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Ana Cristina Santos Orientação sexual em Portugal: para uma emancipação
Introdução Num contexto de hegemonização da ordem neoliberal global, as minorias constituem contra-poderes, cujo potencial de resistência e subversão pode efectivamente resultar numa renegociação das regras do jogo. Neste sentido, o complexo, heterogéneo e muitas vezes difuso movimento lésbico, gay, bissexual e transsexual (LGBT), coloca desafios importantes ao pensamento sociológico contemporâneo (Stein e Plummer, 1996; Hawkes, 1996; Seidman, 1997). No âmbito de uma reflexão sobre as alternativas de emancipação social, são dois os aspectos centrais do debate em torno do movimento LGBT. Por um lado, avolumam-se as evidências históricas da opressão que vitimou homens e mulheres homossexuais, bissexuais e transsexuais ao longo de séculos, à mercê da hegemonia heterossexual. Desde os tempos do Tribunal da Santa Inquisição até hoje, são conhecidos inúmeros casos de perseguição, tortura e morte com base na orientação sexual, factos que ainda são legalmente permitidos em muitos países. Mas mais do que recordar factos já conhecidos, importa questionar se esta forma de opressão contém necessariamente em si o potencial para a emancipação. Por outras palavras, será a opressão social de um determinado grupo minoritário condição suficiente para que este se torne contra-hegemónico? Por outro lado, a partir dos anos 80, a chamada «indústria rosa», tornou-se um negócio visivelmente rentável, permitindo a criação e desenvolvimento de produtos culturais específicos, de uma imprensa própria, de bares, discotecas, saunas, hotéis, sex-shops, etc, bem como o alargamento do circuito turístico gay internacional. Para além dos processos de globalização permitirem a expansão deste mercado especificamente gay, verifica-se uma maior disponibilidade para consumir produtos «rosa» por parte dos homens homossexuais. Essa capacidade decorre de factores como um estatuto sócio-económico alegadamente mais elevado, por um lado, ou as campanhas publicitárias especificamente orientadas para o consumidor gay que começam a dar os seus frutos, por outro. Por fim, a crescente visibilidade pública da homossexualidade, patente, por exemplo, nas frequentes participações em debates e manifestações, espelha os benefícios de que o movimento LGBT usufruiu por ter apostado na sua globalização, obtida sobretudo através do aproveitamento dos meios de informação electrónica (Internet) e da crescente mobilidade geográfica (viagens turísticas). O presente capítulo divide-se em quatro secções. Começaremos por uma reflexão de carácter teórico em torno dos conceitos de igualdade e diferença, conducente a uma problematização sobre as condições e possibilidades gerais que o capitalismo permite à luta pela emancipação sexual. Seguir-se-á uma análise das especificidades da sociedade portuguesa contemporânea, considerando para o efeito questões como a situação de semiperiferia, a fraqueza da sociedade civil e o domínio da moral judaico-cristã. Depois, passaremos a uma reflexão mais empírica sobre as estratégias, alianças e objectivos político-sociais das organizações LGBT portuguesas, enquadrando-as no processo de globalização do movimento LGBT a nível internacional. Para tal, serão considerados documentos, literatura interna e outros estudos teórico-empíricos realizados sobre a matéria, privilegiando-se ainda a observação directa de eventos públicos recentes organizados pelo próprio movimento, nomeadamente a Marcha do Orgulho Gay (Junho de 2000), o Arraial Pride (1999 e 2000) e o Festival de Cinema Gay e Lésbico (1999 e 2000). Por fim, com base no envolvimento do movimento LGBT português noutras lutas pelo direito à diferença e à não discriminação, procuraremos avaliar o potencial contra-hegemónico da luta pela emancipação sexual.
1. Construindo a igualdade e a diferença Os sistemas de desigualdade e exclusão em que nos enredamos quotidianamente resultam de complexas teias de poder, através das quais grupos hegemónicos constróem e impõem linguagens, ideologias e crenças que implicam a rejeição, a marginalização ou o silenciamento de tudo o que se lhes oponha. Este é um processo histórico de hierarquização, segundo o qual uma cultura, por via de um discurso de verdade, cria o interdito e o rejeita, definindo uma fronteira para além da qual tudo é transgressão. É com estas regras que todos os grupos atingidos pelo interdito social - os loucos, os criminosos, os ciganos, os homossexuais, etc. - são empurrados para a margem da heterotopia (Santos, 1999). Quando falamos de igualdade e diferença, estamos necessariamente condicionados por um contexto que não é, pois, neutro. Falar do direito à diferença nunca é o mesmo que reivindicar direitos iguais para todos. O direito à diferença exige a especificidade sem desvalorização, a alternativa sem culpabilização, a aplicação rigorosa de um imperativo categórico assim enunciado: temos o direito a ser iguais sempre que a diferença nos inferioriza; temos o direito a ser diferentes sempre que a igualdade nos descaracteriza (Santos, 1999: 45). Por isso propomos o conceito de universalismo útil, para designar uma política em que a difusão dos princípios universais da não discriminação se articula com a manutenção de recursos identitários constitutivos de subculturas valorizadas pelos sujeitos envolvidos. Assim se torna possível defender uma aplicação generalista das leis e, simultaneamente, uma protecção jurídica direccionada para um grupo tendencialmente excluído. Essa parece ter sido a dupla preocupação do Estado português quando, a 15 de Março de 2001, foram aprovados no Parlamento os diplomas visando a economia comum e as uniões de facto independentemente do sexo. A aprovação de ambos os diplomas torna clara a necessidade de discriminar positivamente os cidadãos homossexuais. Na verdade, nada impediria que um casal homossexual beneficiasse da protecção jurídica prevista na lei da economia comum. Todavia, o diploma sobre a economia comum foi considerado insuficiente pelas associações LGBT nacionais, uma vez que destituía a relação familiar LGBT da sua componente afectiva, reduzindo-a a uma vertente meramente económica. É por esta razão que, durante a manifestação de rua organizada a 6 de Fevereiro de 2000, frente à 6ª Conservatória do Registo Civil, em Lisboa, diversos casais de lésbicas e gays trocaram beijos enquanto empunhavam cartazes onde se lia: «Isto não é uma economia comum!». A lei sobre as uniões de facto, ao reconhecer claramente a sua aplicação, no art.1º, a «duas pessoas, independentemente do sexo», visa, assim, precaver qualquer interpretação mais excludente da protecção em causa. Conclui-se, pois, que o caminho para uma sociedade mais inclusiva para todos passa por etapas em que não é útil nem justo promover um universalismo essencialista que não considera as especificidades dos contextos. O universalismo útil deve conduzir a políticas para a igualdade, evitando contudo quaisquer medidas homogeneizantes. Quem pode homogeneizar é sempre quem está no topo da pirâmide do poder. É devido a este risco de homogeneização que alguns activistas LGBT têm vindo a tecer fortes críticas ao discurso em defesa da igualdade, argumentando que os «direitos iguais» visam, em última instância, anular a diversidade no seio do próprio movimento LGBT. De facto, o reconhecimento de direitos aos casais LGBT pode ser interpretado como um incentivo ou uma recompensa concedida a um modelo único de comportamento sexual, desta feita muito próximo dos modelos heterossexuais mais convencionais, isto é, uma relação estável e monogâmica (Tatchell, 2001). A reflexão sobre igualdade e diferença não pode deixar de ser enquadrada no marco do neoliberalismo, onde estes pólos se entrecruzam, aproximam e divergem, constituindo redes complexas e dinâmicas, nem sempre simples de destrinçar. A relação entre o movimento LGBT português e o sistema capitalista é permeada por contradições que decorrem dessa complexidade e da necessidade de articular constantemente os recursos disponíveis para grupos que, lutando pela igualdade de direitos, acenam com a bandeira do orgulho na diferença. Segue-se uma análise necessariamente breve sobre as condições que o capitalismo impõe à luta pela emancipação sexual, na tentativa de perceber se esta pode ou não ter pleno êxito no contexto de uma sociedade capitalista. 1.1. (Des)igualdades no marco capitalista Como é facilmente aceite, em situações de miséria material extrema, em que os sujeitos se debatem com um esforço constante pela sua própria sobrevivência, resta pouco espaço (forças?) para lutar por outras causas aparentemente menos cruciais. Quando as condições objectivas de existência dos sujeitos melhoram, o espectro de reivindicações sociais aumenta, uma vez que se tornam visíveis outras necessidades, que não de pão, mas, por exemplo, de liberdade de expressão ou de auto-determinação sobre o corpo. É neste sentido que a emergência de um sistema capitalista proporcionou algumas condições essenciais ao surgimento do movimento homossexual. De entre estas, destacamos o salário mensal e a produção de bens de consumo. Num artigo frequentemente citado, D’Emilio (1996) argumenta que foi o desenvolvimento histórico do capitalismo - mais especificamente o seu sistema de trabalho-livre -, que permitiu que um largo número de homens e mulheres em finais do século XX se auto-denominassem gays, se vissem como parte de uma comunidade de homens e mulheres semelhantes e se organizassem politicamente com base nessa identidade (1996: 264). De facto, ao retirar à unidade familiar o seu papel tradicional de produtor económico, o sistema capitalista converteu utilitariamente a família num espaço de fortalecimento e restabelecimento das relações de afectividade que permitiriam ao operário fabril manter um elevado desempenho profissional, tal como o sistema exigia. Inesperado neste processo foi o facto da família nuclear passar a ser, antes de mais, um espaço de procura de bem-estar e felicidade, onde se colocam sentimentos acima de obrigações. Abriu-se, assim, o horizonte a