre os fins da socialização primária, mostram como, por um lado, a desigualdade nas relações sociais de género é uma permanência nas relações sociais entre homens e mulheres e, por outro lado, que essa desigualdade que estrutura o modelo social é um dos fundamentos da sua conservação e reprodução. Elementos como a competição, a hierarquização e «a violência como virtude masculina», essenciais ao funcionamento do modelo de acção política, se encontram ausentes do discurso feminino do poder (Colflesh, 2000: 7). A produção de um discurso inovador (nos espaços de poder), de inclusão, emocional e profundamente comunicativo, reflecte uma necessidade de transpor para o campo político os papéis aprendidos na família. A propósito, uma líder da FRELIMO afirmou-nos: «o que eu gosto mesmo é de falar com as pessoas [...], é de resolver problemas concretos [...]». Os sistemas de valores normativos da relação familiar que continuam a servir de suporte à actuação política da mulher, entram em conflito com os mecanismos de funcionamento do modelo político. Face a este conflito, a ocupação do campo político faz-se de forma diferenciada. Em primeiro lugar, há um grupo de mulheres que se adaptam ou procuram adaptar-se às regras, às hierarquizações e à estrutura partidária, conformando-se com a superioridade masculina e com posições subalternas. São delas as palavras: «que fazer [...] poder é mesmo ter força [...] e quem tem força é o homem [...]». Para estas dirigentes partidárias (muitas delas oriundas da OMM), a desigualdade de género na distribuição dos recursos, ou não é percebida como tal ou é naturalizada. As suas prioridades políticas acentuam os grandes objectivos do partido-pai, numa perspectiva de conformação à subalternidade. Conservadoras, quando confrontadas com possíveis alternativas para o campo político, nomeadamente no que se refere ao exercício de direitos, estas mulheres abrigam-se sob a protecção do juízo e da acção masculina. A adopção das regras do jogo político caracteriza um segundo grupo de mulheres líderes. Caracteriza-as um discurso profundamente masculinizado, profissionalizado e conflitual. Para este grupo, a competência para o exercício do poder é o critério orientador; as relações sociais de género e a discriminação da mulher são um problema que consideram solucionado, na medida em que as leis garantem, ou podem vir a garantir, os direitos humanos. Os direitos das mulheres inscrevem-se num quadro geral, neutral e regulador de comportamentos. As desigualdades e as diferenças entre homens e mulheres são apenas compreendidas do ponto de vista formal. No seio dos partidos não questionam a construção e a reprodução social da desigualdade, mantendo-se muitas vezes alheias à luta do movimento feminista. Demonstrativa é a afirmação de uma destas dirigentes: «quando vou ao Forum Mulher dizem ‘vocês, deputadas, não fazem nada pela mulher’, mas não é verdade, porque no partido temos que estar unidos a uma só voz, senão é um descalabro completo nas bases». A competência, conceito fetiche destas mulheres, leva-as a uma apropriação superlativa das regras impostas pela dominação masculina (Muraro, 1999). Reconhecidas e apelidadas pelos seus pares de cerebrais, frias e agressivas, às mulheres «adoptadas» são emprestadas qualidades masculinas que funcionam, simultaneamente, como factor de inclusão (face às organizações partidárias) e como factor de exclusão (face à condição feminina). Não subvertendo a ordem institucional, estas mulheres são, ao mesmo tempo, garantia, tal como o primeiro grupo, de reprodução dos mecanismos de dominação e marginais ao processo de reprodução social. Premiadas e punidas pela apropriação de um campo socialmente reconhecido como exclusivo dos valores e das práticas masculinas, estas mulheres realizam uma «oblação» da sua condição feminina, ajustando-se aos interesses partidários (Bourdieu, 1998). Nas relações de poder estas mulheres, têm, no limite, posições sempre subalternizadas, seja porque as suas «disposições» foram adquiridas contra o «habitus», levando-as a rupturas violentas (de ordem pessoal e social), seja porque sobre elas se exerce continuada