212 - Maria João Guia
Alteridades da imigração e crime
Maria João Guia
Doutoranda em Direito, Justiça e Cidadania no Séc XXI – FDUC/FEUC/CES
Em Portugal, a criminalidade relacionada com a comunidade imigrante tem sido alvo de grande atenção por parte dos meios de comunicação, o que tem provocado no público a formação de um preconceito que o leva a associar imigração e criminalidade. Nos Estados Unidos da América, os últimos estudos, sobretudo académicos, que se debruçaram sobre este tópico colocaram em questão a validade da correlação entre as taxas de criminalidade e a chegada de imigrantes Os Estados Unidos têm, nos últimos anos, introduzido leis penais cada vez mais duras, e a convergência entre a Lei Penal e a Lei da Imigração deu lugar a um fenómeno que Stumpf baptizou de “crimigração”. Este fenómeno veio aumentar significativamente a vulnerabilidade dos imigrantes que vivem nesse país, especialmente daqueles que vivem em situação de irregularidade. Esta percepção do imigrante como o “outro”, o intruso, motivou-nos a reflectir sobre o Direito Penal do Inimigo, uma teoria enunciada por Günter Jakobs em 1985, segundo a qual a mera possibilidade de alguém se vir a tornar uma ameaça aumenta a probabilidade de ser rejeitado e amplia o controlo exercido sobre as suas acções, através de cercos de securitização e através da possível emergência de um Direito Penal do Crimigrante.
Esta bipolaridade na forma de olhar o imigrante, entendido por um lado como uma ferramenta necessária para a renovação e a sustentabilidade do Estado e, por outro lado, como um inimigo em potência cuja presença exige o reforço preventivo das medidas de segurança, levou à emergência de prismas de alteridade em torno da imigração e da criminalidade, apesar da ausência de conclusões sólidas e devidamente fundamentadas. Alguns estados responderam ao fenómeno com a introdução de medidas progressivamente mais duras, e o grau de intolerância em relação à situação de irregularidade documental tem vindo a crescer, num ambiente em que as vítimas e os perpetradores acabam muitas vezes por ser confundidos entre si. Existe, fundamentalmente, um misto de desconfiança, um endurecimento de políticas e uma intolerância crescente em relação aos criminosos de origem estrangeira, uma reacção que se assemelha bastante à reacção face à irregularidade.
Breve Curriculum Vitae Maria João Guia
Doutoranda em “Direito, Justiça e Cidadania no Século XXI”, Universidade de Coimbra (tese:“Imigração e Criminalidade Violenta em Portugal”). Livros publicados -- “Imigração e Criminalidade: Caleidoscópio de Imigrantes Reclusos”, Almedina (2008); "Imigração e Criminalidade Violenta: Mosaico da Reclusão em Portugal", INCM e SEF (2010).
Investigadora associada do IGC (Centro de Direitos Humanos) - Faculdade de Direito, UC.
Dedicou-se a atividades de investigação académica e criminal, orientando e co-orientando teses de mestrado. Organizou e dinamizou eventos e painéis nacionais e internacionais sobre imigração e crime, direitos dos imigrantes, tráfico de seres humanos, crimigração, dinamizando um grupo internacional de peritos - CINETS (www.crimmigrationcontrol.com).