novos modelos familiares que transcendem os tradicionais laços de sangue. A 24 de Março de 2000, a comunicação apresentada pela ILGA-Portugal na Cimeira Alternativa definiu o significado de família para esta organização LGBT: Como unidos de facto que muitas vezes também somos, somos também a favor da família, entendida como local privilegiado de afectos, e não como um negócio jurídico. Para nós a família é a velha família que herdamos - e que em muitos casos está em crise grave - mas são também as novas famílias de casais do mesmo sexo, mães solteiras, mães lésbicas, pais solteiros, viúvos, gays, bissexuais, transexuais, famílias de filhos adoptados, de filhos inseminados, todos os que sentem em família, no lar onde são criados, cuidados, tratados e amados (Rodrigues, 2000). Esta transformação afectou a própria família heterossexual. O número de filhos por casal, por exemplo, diminuiu drasticamente, uma vez que as crianças, deixando de ser necessárias para a economia doméstica enquanto mão-de-obra, passaram a ser desejadas por razões afectivas. O desenvolvimento dos mercados representa também uma maior circulação de pessoas e bens, o que fomenta a troca de informações e experiências que, de outra forma, permaneceriam desconhecidas. É neste sentido que António Serzedelo, presidente da Opus Gay, argumenta que a aposta política no crescimento económico trouxe para Portugal as importante estradas, as importantes pontes, que trazem ou não levam coisa nenhuma, mas isso é outra questão, e que trouxeram também por essas estradas muitas ideias europeias caras às burguesias urbanas. E, como efeito secundário certamente não previsto, vieram também com isso, nos aviões, nos autocarros, nos caminhos de ferro, estas ideias liberalizantes que são consequência da liberalização do capital. É uma consequência contraditória do capitalismo. Por um lado, obriga as pessoas a aceitarem as sexualidades de cada um; por outro lado, ao próprio capital não lhe interessa que haja homossexuais porque parte do princípio de que precisa de mão-de-obra e portanto os homossexuais eventualmente não seriam criadores de mão-de-obra porque não podiam ter filhos (Santos e Fontes, 1999). E, de facto, a década de 90 testemunhou o nascimento de um mercado LGBT português, constituído sobretudo por espaços de diversão nocturna, nomeadamente bares e discotecas, mas também por saunas, uma agência imobiliária, um hotel, uma agência de viagens, uma livraria e a revista Korpus, para além dos diversos serviços disponibilizados pelas próprias associações. Portanto, parece haver já a percepção de que os homossexuais também são consumidores, cujo poder de compra constitui um importante factor de atracção comercial, embora em Portugal a expressão deste mercado ainda se afaste das indústrias «rosa» de países como os Estados Unidos, o Reino Unido ou mesmo Espanha. De qualquer maneira, o desenvolvimento do poder sócio-económico deste grupo tem permitido uma maior capacidade de negociação dos direitos sociais e políticos, bem como um crescimento na visibilidade pública da homossexualidade. Tal como refere Santos, «muitos dos grupos sociais ‘diferentes’, minorias étnicas e outros, começaram a ter recursos organizativos suficientemente importantes para colocar na agenda política as suas necessidades e aspirações específicas» (1999: 23). No outro lado desta moeda, a ideologia capitalista surge como génese da opressão sexual, aspecto sobre o qual nos debruçaremos nas próximas linhas. Alguns estudos identificam a família nuclear burguesa - definida enquanto institucionalização económica das relações pessoais no contexto do sistema capitalista - como o principal factor de justificação para a homofobia. Esta opressão remonta ao período de implementação do modelo familiar burguês, onde é incorporada a «sexualidade economicamente útil e politicamente conservadora» de que nos fala Foucault (1994: 41). É com este modelo familiar que se introduz a divisão sexual do trabalho segundo a qual a mulher funcionava como um garante da estabilidade doméstica, cuidando das roupas, da confecção dos alimentos, das limpezas e das crianças. Este papel, embora servisse plenamente os propósitos do sistema económico, não tinha tradução directa no reconhecimento social que lhe era atribuído, remetendo a mulher para a realização de tarefas rotineiras consideradas pouco relevantes. Embora a partir da revolução industrial o mercado de trabalho tenha, progressivamente, absorvido mão-de-obra feminina, o papel tradicional da mulher no lar não se alterou radicalmente (Ferreira, 1981). Na verdade, a ideologia capitalista construiu e disseminou fortes dicotomias sexuais que atribuem a homens e mulheres papeis diferentes e frequentemente opostos. A homofobia é uma das faces desta ideologia patriarcal, uma vez que sujeitos, sejam eles homens ou mulheres, que se consideram iguais e lutam com acções e discursos idênticos pelo direito à diferença, constituem uma verdadeira ameaça a um sistema que se construiu com base em divisões dicotómicas em função também do sexo. Por outras palavras, a burguesia, aterrorizada pelo espectro comunista da igualdade entre homens e mulheres, classifica a igualdade sexual como não-natural. A homossexualidade é também classificada como não-natural e, como tal, uma ameaça ao domínio burguês, precisamente porque rejeita a ‘natural’ sociedade burguesa reflectida na ‘natural’ relação burguês/proletário da família nuclear (LARG, 1996: 350). Ainda nos nossos dias, é frequente os trabalhadores homossexuais serem despedidos ou bloqueados na sua progressão de carreira - o que é designado na gíria por «ficar na prateleira» - por motivos que, longe da esperada avaliação de desempenho, se prendem claramente com uma orientação sexual inferida ou assumida. O conhecimento sobre este tipo de discriminação que atinge trabalhadores LGBT levou à aprovação, no 6º Congresso Nacional da Central Única de Trabalhadores, realizado em São Paulo, no Brasil, em Agosto de 1997, de uma moção de apoio às reivindicações do Movimento de Gays, Lésbicas e Travestis: O 6º CONCUT resolve: [...] combater a homofobia dentro dos sindicatos e locais de trabalho, desenvolvendo uma política que vise a supressão da discriminação contra gays, lésbicas e travestis trabalhadores nas organizações sindicais, e na sociedade em geral, em comum acordo com as entidades que já lutam contra esse preconceito (CUT, 1997: 61). Fora do âmbito do trabalho, de cada vez que é rejeitada a custódia de um filho a um pai ou a uma mãe homossexual, que um casal LGBT evita manifestações públicas de carinho ou que um gay é espancado por não ser heterossexual, estamos perante uma subjugação da diferença à hegemonia heterossexual, o que também serve os interesses da burguesia capitalista. O facto de esta opressão se exercer em função da sexualidade, tal como também sucede em função da raça, classe ou sexo, revela quão poderosas são as armas do capitalismo para destituir os sujeitos do poder de resistir, remetendo-os ao isolamento e à invisibilidade pelos motivos mais diversos. Para além destas formas mais directas de exclusão por razões de homofobia, o alegadamente superior poder económico dos homossexuais não é condição suficiente para a sua emancipação. Em mensagem difundida via e-mail em Agosto de 2000, a organização australiana Queers United to Eradicate Economic Rationalism (QUEERS) alertava para a falsa aceitação de que os homossexuais aparentemente estariam a beneficiar pelo facto do poder económico os considerar um bom nicho de mercado. Na referida mensagem, o grupo rejeitava essa pretensa aceitação, argumentando que «o nosso lugar de direito na sociedade não deve ser comprado. A libertação não provirá do consumo» (QUEERS, 2000). Esta atitude de rejeição de um estilo de vida LGBT caracterizado por uma elevada capacidade de consumo está na base da realização do «Queeruption», uma celebração de orgulho gay alternativa, ostensivamente pouco comercial e fortemente politizada, planeada para Londres e São Francisco, visando combater a imagem de uma identidade gay que parece «ter menos a ver com a orientação sexual e mais com a marca da cerveja que bebes, o carro que conduzes ou onde decoras a tua casa» (Fox, 2001). O bairro madrileno de Chueca constitui um outro exemplo. Embora seja um espaço aparentemente receptivo à comunidade LGBT, onde o comércio e a indústria se desenvolveram tendo em vista o consumidor gay, a verdade é que Chueca mais não é do que um gueto comercial, à volta do qual se desenvolveu um determinado estilo de vida LGBT, isto é, uma comunidade com poder de compra, que cuida do corpo e que se dilui, sem muitas inquietações de cariz identitário, no seio de uma sociedade que continua a ser patriarcal e heterossexista. Uma vez mais, o consumo não implicou uma efectiva inclusão cidadã, mas tão somente a apropriação de um bairro circunscrito. Um dos maiores riscos colocados pelo «consumo rosa» é o da subversão dos objectivos emancipatórios das organizações LGBT, tal como aponta Eugeni Rodriguez (2000), da Frente Gay de Libertação da Catalunha: A construção desta rede passa por ridicularizar, marginalizar e criminalizar o movimento de libertação gay. (...) A união de empresários gays com políticos, desejosos por normalizar a homossexualidade, é a base deste lobbie. Os direitos dos gays já não passam pelo confronto, mas por se encaixarem na sociedade de consumo, limitando a acção a certos bairros e certos horários. Em Portugal, Vitorino (2000) tem vindo a alertar para o perigo de se confundir o papel das associações, enquanto rede de suporte e integração dos jovens LGBT, com o papel desempenhado pelos estabelecimentos comerciais, direccionados sobretudo para a diversão, consumo e maximização do lucro. Uma diferença óbvia entre ambos é o facto de um homossexual pobre, habitando em meio rural, aterrorizado pela possibilidade da sua orientação sexual ser denunciada socialmente, apresentar muitas diferenças relativamente a outro homossexual cuja capacidade económica lhe permite integrar circuitos de turismo gay, participar em festas privadas ou ir assiduamente a saunas e bares nocturnos na capital.