e sistematicamente o controlo da «adopção». Por outro lado, não é por acaso que mais que os seus colegas homens, as mulheres «adoptadas» desenvolvem atitudes de comunhão com a organização e com a hierarquia, eliminando os pontos de divergência e conflito. A adesão ao partido ou a um projecto político deve ser entendido (para este tipo de liderança) como ortodoxia «consentida» (Ansart, 1977) em que a eficácia do campo político é tanto maior quanto ele concentra em si os interesses do colectivo totalizante e se situa acima da luta intra-partidária, numa absoluta conformidade com o poder imposto/consentido. Nesta ordem de ideias, o sistema democrático não representa para estas mulheres um imperativo necessário à participação feminina. Uma terceira forma de exercício de poder corresponde a uma subversão por dentro do poder. Quero com isto dizer que, embora não estejamos perante uma proposta de ruptura com o actual modelo político, as estratégias de ocupação do espaço político desenvolvidas (por um outro grupo de mulheres), contêm elementos de afrontamento dos mecanismos de funcionamento das organizações políticas (Hackney e Hogard, 1999). Esta posição não corresponde, em termos de biografia política ou pessoal, apenas a uma das categorias anteriormente identificadas. São antigas guerrilheiras, membros da organizações das mulheres, ou mulheres de carreira política. O que têm de comum estas mulheres? Muitas das nossas entrevistadas fazem afirmações como: «Precisamos trabalhar juntas. [...] Somos mulheres [...], sofremos. [...] Quero ser dona da minha casa. [...] Quero ser feliz. [...] Não vejo contradição com a mulher da RENAMO [...]». As mulheres deste grupo representam-se em primeiro lugar como mulheres, ou seja, com muitos e variados objectos de atenção, com essa capacidade plural de estar e viver em lugares e projectos diferenciados (Facio, 1999). Reivindicando o direito de acordar o privado e o público, rompendo com a rigidez e a classificação dos papéis e das estruturas, elas fazem e refazem o caminho entre a família e o partido; assumindo-se como diferentes, elas transferem para o campo político a emoção e o diálogo. Rejeitando os padrões masculinos e as suas categorias de análise, estas mulheres compõem um discurso inovador pleno de alegorias e utopias. Circulando a informação e o saber, encorajando a participação e a integração, rejeitando as hierarquizações dos espaços família/partido, elas subvertem os instrumentos de dominação. Na sua liderança, estas mulheres priorizam o sentido de missão, a responsabilidade perante os outros, a honestidade, a humanização do poder, a ética. Face a estratégias de dominação assentes na manutenção de poder político, estas mulheres adoptam uma linha de actuação que procura, através da exercitação da cidadania, questionar os mecanismos fundadores do modelo político. Não se identificando como vítimas, elas procuram espaços de afirmação que as transformem em sujeitos políticos. «Eu gosto de futebol [...] e já aconteceu eu chefiar delegações de futebolistas mas as pessoas lá fora nem apertam a mão, pensam que eu sou massagista ou esposa de um dirigente [...]». A coesão expressa por palavras fortes (honestidade, participação, missão) e por toda uma parafernália simbólica, é muitas vezes ambígua e contraditória. «Estou cansada [...] quero ficar na minha casa [...]. As mulheres são as piores inimigas das mulheres [...]. Eu trabalho para as mulheres mas parece que não entendem», são afirmações ilustrativas de um discurso emancipador e unitário. Não existindo neste grupo uma consciência colectiva ou individual de uma proposta alternativa ao modelo político dominante (traduzida num aparato ideológico reconhecido pelas produtoras e pelos receptadores), as práticas e o discurso (embora fragmentado) traduzem, por um lado, a incapacidade das actuais organizações em adaptarem/adoptarem novas experiências e novos conflitos e, por outro lado, mostram a existência de tensões, não apenas produzidas e reproduzidas dentro dos partidos (e que são afinal razão da sua eficácia), mas que são inovadoras relativamente à estrutura, hierarquia e mecanismos de funcionamento dos partidos políticos. Estas tensões, atingindo a natureza do modelo político dominante, constituem de facto uma nova via para acção política. Não é por acaso, que a honestidade, o diálogo, a participação nas escolhas das opções políticas seja palavras utilizadas não apenas como elementos de uma nova identidade política, mas também como oposição ao que consideram identificar o masculino. E, neste sentido, a grande maioria das nossas entrevistadas, mesmo aquelas que pertencem ao grupo das «adaptadas» fazem afirmações como: «as mulheres não bebem [...], são mais honestas [...]