906 - Rosana de Sousa Patané
A educação sexual em meio escolar como política social: o que pensam os professores brasileiros e portugueses?
Rosana Patané - Doutoranda e Bolseira do DE/UA/CIDTFF/ FCT /SFRH/BD/48813/2008)
António Martins – Prof. Doutor Auxiliar do DE/ UA/CIDTFF
Maria Amelia Reis – Profa. Doutora Associada da UNIRIO/PPG-MUS/CEIS20-UC
Introdução
O regime de aplicação e de organização funcional da educação sexual nas escolas representa a necessidade de mudança de mentalidades para que haja uma coerência entre os discursos e as atitudes de ordem política social, e as demandas reais que se colocam nos quadros da vida quotidiana.
Neste sentido, os atuais desafios da vida contemporânea e suas complexidades, têm exigido, de um lado, competência técnica e cognitiva para atuar sobre os problemas sociais, e de outro, aquisições de outras ordens de epistemologias e de ecologias de saberes, por outro, para que possamos compreender com as devidas competências, as questões de ordem subjetiva, que engendram e constituem as dinâmicas sociais que se desdobram no campo da ética, da estética, dos direitos humanos e sociais.
Procuramos discutir como as referidas representações sociais ao colocarem em evidência um conjunto de efeitos que não só refletem e alteraram um perfil ou um arquétipo relativo ao trabalho docente, desvelam o que Nóvoa (2005) designa de efeito de “transbordamento”.
A proposta em questão concentra-se em compreender como se articulam as representações sociais (RS) formuladas no contexto do grupo primário de pertença e as representações sociais construídas com a apropriação do conhecimento científico (com ações formativas intencionais no contexto da educação formal). Para além desta articulação, procuramos identificar quais são os pontos de tensão existentes nas representações sociais destes professores e os tais efeitos de “transbordamento” e de crise de identidade profissional que atingem o professor e sua representação profissional.
Contextualização Teórica
O estudo em questão se fundamenta no quadro teórico-conceitual do campo de estudos das representações sociais (RS), em especial na teoria do núcleo central, por considerar que o problema que mobiliza esta investigação configura-se como um sistema cognitivo que produz e constrói a realidade dentro da visão e da experiência vivenciada pelos professores brasileiros e portugueses sobre o trabalho docente nos contextos escolares do sistema público de ensino de ambos os países, tendo em conta todos os seus problemas e efeitos de “transbordamento” pelo excesso de missões atribuídas às escolas e aos professores.
As referidas RS não só expressam uma forma de ver o mundo e um conjunto de atitudes perante ele, mas, expressa quais sistemas de referências encontram-se em privilégio na teia social, embrenhados das variadas contradições, desencadeando pontes de diálogo e uma maneira “natural” de estabelecer no contexto social de vivência de indivíduos e de grupos, conhecimentos de ordem científica com os da ordem dos processos de socialização (da familiar à profissional) e dos modelos de educação, como destacam (Pardal et al., 2011).
Metodologia
Realizamos uma análise das narrativas dos professores brasileiros e portugueses na perspectiva do discurso crítico de Fairclough (2008) com a intenção de articular características deste tipo de análise com as do campo de estudos das representações sociais por considerarmos a relação entre sujeito e objeto e as visões de conhecimento de mundo construídas a partir do agrupamento de significados que propiciam processos de diálogo do indivíduo para com o meio social (processo de reflexão subjetiva) como destaca Jodelet (1994), quando o debate em questões é o debate sobre sexualidade e género em contexto escolar como uma política social.
De nossas análises críticas obtivemos:
Os elementos que compõem o núcleo central dos discursos dos entrevistados, que nada mas são que suas representações sociais, embrenhadas de valores pautados em dogmas religiosos ou não, ou em valores morais oriundos da herança judaico-cristã. Sendo eles:
· Existência de tensão entre a realidade vivenciada pelos docentes em termos de estrutura administrativa e organizacional.
· Existência de representações sociais reconhecidas como “imagens negativas” dos professores sobre eles próprios, que acarretam a acentuação de uma crise de identidade profissional e representação profissional;
· Descrédito nas políticas públicas que estão sendo trabalhadas nos dois países em estudo, em função de um forte sentimento de desconfiança em relação às intenções dos decisores como uma “redefinição da identidade profissional dos professores”
Considerações Finais
A investigação em curso identifica como as representações sociais que os professores do ensino secundário de Brasil e de Portugal detém sobre as políticas educativas relativas às temáticas da sexualidade e do género estão permeadas pelos conflitos de ordem económica e de estratégias para se garantir a governabilidade política sem investir em alterações profundas no modelo de orientação das políticas públicas, sobretudo, sociais e progressistas, como as que devem regular um regime de aplicação e de organização funcional da educação sexual em meio escolar.
Procuramos discutir e identificar como os efeitos do transbordamento da escola, atingem de modo diferente, mas, prejudicial ambos os grupos de professores nos dois países estudados. Os resultados das análises das narrativas demonstraram de forma preponderante que a questão da crise económica deflagrada nos últimos quatro anos, no caso de Portugal, e os efeitos das mudanças de coordenação política no caso do Brasil, também nesta faixa de tempo, conseguiram acentuar à imagem social do professor, a sua identidade e a sua própria representação profissional, um sentimento de desprestígio, de abandono, de sobrecarga de responsabilidades. Logo, a expressão de uma desmotivação, de um receio e de uma resistência não são só constantes, mas, produtoras de um descrédito nas políticas públicas, sobretudo, nas políticas educativas que tratam do tema da sexualidade e do género.
Referências bibliográficas
Canário. R. (2005). A escola e as dificuldades de aprendizagem. (http://pepsic.bvs-psi.org.br/pdf/psie/n21/v21a03.pdf; consultado a 28 de setembro de 2012).
Fairclough, N. (2008) Discurso e Mudança Social. Brasília: Editora Universidade de Brasília.
Jodelet, D. (1994). Les representations sociales. Paris: Presses Universitaires de France.
Nóvoa (2005). Evidentemente. Histórias da Educação. Porto: Edições ASA.
Pardal, L.A., Neto-Mendes, A.A., Martins, A.M., Pedro, A.P., & Gonçalves, M. (2011). Trabalho docente: representações e construção de identidade profissional. Aveiro: Editora da Universidade de Aveiro: theoria poesis praxis.