2. Condições e especificidades jurídicas, sociais e religiosas do país Para entendermos a emergência do movimento LGBT português, é necessário enquadrá-lo no seu contexto espácio-temporal, cujas especificidades decorrem também da posição semiperiférica que o país ocupa no sistema mundial. Com efeito, a sociedade portuguesa apresenta características que a aproximam dos países centrais, paralelamente a outras que a equiparam aos países periféricos. A crescente aproximação do país ao resto da Europa, que culminou com a adesão à União Europeia em 1986, resulta no esforço de equiparar o aparelho jurídico nacional às constituições e códigos legais de outros países europeus. Oito anos após a revolução para a democracia de 1974, e na esteira desta lógica de aproximação face à Europa central, houve uma reforma do Código Penal português em 1982. Afirmando o princípio de que a tarefa do direito penal é a protecção da liberdade de determinação e a autenticidade da expressão sexual das pessoas e não a tutela da moralidade sexual, o novo Código Penal deixa de criminalizar as condutas sexuais livremente praticadas por adultos, em privado. Estão neste caso, entre outros, o adultério, o incesto, a prostituição ou a homossexualidade - que figuravam nos códigos anteriores (inclusive no projecto reformador de 1966) como «crimes contra a honestidade» ou «crimes contra os costumes». Só os «crimes sexuais» são agora puníveis: a violação, o estupro, o ultraje público ao pudor e o atentado ao pudor de menores. E, por esta razão, o novo Código passa a punir a homossexualidade apenas nos casos que envolvem menores de 16 anos (Artigo 207º). Com as alterações introduzidas no Código Penal em 1995, as relações homossexuais com um/a adolescente entre os 14 e os 16 anos continuam a ser punidas, ao que se contrapõem as relações heterossexuais nas mesmas circunstâncias, em que o legislador admite a possibilidade de o/a menor com idade superior a 14 anos dar o seu consentimento informado (Artigos 174º e 175º). Uma das especificidades de Portugal relativamente é a frequente inconsistência entre a lei formal e a sua aplicação efectiva. Essa realidade afecta também o modo como a sexualidade é vivida, permitindo a manutenção de atitudes e comportamentos pouco coerentes quando confrontados com a progressividade legal que se procura afirmar. Tal descoincidência pode operar através de diversas formas: um excessivo intervalo temporal entre a aprovação da lei e a sua regulamentação; a não aplicação ou a aplicação selectiva da lei; ou a utilização instrumental da lei (Santos, 1992: 135 e ss.). Desde o último quartel do século XX, a sociedade civil portuguesa tem vindo, nos últimos tempos, a conquistar espaço no território da reivindicação, sendo palco de emergência e acção dos diversos movimentos sociais, o mais recente dos quais é o movimento LGBT. Todavia, quase meio século de ditadura e permanência de um forte poder ideológico alimentado pela moral católica (o que analisaremos adiante), resultou num visível défice de intervenção no espaço público, patente na fraqueza dos movimentos sociais existentes. Contrariamente ao que sucedeu em muitos países centrais, Portugal não teve nenhum movimento social forte, embora existam associações activas em matéria de direitos das mulheres, combate ao racismo ou, mais recentemente, protecção ambiental. Se relacionarmos o défice de intervenção da sociedade civil portuguesa com as características da sua base social de apoio, constata-se que «a fragilidade dos movimentos de contestação se deve ao reduzido peso das novas classes médias e, consequentemente, ao facto de as populações (rurais) apenas se mobilizarem quando os seus interesses materiais e imediatos estão ameaçados» (Rodrigues, 1995: 7). A fraqueza da participação cívica é contrabalançada por momentos de forte activismo e mobilização de determinados sectores da população em torno de questões que afectam e/ou ameaçam directamente o quotidiano das pessoas. Foi assim que, em 1998, o país assistiu à eclosão súbita de grupos de cidadãos, organizados no espaço de dois meses para fazerem campanha no período que antecedeu o referendo sobre a despenalização do aborto. Num país onde as questões das políticas sexuais e dos direitos reprodutivos não têm uma tradição aprofundada, assistiu-se a um aceso debate público sobre sexualidade, no qual, para além dos especialistas, o cidadão comum desempenhou um papel activo. Tal participação em tempo de campanha não teve, apesar de tudo, tradução directa na percentagem de votação no referendo, que se ficou pelos 31,94%. A (não) participação cívica dos portugueses em debates ou movimentações em torno de questões sociais é em grande medida influenciada pela posição que a Igreja católica assume relativamente aos diversos temas em causa. Na verdade, o clero português tem demonstrado um forte poder de intervenção social, quer de bloqueio, quer de mobilização, determinando em muitos casos o rumo tomado pelas decisões políticas. Dada a centralidade do papel desempenhado pela religião em Portugal, particularmente incisiva em matéria de sexualidade, é sobre ela que nos debruçamos em seguida. 2.1. O catolicismo português A sociedade portuguesa é profundamente marcada por uma forte influência moral judaico-cristã, reforçada pelas frequentes intervenções da Igreja Católica em matéria de sexualidade. De facto, a Igreja Católica portuguesa desde há muito se habituou a definir as fronteiras entre o socialmente desejável e o moralmente condenável, e é entre estes dois pólos que se disputa o jogo da emancipação sexual. Como veremos, a moral religiosa dominante bloqueia tanto a emancipação da mulher (reprovando sistematicamente o uso de contraceptivos, a interrupção voluntária de gravidez ou o direito ao sacerdócio), como a emancipação dos direitos LGBT (manifestando-se publicamente contra as uniões de facto entre homossexuais). No que respeita à contracepção, em Março de 1996, um anúncio televisivo elaborado por uma ONG de luta contra a sida mostrava um padre a entregar um preservativo a um jovem casal no pátio da Igreja. A Igreja católica reagiu violentamente, considerando o anúncio um disparate absoluto e de mau gosto. Em 1998, a propósito do referendo sobre a despenalização do aborto, o clero teve uma manifesta influência sobre os resultados posteriormente obtidos. A 3 de Fevereiro de 1998, em resultado de uma reunião da Conferência Episcopal Portuguesa, foi publicada uma carta pastoral afirmando que, «em caso de referendo, ‘os católicos e demais cidadãos não podem alhear-se, sendo seu dever pronunciar-se a favor da vida’». Na semana que precedeu o referendo, a catedral de Braga, no Norte, expôs dois cartazes apelando: «Com inteligência e em consciência, não ao aborto» (Praça, 1998: 8). Entre muitos outros exemplos, a estratégia da Paróquia de Nossa Senhora de Lourdes, em Coimbra, foi acrescentar no seu boletim semanal testemunhos e artigos de opinião invariavelmente opostos à despenalização. Os exemplos acima descritos - baseados no posicionamento público da Igreja católica relativamente aos temas da contracepção e do aborto - ilustram uma atitude de manifesto conservadorismo em matéria de sexualidade, bem como uma tentativa de manutenção de um forte poder de regulação moral. É esse poder que a Igreja católica também procura exercer relativamente à orientação sexual. Daí que as suas intervenções públicas em matéria de homossexualidade se registem sobretudo em momentos de decisão política a respeito dos direitos LGBT no país. No contexto mexicano, a propósito do poder de regulação da Igreja católica relativamente à orientação sexual, Mejía afirma: Com a sua perspectiva medieval sobre a homossexualidade, a Igreja foi o verdadeiro autor moral de um ambiente opressivo num passado não muito distante [...] e dos preconceitos anti-gay. [...] As regras escritas e não escritas do Estado visando salvaguardar a moral e a decência pública mexicanas foram copiadas a partir dos ensinamentos da Igreja (2000: 53). Também em Portugal a intervenção religiosa é uma parte responsável pelo bloqueio sistemático dos esforços sócio-legais mais progressistas, promovendo conceitos como o pecado e a normalidade, difundindo medos e instigando desaprovação e rejeição. Apenas um exemplo, entre muitos possíveis: em 1994, um jornal nacional fez manchete da intenção da Juventude Socialista em legalizar as uniões de facto entre homossexuais. Essa notícia suscitou comentários duros e de conteúdo homófobo por parte do então arcebispo de Braga, D. Eurico Dias Nogueira: O Estado será em breve a primeira