. Quando dizem que vão fazer é porque vão fazer [...]. As mulheres são mais sérias [...]. As mulheres pensam nos outros, são menos egoístas [...]». Nas relações de poder estabelecidas no contexto intra-partidário, estas mulheres são constrangidas na acção política pelo menor acesso aos recursos, pela ocupação de posições classificadas como femininas, pela invisibilidade no campo político. Algumas mulheres declararam que, se há carros, eles são sempre primeiro para os homens, que quando querem trabalhar nos distritos não têm meios, que as mulheres trabalham sempre muito mas que nunca são atendidas e que podem «dar» mais mas não as deixam. Participando em acções da sociedade civil em prol da defesa dos direitos das mulheres, raramente as suas posições são reconhecidas ou apoiadas pela organização. A pluralidade democrática permite desenvolver mecanismos de aceitação na acção política das mulheres, o que leva a que mesmo sem uma concertação formal de interesses, estas mulheres procurem construir a nível intra e inter-partidário, uma unidade política. O reconhecimento da diferença, reivindicado pelas mulheres é, de facto, uma luta contra a cultura da igualdade, que tem como objectivo principal esvaziar a luta feminista, submetendo-a a uma concepção legalista de direitos. O controlo ideológico masculino no seio das organizações partidárias é expresso, nas relações de poder, através de mecanismos que são, à vez, instrumentos de exclusão e de vigilância ideológica. Esse controlo pode ir desde a marcação sistemática das reuniões para a noite, até à vigilância do comportamento sexual da mulher. A persuasão constitui um meio importante de dominação, reflectida muitas vezes em apelos à «solidariedade entre camaradas» e à pertença ao «grupo escolhido», criando elementos unificadores do grupo por oposição ao «inimigo». Esta categorização, que é eficaz (no sentido de eliminar a contestação interna) para homens e para mulheres, é de uma grande violência simbólica, sempre que se trata de mulheres (Ansart, 1977). Trata-se, aqui, não apenas de eliminar oposições ou de conquistar mais poder, mas de sobrevivência do modelo de organização partidária. O que está em causa (embora não seja claramente aprendido) não é nem ganhar eleitores, nem derrotar o adversário interno; o que está em causa é a emergência de uma nova maneira de «estar» e «fazer» política. As estratégias difusoras da persuasão encontram assim, um tipo de resistências não controláveis pelo sistema. O exercício da democracia, no contexto dos sistemas globalmente legitimados, deixa de «satisfazer» a demanda de novos grupos, como é o caso das mulheres, em que a necessidade de acção mais plural e transversal aos diferentes espaços de produção do político, leva à «invenção» de uma acção política mais integradora da intervenção política/social. Na medida em que os partidos com a intenção de reforçar a pertença conservam os antigos elementos integradores, constituem-se, ao nível simbólico e ao nível da prática política, sucessivas contestações que permitem o surgimento de elementos identitários que configuram os novos meios de pertença (Ansart, 1977). Estamos assim, perante um duplo movimento de conservação/adaptação da antiga ordem institucional (com um universo simbólico e normativo de dominação) e de transgressão/recriação dos modos de pensar e vicer o político. Estes contextos «não hegemónicos» conduzem à reflexão, não apenas sobre o modo de estruturação do sistema democrático moderno, mas sobre a compartimentação que a democracia plural faz dos diferentes espaços e formas de exercer a democracia, ou seja, o que as mulheres que estão no poder «formal» reivindicam não é a participação igualitária ne decisão política, mas a inclusão da diferença (múltipla) no modo como se organiza e se exerce a política. A necessidade de fazer interagir o privado e o público na exercício do poder político feminino está presente em muitas das palavras das nossas entrevistadas: A sociedade não aceita ver uma mulher com o poder. [...] Dizem que a mulher deixa a família desorganizada [...], dizem que o marido não devia permitir que ela fique fora de casa [...]