vítima, porque um Estado que não assenta nas famílias bem constituídas é um Estado frágil. [...] O que fez cair o Império Romano não foram as lanças dos povos bárbaros, mas a desagregação familiar (jornal Expresso, 13/06/94). Algum tempo depois, o mesmo arcebispo voltou a afirmar, no mesmo órgão de imprensa, a sua oposição à legalização das uniões de facto entre homossexuais: Classificar como família uma união homossexual é um abuso, é um disparate. Não ponho em causa a existência das pessoas que enveredam por esses caminhos e os seus direitos. O problema é que querem chamar família àquilo que não pode ser família de modo nenhum (Rodrigues, 1994: 19). Numa carta pastoral intitulada «A Igreja na Sociedade Democrática», publicada em 2000, a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) manifestou o seu repúdio pela recomendação do Parlamento Europeu aos Estados-membro da UE, de 16 de Março, no sentido de garantir às famílias monoparentais e às uniões de facto direitos idênticos ao casamento. Rejeitando uma equiparação entre os conceitos de «uniões de facto» e «família», a CEP colocou-se ao lado do Conselho Pontifício para a Família que, no documento «Família, Matrimónio e Uniões de Facto», datado de Novembro de 2000, afirmava que as uniões de facto entre homossexuais «constituem uma deplorável distorção do que deveria ser a comunhão de amor e vida entre um homem e uma mulher, que se empenham ao dom recíproco de si e se abrem à geração da vida». A 26 de Abril de 2001, a Conferência Episcopal Portuguesa tornou público um documento intitulado «Crise da Sociedade - Crise de Civilização», em que analisava o reconhecimento legislativo do Parlamento português relativamente às uniões de facto para pessoas do mesmo sexo, no mês anterior, acusando o legislador de lesar a «dignidade da família». Na opinião dos bispos portugueses, a aprovação da lei das uniões de facto revela «intenções de alguns grupos de provocar rupturas estruturantes, em relação à tradicional cultura portuguesa, ou mesmo em relação à influência da doutrina da Igreja na sociedade», para concluir que tal alteração cultural é prenúncio de uma crise civilizacional. Contestada por determinados sectores político-sociais e louvada por outros, esta posição pública da Igreja católica veio reafirmar o poder de contestação e intervenção de que ainda dispõe em matéria de regulação da moral sexual. Transpondo esta visão clerical para as crenças e atitudes dos Portugueses, verificamos uma grande rejeição da homossexualidade masculina e feminina entre os católicos praticantes. Se, entre os não crentes, a taxa de aceitação das relações sexuais entre gays e entre lésbicas se situa nos 22,6% e 24,1% respectivamente, esta percentagem desce para os cerca de 17% entre os católicos não praticantes, e para os 5,5% entre os católicos praticantes e crentes de outras religiões (Pais, 1998: 442). Ora, se considerarmos que 72% dos Portugueses se identificam como religiosos e que, de entre estes, 97% são católicos (França, 1993), torna-se evidente a influência incontornável da moral católica dominante nas decisões políticas que afectam directamente os cidadãos LGBT, bem como no processo de emergência e consolidação do movimento LGBT em Portugal. É, de resto, sobre este processo que incide a nossa próxima secção.
3. A emergência do movimento LGBT em Portugal A conquista da democracia através da revolução político-militar de Abril de 1974 gerou um clima de abertura ideológica aparentemente propiciador à aceitação daqueles que o regime silenciara durante quase meio século. Ao londo do período revolucionário, surgem algumas manifestações de mobilização homossexual no país. Em 1974, aquando da comemoração do 1º de Maio, no Porto, aparece um cartaz onde se lê «Liberdade para os Homossexuais». A 13 de Maio desse mesmo ano, o Diário de Lisboa publica o manifesto do Movimento de Acção Homossexual Revolucionária (MAHR), intitulado «Liberdade para as minorias sexuais». Seis anos depois, a 25 de Outubro de 1980, nasce o Colectivo de Homossexuais Revolucionários (CHOR). Apesar da sua importância enquanto primeiro motor de dinamização colectiva dos homossexuais portugueses, o CHOR acabou por desaparecer dois anos depois. Durante a década de 80, verificam-se ainda dois outros acontecimentos que afectaram directamente o meio lesbigay português: em primeiro lugar, o ciclo de debates «Ser (Homo)sexual», realizado em 1982 no Centro Nacional de Cultura, unanimemente considerado como o primeiro grande debate público sobre o tema; depois, o I e o II Congresso Nacional de Sexologia, realizados em 1984 e 1987, onde o tema da homossexualidade foi abordado num painel de discussão. Excepção feita a estas movimentações, a década de 80 acabou por ficar aquém das expectativas de muitos, face ao que vinha sendo uma realidade em países como a Grã-Bretanha, a França ou os Estados Unidos. Mas se esta década pode ser caracterizada por uma série de pequenos acontecimentos dispersos, com destaque para os debates, os anos 90 foram marcados pela emergência de diferentes organizações LGBT em Portugal e pelas acções que estas levaram a cabo. Daí que nos pareça oportuno apresentar de seguida as principais organizações, responsáveis pelo trabalho efectuado ao longo de mais de uma década. Em 1990, pelas mãos de um grupo de mulheres lésbicas, nasceu a revista Organa, com o objectivo de debater questões relacionadas com a homossexualidade e de combater o isolamento sentido pelas mulheres lésbicas que viviam longe dos centros urbanos. Um ano depois, o Grupo de Trabalho Homossexual (GTH) constituiu-se no seio do Partido Socialista Revolucionário, de forma a «consciencializar a sociedade portuguesa para a repressão e discriminação exercida pela moral sexual dominante» (GTH, 1991). Actualmente com cerca de 30 membros, o GTH organiza sobretudo acções de rua e actividades de denúncia contra atitudes de homofobia, estando directamente envolvido nas lutas por alterações na legislação com vista à protecção jurídica contra a discriminação. De entre estas, destaca-se a exigência da aprovação da lei das uniões de facto entre pessoas do mesmo sexo ou da inclusão da não discriminação com base na orientação sexual no artigo 13º da Constituição da República, onde se define o princípio da igualdade entre cidadãos. Em 1993, a Organa deu lugar à Lilás, uma revista tri-anual de divulgação, informação e defesa dos direitos das lésbicas, que tem vindo progressivamente a assumir-se como um grupo associativo, promovendo a realização de encontros, sessões de poesia, discussões literárias e cinematográficas e reflexão colectiva. Um dos objectivos centrais do Grupo Lilás tem sido levar informação a mulheres lésbicas nas áreas rurais do país. Em 1995, a delegação portuguesa da International Lesbian and Gay Association (ILGA-Portugal) iniciou as suas actividades, obtendo um reconhecimento oficial em Novembro de 1997 com a inauguração do novo Centro Comunitário Gay e Lésbico, num espaço concedido pela Câmara Municipal de Lisboa. Com um centro de documentação, um bar e um serviço semanal de atendimento psicológico e jurídico, e acolhendo frequentemente peças de teatro, sessões de poesia ou festas temáticas, a ILGA-Portugal é, no momento presente, a maior organização lesbigay portuguesa, quer em número de sócios (estimados entre 500 e 600), quer pela quantidade de iniciativas que tem desenvolvido. Em Janeiro de 1996, três amigas fundaram o Clube Safo. Ainda sem sede física, nem estatutos formais, o Clube conta com uma centena de sócias e simpatizantes, responsáveis pela realização de encontros, festas de fim de ano e actividades desportivas e pela organização anual do único acampamento sáfico do país. Com uma periodicidade bimestral, o Safo edita, desde Setembro de 1997, o boletim Zona Livre, um espaço de informação e divulgação de carácter lésbico cuja capacidade de combate à discriminação tem vindo a crescer. A revista Korpus, primeira e até hoje única publicação periódica gay, nasce em Setembro de 1996, pelas mãos de Isidro Sousa. Cobrindo uma vasta gama de assuntos de interesse LGBT, a Korpus conta com cerca de 200 assinantes regulares, sendo comercializada em postos de venda de Norte a Sul do país. A Opus Gay surgiu em 1997, visando o trabalho na área dos direitos humanos dos LGBT. Com sede física em Lisboa desde Setembro de 1998, esta organização conta com 80 sócios, possuindo ainda delegações informais, no Porto e em Coimbra. De entre as actividades realizadas pela Opus Gay, o maior destaque pode ser colocado na primeira comemoração do Dia do Orgulho Gay realizada fora da capital. Entre outras actividades, a Opus Gay preparou a primeira antologia de literatura homoerótica portuguesa, reunindo textos em prosa ou poesia de autores portugueses, e dispõe de uma série de serviços para a comunidade LGBT, entre os quais se destacam um «dog&cat sitter», um serviço de limpezas domésticas, atendimento jurídico, médico e psicológico, consultas de tarot e um clube de filatelia. A Opus Gay edita ainda um boletim mensal, onde são divulgados contactos úteis, eventos a realizar, notícias nacionais e estrangeiras, havendo ainda espaço para poemas, sugestões de leitura e mensagens pessoais. Em Maio de 1998, as mulheres da ILGA-Portugal formaram o Grupo de Mulheres (GM). Com reivindicações e um manifesto próprios, o GM tem vindo a marcar posição no meio lésbico através da realização de debates, almoços, passeios e outras actividades lúdicas. Em 1999, organizou um Ciclo de Filmes Lésbicos, exibidos aos Sábados na sede da ILGA-Portugal, que contaram com um público regular quase exclusivamente composto por mulheres. Durante a preparação da 3ª Edição do Festival de Cinema Gay e Lésbico, o GM teve uma participação especial na selecção e legendagem dos filmes para mulheres que aí foram exibidos. Em Maio de 2000, surgiu o NÓS, um auto-designado movimento universitário para a liberdade sexual, com origem na Universidade do Porto, que afirma, em comunicado, o objectivo de «confrontar os pontos de vista da tradição hegemónica (heterossexista, homófoba, machista) com todas as outras verdades existentes». O NÓS organizou também este ano a maior parte das actividades da 1ª Semana do Orgulho LGBT no Porto, nomeadamente debates, exibição de filmes, sessões de poesia e campanhas de sensibilização junto da população. Finalmente, em Setembro de 2000, pelas mãos de Simão Mateus, foi criado o Grupo Oeste Gay, cujos principais objectivos são a inclusão de gays residentes da parte oeste do país na comunidade LGBT, a organização de sessões de esclarecimento sobre discriminação e homossexualidade e o desenvolvimento de espaços de convívio entre gays. Na história do movimento LGBT português, dois marcos temporais são incontornáveis. O primeiro é 1997, ano da inauguração do Centro Comunitário Gay e Lésbico, da responsabilidade da delegação portuguesa da International Gay and Lesbian Association (ILGA-Portugal). É ainda de 1997 que data a realização da primeira celebração do orgulho homossexual no país, denominada «Arraial Gay» e da primeira edição do Festival de Cinema Gay e Lésbico, ambos em Lisboa. O segundo marco é 2000, ano em que se organizou a 1ª Marcha de Orgulho Homossexual à qual aderiram cerca de 500 pessoas. Foi também neste ano que, pela primeira vez, o Arraial foi organizado conjuntamente pelas principais organizações homossexuais, deixando de ser uma organização exclusiva da ILGA-Portugal, como até aí sucedera. Para além da já habitual leitura do comunicado do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, o Arraial 2000 começou com um momento de discurso, no qual os dirigentes das organizações LGBT envolvidas reflectiram sobre a importância daquele dia no processo de emancipação sexual, enfatizando a necessidade de alargar esta luta ao interior, aos que estão isolados e a toda a sociedade. 3.1. Construindo redes com outros grupos discriminados Tendo o ano de 2000 constituído o momento mais forte da visibilidade pública do movimento LGBT português até hoje, qual o seu principal quadro ideológico e quais os aliados que conquistou na sociedade civil? Uma resposta parece ser suficiente para ambas as questões: a esquerda democrática. Mas uma análise mais atenta das práticas e dos discursos do movimento LGBT revela que a identificação das estratégias e dos potenciais aliados é uma tarefa mais complexa. A 30 de Junho de 2000, realizou-se na sede da ILGA-Portugal um debate sobre as formas de luta do movimento LGBT, que reuniu representantes do GTH, do Clube Safo e da própria ILGA. Esta foi uma ocasião em que os participantes puderam discorrer acerca dos objectivos, estratégias e aliados do movimento. Assim, na óptica das associações presentes, os objectivos e estratégias do movimento prendem-se sobretudo com a intervenção junto das escolas e dos médicos (divulgação de informação, participação em debates, etc.), o combate à homofobia (mandar comunicados à imprensa, cartas do leitor, etc.), a criação de visibilidade (através de acções de rua, etc.) e a descentralização do próprio movimento. Relativamente aos aliados preferenciais da luta pela emancipação sexual, foram mencionados os grupos de defesa dos direitos humanos, as associações de mulheres e os chamados «straight friendly», entre os quais se incluem alguns jornalistas e estudantes. O Manifesto que o movimento divulgou durante a Marcha 2000 permite-nos antever novos interlocutores do movimento junto da sociedade civil: E porque somos discriminad@s, não podemos deixar de lutar pelos direitos humanos, por uma sociedade em que a orientação sexual, a identidade de género, a cor de pele, a deficiência, a nacionalidade, as possibilidades económicas e o sexo não sejam pretexto de exclusão ou violência sobre qualquer ser humano. [...] Por um país multicultural e solidário. Queremos a legalização dos imigrantes que vivem e trabalham em Portugal. Queremos leis de asilo mais solidárias. [...] Pelos direitos sociais, no trabalho e na saúde. Queremos o fim da precariedade laboral. [...] Contra a violência sobre as mulheres, particularmente as mulheres com deficiência. Pelo direito a decidirem sobre o seu corpo. De entre as diversas organizações subscritoras deste manifesto, destacam-se a Associação Portuguesa de Deficientes, a Rede Anti-Racista, o SOS-Racismo e a União Geral de Trabalhadores (UGT). Parece, pois, que, para além de uma aliança de algum modo esperada com o movimento feminista - patente na presença de organizações como o Movimento Democrático de Mulheres (MDM) ou a União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) -, o movimento LGBT português soube encontrar plataformas comuns de interesse e entendimento com os trabalhadores, as minorias étnicas e os deficientes. As preocupações que marcam o percurso do movimento feminista português cruzam-se com muitas das reivindicações do movimento LGBT, pelo que as lutas de ambos convergem em determinados momentos. É importante considerar que o sistema de opressão - o patriarcado - é comum a ambos, na medida em que impõe modelos estereotipados de homem e de mulher, conferindo a cada um papeis sociais predeterminados em função do género. Entre os diversos exemplos de parcerias, citamos dois. Durante a Marcha Mundial das Mulheres, em Outubro de 2000, as diversas organizações de lésbicas promoveram uma participação activa por parte da comunidade e o documento final assinado por todas as associações envolvidas na organização do evento continha reivindicações específicas para as mulheres lésbicas. Mais recentemente, relativamente a um programa televisivo intitulado «Mulher Não Entra», o Grupo de Trabalho Homossexual pronunciou-se publicamente, manifestando a sua reprovação por um programa «misógino, machista e sexista», que reduz as mulheres a «meros objectos do desejo masculino, menosprezando e diminuindo as suas identidades e o seu papel social, cultural e político» (jornal Público, 21/04/2001). Esta tomada de posição pública por parte de uma organização LGBT em defesa da dignidade da mulher - independentemente da sua orientação sexual - parece-nos ilustrar claramente as semelhanças que aproximam ambos os movimentos LGBT e feminista. Uma outra aliança marcada pela antiguidade é a que se refere às organizações de luta contra a sida, nomeadamente a Abraço, associação que acolheu muitos dos elementos que mais tarde viriam a constituir a liderança do movimento em Portugal. Na verdade, o primeiro presidente da ILGA-Portugal, Gonçalo Diniz, começou por trabalhar na Abraço, decidindo, anos depois, fundar aquela que viria a tornar-se a maior organização lesbigay portuguesa. Desde 1997, a ILGA organiza anualmente a Marcha em Memória e Solidariedade para com as Vítimas do HIV-Sida. Os aliados políticos, assumindo bandeiras nem sempre directamente ligadas à causa homossexual, encontram-se sobretudo nos partidos de esquerda. Assim, em 1997, a Juventude Socialista propõe um projecto de lei com vista à legalização das uniões de facto dos homossexuais. Este projecto tem o apoio do partido Os Verdes e suscita a oposição dos partidos de direita, secundados pela Igreja Católica. A partir de 1999, os direitos LGBT foram defendidos com particular incidência pelo