. A família muitas vezes com medo dos vizinhos não apoia a mulher. [...] Ela então por vezes tem que abandonar a política [...]. Este discurso ilustra a exigência de pensar o poder político através da família, lugar por excelência de construção das relações de poder fundamentadas na discriminação da mulher (Melkiori, 1997). Os mecanismos de construção das identidades reveladores da forma como se constrói a hierarquia familiar e como se articula a distribuição do poder, são elementos centrais para a análise da feminização do privado e da masculinização do público. Considerando o contexto de interacção entre o moderno e o tradicional existente em Moçambique, com aquele a submeter apenas formalmente a organização familiar tradicional à nuclearidade urbana - característica da maioria das entrevistadas - é útil, para a compreensão do diálogo entre privado e público, ter em conta alguns dos mecanismos de socialização da rapariga e do rapaz que constrangem diferente e desigualmente o acesso e o controlo dos recursos. Claramente socializadas para a domesticidade, as raparigas desenvolvem na família as capacidades que, na vida adulta, as legitimam como mulheres. A aprendizagem expressa na divisão de trabalho e na distribuição da autoridade na família tem como consequência a configuração de papéis e funções que definem o destino feminino. As suas competências preparam-na para a aceitação/conformismo da submissão. Ser dona de casa, mãe e esposa constituem para a mulher o cumprimento de uma missão, essência da natureza feminina. Esta vocação feminina para cuidar do outro exprime-se, do ponto de vista do sistema de valores, por um universo simbólico cuja eficácia se prolonga para além das relações familiares e, do ponto de vista da norma, por impedimentos concretos à partilha da autoridade.O constrangimento no acesso a recursos, sejam eles económicos, legais ou políticos, é suportado pelo sistema sexo-género, que garante a reprodução da desigualdade nos diferentes espaços sociais. Estes elementos estão presentes na identidade dos três grupos de liderança feminina. «Adoptadas», «adaptadas» ou «diferentes», as dirigentes partidárias revelam um acordo (que pode ou não ser aceite, tanto pelas «adaptadas» como pelas «adoptadas») com a socialização primária e com as categorizações sociais. Se nos dois casos extremos da tipificação da liderança, o acordo entre o partido e a família se resolve pela apropriação («adoptadas») e pela rejeição/ocultação do modelo político («adaptadas»), no terceiro caso («diferentes») os mecanismos de subordinação, embora exprimindo-se de forma diferenciada, são claramente percebidos nas relações de poder intra-partidárias. E não apenas a representação negativa e desvalorizante da acção política feminina está presente como é claramente percebida por estas mulheres. Transferindo para o campo político os papéis consensuais aprendidos na família, não enjeitando a socialização para «o outro», a mulher política procura reconstruir o espaço público da intervenção numa base de igualdade na diferença, ao mesmo tempo que desenvolve estratégias de adaptação ao modelo familiar. O meu marido não faz política [...], então eu procuro discutir com ele [...], procuro integrá-lo na vida do partido [...], peço-lhe a opinião. [...] A mulher tem responsabilidades no partido, mas na casa não [...]. Na casa não devo esquecer que sou mãe [...]