recém-formado Bloco de Esquerda, cujos dirigentes partidários participaram na 1ª Marcha do Orgulho Homossexual, realizada em Lisboa em 2000. Aliás, o Bloco de Esquerda desde o início incluiu na sua agenda política a luta pela não discriminação com base na orientação sexual, preocupação presumivelmente resultante da existência do Grupo de Trabalho Homossexual no seio do Partido Socialista Revolucionário, força política que integra o Bloco de Esquerda. Em Março de 2001, os partidos de esquerda - nomeadamente o Partido Comunista Português, Os Verdes, Bloco de Esquerda e Partido Socialista - articularam esforços e fizeram aprovar o já mencionado diploma sobre as uniões de facto entre homossexuais. As relações entre a homossexualidade e a esquerda resultam de uma ideologia comum entre sujeitos que defendem a liberdade e do direito à diferença. Trata-se, no fundo, de uma luta contra todas as formas de opressão e exploração. Tal como argumenta Vitorino, fazer política de esquerda é ter a coragem de travar todas as políticas justas, mesmo as mais complicadas, e fazer as rupturas mais difíceis com o que está instituído, ou não lutássemos por uma transformação mais profunda de toda a sociedade injusta em que hoje vivemos. (...) O movimento LGBT é, pois, tão subversivo da ordem actual como as ideias de esquerda. A emancipação de tod@s @s oprimid@s, LGBT incluíd@s, é a causa da esquerda (1999: 6). Esta articulação do movimento LGBT português com outras associações ou movimentos sociais é consistente com as características dos novos movimentos sociais do Sul, particularmente na América Latina, onde a criação de redes entre movimentos é frequente (Santos, 1995b: 226). No México, por exemplo, as lutas estudantis de 1968 são identificadas como um elemento percursor da libertação dos cidadãos LGBT no país, dado que o movimento estudantil introduziu pela primeira vez na agenda política reivindicações relacionadas com a autonomia sexual face ao governo e à família. Por sua vez, quando o movimento LGBT emergiu no México, em 1978, caracterizou-se pela aliança solidária com outros grupos socialmente oprimidos, nomeadamente prisioneiros, trabalhadores e camponeses. Tais ligações granjearam-lhe, num momento posterior, a simpatia do movimento feminista e dos intelectuais (Mejía, 2000: 49-50). Também no Brasil, em 1978, as actividades da primeira organização LGBT do país, denominada SOMOS: Grupo de Afirmação Homossexual, pautaram-se pela participação activa em lutas contra o racismo e a misoginia (Green, 2000: 59 e ss). Mais recentemente, o texto base publicado para a 10ª Plenária Nacional da Central Única de Trabalhadores (CUT), de 4 a 7 de Dezembro de 2001 em São paulo, no Brasil, incluiu uma tomada de posição por parte da secretaria de políticas sociais desta central sindical, recomendando o fortalecimento de Acções sindicais voltadas para a discussão, formação, organização e mobilização de trabalhadores/trabalhadoras, na perspectiva de sensibilizá-los para a defesa dos direitos dos homossexuais e o respeito pela diversidade de orientação sexual [e o estebelecimento de] parcerias com organizações homossexuais, buscando a unidade de acção (CUT, 2001: 35).
5. Emancipações alternativas, globalizadas ou ambas? O movimento LGBT português, como, de resto, sucede a nível internacional, constrói-se entre dois pólos diferentes. Por um lado, a subcultura gay ou a chamada «indústria rosa», que implica o consumo de produtos de conteúdo homoerótico produzidos e difundidos graças à globalização dos mercados de procura e oferta. São disso exemplos os locais de diversão nocturna, as saunas e a indústria ligada ao turismo. Por outro lado, o movimento político, que mobiliza os sujeitos em torno de campanhas pelo fim da discriminação, pela diversidade e pelo direito à diferença e ao corpo, entre outros. Este combate contra a discriminação é frequentemente travado em articulação com outros grupos socialmente oprimidos. Disso foi exemplo o lançamento do projecto «Escritório contra a discriminação», em Junho de 1999, proposto pela Opus Gay e apoiado, entre outras, pela Associação Portuguesa de Surdos. Entre um pólo e o outro, as manifestações públicas da comunidade LGBT, em ocasiões como as marchas, os arraiais ou os festivais de cinema, transbordam de símbolos que, embora globalmente comercializados, são indissociáveis de uma forte componente de luta e activismo anti-discriminatório. Ora dissolvido em variados espaços de consumo e lazer, ora envolvido em lutas pelo reconhecimento de direitos, que nos resta, afinal, para que possamos com alguma margem de segurança avaliar o potencial emancipatório - ou não - deste movimento em torno da orientação sexual? Na parte final deste capítulo, procuramos responder a esta questão de fundo, recorrendo para tal a duas ideias-chave: 1) dentro da própria contra-hegemonia, a emancipação sexual proposta pelo movimento LGBT internacional é alternativa; 2) o movimento LGBT português apresenta especificidades sócio-históricas que o distinguem do movimento LGBT globalizado. Consideremos, primeiro, o conceito de emancipação. A ideia de emancipação pressupõe, desde logo, a existência de relações desiguais de poder, uma vez que, se o poder não fosse exercido de uma forma excludente, não haveria necessidade de se lutar pela igualdade de oportunidades e direitos, pelo direito à diferença ou pela inclusão. Por outras palavras, a desiguldade e a exclusão criam as condições - de inferiorização e exploração - indispensáveis (embora não suficientes) para a emergência de uma vontade de emancipação. Posto isto, o nosso olhar sobre a emancipação sexual parte do entendimento de que «as relações emancipatórias se desenvolvem, portanto, dentro das relações de poder, não como resultado automático de uma contradição essencial, mas como resultados criados e criativos de contradições criadas e criativas» (Santos, 1995a: 409). Quer isto dizer que, mais do que procurar uma qualquer essência de emancipação, urge identificar caminhos, sementes, formas diversas e alternativas de emancipar os sujeitos e de os capacitar na luta contra a exclusão. Acima de tudo, importa perceber que não existe uma, mas muitas formas de emancipação e dominação. Tal como a hegemonia tem muitos rostos, também a resistência se desdobra em múltiplas agências e estruturas. Como argumenta Weeks (1999: 47), Estas novas histórias sobre o ‘self’, a sexualidade e o género são o contexto para a emergência do cidadão sexual, porque aquilo que estas histórias nos contam acerca da exclusão com base no género, sexo, raça ou aparência física tem como corolário a exigência de inclusão: direitos iguais perante a lei, na política, na economia, em questões sexuais. Os movimentos em torno de orientação sexual podem - como, de resto, frequentemente o fazem -, aliar-se a outros grupos socialmente discriminados na luta pela libertação racial, política ou sexual. Mas, individualmente, cada uma destas lutas tem o seu âmbito específico de opressão e resistência, que permite identificar metas, estratégias, aliados e inimigos. No caso do movimento LGBT, o combate é travado contra a imposição do modelo heterossexual como norma que tem sistematicamente remetido para o silêncio e para a clandestinidade milhares de gays, lésbicas, transsexuais e bissexuais. Recorrendo ao mapa dos espaços estruturais das sociedades contemporâneas proposto por Santos (2000), constatamos que esta luta se trava em muitas frentes. No espaço doméstico, trata-se de combater a ideologia patriarcal que constrói e alimenta estereótipos historicamente dicotomizados sobre papeis masculinos e femininos, que estão na base da inferiorização da homossexualidade relativamente à heterossexualidade. A exigência de reconhecimento das uniões de facto, formulada desde 1997 pelo movimento LGBT português, remete para esta necessidade de democratizar o espaço doméstico abrindo-o a modelos familiares alternativos. No espaço da produção, há a necessidade de prevenir os despedimentos ou os bloqueios de carreira profissional em função da orientação sexual; um bom exemplo disso, são as conversações, iniciadas em 1999, entre a Plataforma Homossexual (composta pela Opus Gay, ILGA-Portugal, Grupo de Mulheres, GTH e Clube Safo) e a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional, a União Geral de Trabalhadores e a Frente Unitária de Trabalhadores, no sentido de garantir protecção ao trabalhador que seja prejudicado em função da sua orientação sexual. No espaço do mercado, mais do que uma tentativa de promoção da indústria rosa, procura-se promover espaços de diversão LGBT e, sobretudo, a difusão de símbolos LGBT, tais como pins de triângulos invertidos ou bandeiras do arco-íris; este é o único espaço onde a consciência da opressão cede por vezes perante a tentação do consumo e da cultura de massas. A este respeito, cumpre-nos realçar que o consumo de produtos LGBT pode também consistir numa forma de conquistar um espaço de visibilidade. Nesse sentido, o desenvolvimento de um mercado LGBT pode ser uma outra forma de aprofundar a consciência política da opressão e da discriminação, sem significar necessariamente a alienação relativamente a estas questões em prol do consumo. Este é um dos aspectos alternativos da emancipação sexual dentro da luta anti-hegemónica mais ampla. No espaço da comunidade, trata-se de investir na maximização da identidade e na sua legitimação, contrariando a moral judaico-cristã dominante, resistindo à noção de pecado e culpa e denunciando atitudes homofóbicas por parte do clero, dos políticos e da sociedade civil. O espaço da cidadania é a arena jurídica por excelência, onde se travam as lutas pela não discriminação e pela protecção legal; este tem sido um espaço privilegiado pelo movimento LGBT português até ao momento, culminando em Março de 2001 com a aprovação pelo Parlamento das uniões de facto entre homossexuais. Por fim, o espaço mundial, onde se valoriza a forma epistemológica da cultura global, da agenda dos direitos humanos e dos modelos globalizados da homossexualidade, cujos padrões e estratégias são definidos tácita ou explicitamente por organizações LGBT internacionais (ILGA-Europa, ILGA-Mundo, International Gay and Lesbian Human Rights Commission, etc.). Neste processo global de luta pela emancipação sexual, os principais aliados desta foram, historicamente, o movimento feminista e o movimento negro: o primeiro porque constitui o mais antigo e melhor organizado movimento social de luta contra a opressão sexual, e o segundo porque agrega um colectivo de pessoas desde sempre privadas do acesso aos direitos mais elementares em democracia. Nas palavras de Hugo (1998), um activista do GTH, o racismo e a homofobia são duas faces da mesma moeda: Gays, lésbicas, bissexuais e transsexuais continuam a ser segregad@s por porem em causa o modelo burguês da família, necessário à sobrevivência do capitalismo para a reprodução da força de trabalho; as minorias étnicas continuam a ser exploradas como mão-de-obra barata e sem direitos por essa mesma burguesia. No fundo, somos tod@s excluíd@s e com adversários comuns: o Estado, que não reconhece os nossos direitos, a extrema direita, que tanto prega contra as minorias étnicas como contra @s homossexuais... Pese embora o trabalho conjunto dos três movimentos - LGBT, feminista e minorias étnicas -, a participação de gays e lésbicas no seio de organizações feministas ou anti-racistas nem sempre foi pacífica. Na verdade, muitas lésbicas portuguesas acusam o movimento feminista de as utilizar como meio de engrossar as fileiras na luta contra a discriminação laboral ou pelo direito ao aborto, colocando de parte outras reivindicações mais directamente relacionadas com a condição lésbica (GM, 1999: 7). Nas organizações lesbigays portuguesas há também a percepção de que existe muita homofobia por parte das minorias étnicas, da mesma forma que admitem a possibilidade de haver racismo dentro da comunidade LGBT (Hugo, 1998: 6). Todavia, se compararmos a relação do movimento LGBT com feministas, por um lado, e minorias étnicas, por outro, parece-nos ser mais forte a aproximação entre a luta homossexual e a luta anti-racista, comprovada, por exemplo, pela constante presença da Associação SOS-Racismo em todas as edições do «Arraial Gay» realizadas no país. Contudo, iniciativas recentes por parte de organizações de mulheres, de que a Marcha Mundial de Mulheres é um bom exemplo, representaram um salto qualitativo na defesa de um conjunto de reivindicações partilhadas por feministas e lésbicas portuguesas. Também a participação de representantes feministas em debates organizados pelas associações lesbigays tem vindo a aumentar, bem como a organização conjunta de painéis de discussão relativa ao corpo e ao género. Regressando à nossa primeira ideia-chave - a de que, dentro da própria contra-hegemonia, a emancipação sexual proposta pelo movimento LGBT internacional é alternativa - verificamos que essa diferença reside sobretudo no aproveitamento de alguns instrumentos fornecidos pela globalização hegemónica (nomeadamente a imprensa e a Internet) e na maximização da indústria e do comércio «rosa» como meio de potenciar a visibilidade de um movimento minoritário. Esta tem sido uma estratégia adoptada principalmente pelos movimentos LGBT nos chamados países centrais, como o Reino Unido ou os EUA. A nossa segunda ideia-chave prende-se com as idiossincrasias do movimento homossexual português. Se considerarmos que Portugal viveu submerso num regime ditatorial durante quase meio século, em que até a importação de produtos de consumo como a Coca-Cola era proibida, facilmente se depreende que o movimento LGBT no país - manifestando-se publicamente apenas na década de 90 - não é, de todo, marcado pela existência de uma ampla oferta de produtos de consumo homoerótico, destinada a um mercado desenvolvido. Na verdade, o mercado rosa português, para além de extremamente recente, encontra-se reduzido a alguns espaços de diversão (bares, discotecas e saunas, a maior parte dos quais em Lisboa), uma livraria, um hotel, uma agência de viagens e alguns serviços fornecidos no âmbito das associações. Para além das circunstâncias impostas pelo nosso passado político recente, o próprio movimento LGBT português é fortemente influenciado pela mais antiga organização homossexual existente no país, a saber, o Grupo de Trabalho Homossexual (GTH), do Partido Socialista Revolucionário. A trabalhar desde 1991, o GTH postula uma ideologia de libertação tradicionalmente associada à esquerda, defendendo a igualdade racial, sexual e de género, o que se traduz em todas as suas intervenções públicas (protestos, marchas, entrevistas à comunicação social, etc.). Em entrevista concedida em 1999, Sérgio Vitorino, presidente do GTH, afirmava, a propósito da existência de organizações homossexuais de direita: Eu acho que esses movimentos de direita estão enganados, são contraditórios, porque um movimento homossexual de direita nasce contra o movimento homossexual, na minha opinião, porque defende ideias que nos impedem de nos libertarmos. Podem estar perfeitamente de acordo connosco contra uma série de discriminações legais, mas já não estarão de acordo connosco quando se trata de atenuar as diferenças entre géneros, entre masculino e feminino, a desigualdade social entre homens e mulheres, hum, quando falamos de liberdade sexual, quando exigimos educação sexual nas escolas... (Santos e Fontes, 1999). Como defende Roberts, «a identidade gay implica ter os direitos legais, civis e humanos para se poder viver abertamente a homossexualidade, usufruindo dos mesmos direitos de associação e relacionamento que outros homens e mulheres» (1995: 250). Por outras palavras, o direito a escolher e expressar uma orientação sexual pressupõe a conquista de outros direitos e liberdades que, por sua vez, conduzem a outros. O desenvolvimento histórico do movimento LGBT permite-nos perceber que, embora tenha começado por ser uma luta de um grupo minoritário, acabou por se transformar na expressão máxima da reivindicação pelo direito ao corpo e à auto-determinação sexual. Mais do que obter um determinado conjunto de direitos e garantias contra a discriminação com base na orientação sexual, o movimento LGBT português têm sido frequentemente um aliado preferencial das campanhas pela liberalização do aborto e das lutas pela introdução da educação sexual nas escolas, contra a violência doméstica e pela igualdade de género, entre outras. Tais alianças revelam o lado mais emancipatório desta luta, uma vez que o espectro das reivindicações abrange tanto feministas como grupos de luta contra o racismo. Neste sentido, podemos afirmar que a causa LGBT busca activamente alargar o potencial humano, libertando-o do preconceito e da opressão que o reduz a um modelo homogéneo e redutor. Trata-se, em suma, de uma luta pela diversidade e, por isso, torna-se mais eficaz quando é levada a cabo por diversos grupos em idênticas circunstâncias de opressão e exploração em função do género, raça, etnia, classe, estatuto ou orientação sexual. Nas palavras de Serzedelo (2001), presidente da Opus Gay, «a luta que travamos é uma luta democrática, é