. Não gosto que ninguém arrume a roupa do meu marido, eu é que devo fazer isso. [...] Eu antes de ter empregado, cozinhava toda a noite porque de dia tinha tarefas. Não podendo afrontar o conflito com a subalternidade doméstica, a mulher procura nas organizações partidárias aumentar o seu espaço de intervenção, incorporando nas formas de exercício de poder a sua diferença. Questionando, por um lado, o essencialismo que biologiza as relações sociais de género e rejeitando, por outro lado, as acusações essencialistas dos pós modernos, as teóricas feministas da diferença reafirmam o género como «o conjunto de valores e características que determinam a masculinidade e a feminilidade em cada cultura e em cada momento histórico» (Facio,1999). É esta prática integradora, múltipla e inovadora de algumas líderes femininas, em Moçambique, que, continuada, pode produzir efeitos emancipatórios sobre o modelo político.
5. Conclusões: as dúvidas A introdução do multipartidarismo, em Moçambique, que se seguiu a um período de orientação socialista, realiza-se num contexto de dominação hegemónica do modelo democrático. Num país sem tradição democrática (pelo menos aquela que se inscreve na modernidade ocidental), saído de uma situação colonial e de uma guerra civil, dilaceradora das pessoas e das instituições, é ao Estado que compete organizar e definir as regras do novo jogo político, estruturado em torno dos protagonistas do conflito armado. Com o fim da guerra e o aumento da dependência económica, a formalização da democracia vem pôr a nu, por um lado, a extrema fragilidade do novo campo político - dividido em duas forças sem projecto político - e, por outro lado, a incapacidade de acção e inovação das forças sociais (Touraine, 1994). A fraqueza da sociedade civil (no seu sentido mais amplo), a dependência económica e a instabilidade social conduzem ao esvaziamento do debate político, centrando-se a vida política na discussão da pequena solução económica. Por outro lado, os partidos políticos, cada vez mais enclausurados numa lógica de poder, tornam-se indisponíveis para serem catalizadores da acção democrática. Por sua vez, o Estado, definidor do modelo de organização política no que ela comporta de normas, hierarquias e valores, não tem sido capaz de recriar os mecanismos que permitam a inclusão social dos cidadãos. Relativamente à luta das mulheres pelo acesso aos direitos, os partidos ou a desclassificam ou a transformam em capital na sua relação com as agências internacionais ou com as elites urbanas (em período eleitoral). A participação política das mulheres inscreve-se, assim, aparentemente, num contexto frágil do ponto de vista da cultura democrática. O acesso ao poder pelas mulheres continua a ser constrangido pela socialização primária, que a discrimina face a recursos como a escola, a saúde e o emprego, que a mantém numa situação em que novos mecanismos de desigualdade se produzem. É exemplo disso o aparecimento violento das mulheres no mercado informal, o que, levando à ruptura com o «núcleo» identitário, permite tornar visíveis antigos conflitos, ao mesmo tempo que aparecem sobre/contra eles novos conflitos. Mas são estas rupturas que potencializam o aparecimento de elementos emancipatórios: agravam-se os conflitos com o privado, na medida em que as hierarquias e as posições aí definidas são interrompidas pela lógica do mercado, de um mercado de trabalho que faz apelos insistentes à capacidade de convencer, de enganar, de lutar pela sobrevivência. É esta luta pela sobrevivência económica que permite desencadear uma série de contestações e inconformismos que, tendo como resultado imediato a atracção da violência sobre si (principalmente da violência intra-familiar), cria, por outro lado, as condições para o aparecimento de acções colectivas de mulheres. A fragilidade do debate político nos partidos, a estratificação dos seus aparelhos em moldes não democráticos e, principalmente, a ausência de uma identidade política/ideológica, provocam dois efeitos de sinal contrário. Se, por um lado, a concepção do campo político, como campo totalitário (em que as redes de fidelidade/compromisso são determinantes na circulação do poder), produz um esclerosamento da vida partidária e o seu afastamento das expectativas sociais (e, portanto, a diminuição