uma luta cívica, é uma luta moral e é uma luta libertadora: libertadora para os homossexuais e para os heterossexuais, porque onde há oprimidos, há opressores». A emancipação sexual funciona, pois, como uma ponte para outras formas de expansão de direitos e liberdades, capacitando os indivíduos a defenderem o direito à diferença sem que esta equivalha à sua inferiorização. Tal como argumenta D’Emilio, os homossexuais estão em posição de desempenharem um importante papel a este respeito: Excluídos, a maior parte de nós, da unidade familiar, tivemos de criar, para a nossa própria sobrevivência, redes de suporte independentes dos laços de sangue ou dos incentivos de Estado, escolhidas e mantidas voluntariamente. A construção de uma ‘comunidade de afecto’ deve ser parte integrante do nosso movimento político, tal como o são as campanhas pelos direitos civis. Neste sentido, podemos personificar os modelos de relações interpessoais numa sociedade apoiada na igualdade e justiça, em vez da exploração e opressão, uma sociedade onde a autonomia e a segurança não se excluam mas coexistam (1996: 270). A necessidade de trabalhar em colaboração com outros grupos explorados e oprimidos, denunciando injustiças e desigualdades, é, de resto, uma meta de muitas das organizações LGBT a nível internacional. Em 1995, a propósito da votação da Proposição 187 que defendia a rejeição de cuidados de saúde, educação e assistência social aos imigrantes ilegais nos Estados Unidos da América, a National Gay and Lesbian Taskforce tornou pública a sua posição: As recentes campanhas contra os direitos dos homossexuais e dos imigrantes colocam uma questão crítica para o país: irá a nossa democracia expandir-se e alargar direitos a uma população cada vez mais diversa ou, pelo contrário, ir-se-á contrair, limitando a concessão de direitos a um grupo restrito? As comunidades homo, bi e transexuais devem trabalhar em aliança com as comunidades de imigrantes, de cor e outras, para denunciarem a agenda política da direita - uma agenda que atenta contra direitos civis, humanos, laborais, económicos e reprodutivos básicos. Temos que construir uma frente unida sólida contra a intolerância, para combater por uma democracia mais inclusiva para todos (Timoner, 1995). A luta conjunta contra a opressão que discrimina em função do sexo, da etnia ou da orientação sexual é apenas um dos factores que aproxima as associações LGBT nacionais de outras organizações a nível internacional. O trabalho desenvolvido colectivamente por associações LGBT portuguesas e ONGs internacionais verifica-se, por exemplo, no caso da Amnistia Internacional. Para além de esta ONG ter participado na Marcha do Orgulho Homossexual de 2001, foi criado, em Julho desse ano, um grupo de trabalho LGBT na secção portuguesa da Amnistia Internacional, à semelhança do que sucede noutros países. No que respeita o trabalho conjunto entre organizações internacionais LGBT e associações LGBT portuguesas, registam-se contactos sobretudo ao nível da Europa. De 4 a 8 de Outubro de 2000, na Conferência da ILGA-Europa organizada em Bucareste, na Roménia, estiveram presentes representantes das associações portuguesas ILGA-Portugal e Opus Gay. Nessa mesma ocasião ficou agendada a Conferência da ILGA-Europa de 2002, de que Portugal será o país anfitrião. Branco (2000) congratulou-se pela participação de portugueses em fora internacionais de discussão, enfatizando a importância do enquadramento europeu enquanto fonte de poder junto do governo português: Revela-se importante que as associações portuguesas, em coordenação com a ILGA-Europa e outras organizações, possam junto do Estado português constituir grupos de pressão para que possamos ter de uma vez por todas a igualdade material, isto é, que todos nós possamos beneficiar dos mesmos direitos sem qualquer tipo de discriminação, para que assim tenhamos uma Comunidade de Pessoas, uma verdadeira Comunidade Social. Em Março de 2000, Kurt Krickler, presidente da ILGA-Europa, esteve em Portugal e, em entrevista à revista Korpus, referiu-se à importância da relação entre organizações LGBT nacionais e internacionais. Segundo Krickler, o sucesso das reivindicações LGBT junto dos organismos europeus depende da força das organizações nos próprios países porque quem decide em Bruxelas são ainda os governos dos países membros da União Europeia. Se não houver força das várias organizações nos próprios países, não vão conseguir nada em Bruxelas. O sucesso da ILGA-Europa depende do sucesso das congéneres nacionais (Sousa e Mailänder, 2000). As páginas das diversas associações LGBT nacionais na Internet constituem outro mecanismo de difusão das actividades desenvolvidas pelo movimento LGBT noutros países ou junto de organizações internacionais como as Nações Unidas, a União Europeia ou o Parlamento Europeu. Tais informações estão também disponíveis através do boletim electrónico mensal da ILGA-Europa Euroletter, no qual têm vindo a ser publicadas notícias sobre a evolução da situação jurídica dos gays, lésbicas, bissexuais e transsexuais em Portugal.
6. Conclusão Os grupos e associações que constituem o movimento LGBT em Portugal regem-se por metas idênticas: o reconhecimento dos direitos de cidadania das pessoas LGBT e a protecção efectiva contra todas as formas de exclusão. É também por esta razão que consideramos manifestamente contra-hegemónico o combate travado pelo movimento LGBT, uma vez que entendemos a exclusão como um processo arbitrário, fruto da hegemonização de um discurso de verdade, que credibiliza o «nós» através da diabolização do «outro» (Santos, 1999). Mas para além desta razão, muitas outras podem ser invocadas para reforçar o carácter contra-hegemónico do movimento LGBT, a mais óbvia das quais é o facto de afirmar uma orientação sexual que não é nem maioritária nem defendida pelos poderes religiosos, sociais e políticos dominantes. Como procurámos desmonstrar, as estratégias adoptadas pelo movimento LGBT, nos contextos internacional e nacional, constituem alternativas dentro da própria corrente contra-hegemónica. De facto, no processo de luta pela emancipação sexual, o movimento LGBT soube utilizar os recursos disponibilizados pela globalização para difundir os seus ideais, símbolos e produtos. Contudo, e embora a cultura LGBT pareça beneficiar das condições criadas pelo sistema capitalista, as políticas sexuais travam-se no âmbito de uma globalização que parte «de baixo para cima». Formulado de outra forma, o trabalho realizado pelas associações LGBT nacionais caracteriza-se pelo estabelecimento de coligações transnacionais de grupos sociais vitimizados pelos sistemas de desigualdade e de exclusão, estabelecendo redes entre associações locais, nacionais e transnacionais como meio mais eficaz de luta pelos seus interesses igualitários e identitários contra a lógica da globalização capitalista (Santos, 1999: 59).
Para que o movimento LGBT português assuma uma atitude político-ideológica de ruptura face à hegemonia heterossexual, constituindo uma alternativa de emancipação sexual, identificámos um conjunto de medidas centrais, algumas das quais constam já da agenda LGBT nacional:
Como daqui se pode inferir, a agenda LGBT para as próximas décadas tem necessariamente de exceder os limites das reivindicações meramente legais, uma vez que as atitudes de homofobia e discriminação não se mudam por decreto. Pelas razões apresentadas, concluímos que, embora o movimento LGBT globalizado utilize frequentemente os instrumentos capitalistas da indústria e do mercado com vista à obtenção de uma maior visibilidade social, Portugal é palco de um movimento LGBT emancipatório e contra-hegemónico, que, pelos diversos motivos expostos, não se aliou à lógica expansionista e predatória do mercado gay global. Antes pelo contrário, a agenda do movimento LGBT português inclui reivindicações que traduzem necessidades de libertação e auto-determinação transversais a toda a sociedade, permitindo a criação de pontes entre associações e movimentos muito diversos. Neste sentido, as associações LGBT portuguesas têm primado por um discurso activamente defensor dos direitos humanos, que se traduz na prática pela luta por um sistema social que valorize a diversidade, no qual a diferença não implique a exclusão e em que a participação cívica de gays, lésbicas, bissexuais, transsexuais, minorias étnicas e mulheres - os sectores da população que mais têm sofrido discriminação ao longo dos tempos - se considere um factor de enriquecimento social, político e cultural.
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