da sua capacidade mobilizadora), por outro lado, surgem, no interior dos partidos, grupos (sem contudo serem dotados de um sistema de pensamento expresso em práticas unitárias) cujo discurso contem uma força de mobilização capaz de produzir tensões refundadoras. Embora a prática política de muitas mulheres dirigentes não seja alicerçada por uma estratégia consciente de emancipação, a fraqueza política das organizações partidárias permite a configuração de um espaço dentro do partido, onde as mulheres iniciam a produção de um discurso de auto reconhecimento. Ao longo da pesquisa e principalmente à medida que os dados iam sendo articulados foi possível identificar três formas de ocupação do espaço político que correspondem a modos diferenciados de apropriação, adaptação e contestação do modelo político dominante. A análise realizada não permite concluir possíveis agrupamentos por classe etária, histórias de vida, origem social, formação académica ou ideologia política. Ficou evidenciado, que independentemente dos percursos políticos, da participação nas guerras (a de libertação e a guerra civil), as mulheres incluem-se numa três categorias identificadas: as «adoptadas», as «adaptadas» e as «diferentes». No entanto estas formas diferenciadas de pensarem e viverem o político não podem servir para uma compartimentação rigida da ocupação do espaço político. Como procurei demonstrar, a categorização é resultado de uma tentativa de encontrar (a partir da operacionalização do conceito foucaltiano de poder), tendências comuns face ao modelo de organização política. É assim que mulheres com formação académica de nível médio ou superior se podem encontrar tanto no grupo das que adoptam o modelo masculino de exercício de poder, como no grupo das que procuram subverter e confrontar esse mesmo modelo. Do mesmo modo, os partidos políticos e as eventuais diferenças na sua constituição e acção, não determinam a posição das mulheres face aos padrões masculinos de exercício do poder. Da pesquisa realizada julgo que se devem procurar fundamentalmente os mecanismos de diferenciação do comportamento político feminino nas interacções entre a exclusão/inclusão social e política, realizadas tanto no campo restrito das organizações partidárias, como na família ou ainda em outros meios de pertença, como sejam as organizações femininas ou os sindicatos. No caso de Moçambique, é interessante constatar, para retomar uma ideia anteriormente exposta, que, se a situação das instituições democráticas condiciona a inclusão da diversidade, as características particulares do país permitem abrir novas perspectivas, não apenas no campo dos direitos das mulheres mas, fundamentalmente, no aparecimento, possível, de alternativas à prática democrática, protagonizadas pelas mulheres. Este trabalho evidencia, no caso concreto de Moçambique, que a ambiguidade existente entre o sistema democrático (pouco consistente e regulado) e a instabilidade da vida política e social, potencializam a criação de espaços de liberdade e de inovação. Só assim se compreende que, sob um modelo perfeita e claramente (muitas vezes até ao absurdo, se considerarmos o tempo histórico) androcratizado, haja um grupo de mulheres dirigentes que através da contestação à dominação masculina nos partidos, procura, através da sua prática, um reconhecimento da diferença e uma reelaboração de novos valores. Ao mesmo tempo que preservam o seu eu emocional, as mulheres inscrevem a sua acção no colectivo, procurando sustentar a diferença e aumentar a inclusão (Facio, 1999). No entanto, as possibilidades de alternativa e da sua formalização como recriação da vida democrática dependem de inúmeros factores, entre os quais o não menos importante é a capacidade do sistema de incluir a diversidade, uma diversidade que não se traduza em oposição mas em combinação de vida privada e vida pública, de sucesso profissional e relações de afectividade, de ligações familiares [...], mas também em procurar que os homens elaborem outras formas de combinação dos diferentes aspectos da sua existência (Touraine, 1994: 156).
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