Base de dados de perfis de ADN com propósitos forenses em Portugal - questões actuais de âmbito ético, prático e político |
Este projecto aborda os impactos sociais, éticos, políticos e práticos da ciência e tecnologia na sociedade, focando o caso específico das bases de dados de ADN com fins forenses em Portugal. A partir das competências interdisciplinares da equipa de projecto (2 sociólogos, um perito legal e um antropólogo) o estudo servirá de base para um conjunto de perspectivas integradas relacionadas com a tecnologia de ADN. A interdisciplinaridade será aprofundada por via do envolvimento de consultores peritos na área dos estudos sociais da ciência e tecnologia, ciência forense, ética e justiça. Desde as suas origens em meados dos anos 80 do século XX, a identificação por perfis de ADN tornou-se o ‘padrão-de-ouro para a identificação’ na sociedade contemporânea (17,3, 4). Tem sido utilizada para: confirmar identidade em contextos civis; identificar corpos em guerras e catástrofes; inferir identidade em cenas de crime. Estes feitos assentam em tecnologias complexas sendo apoiados pelas noções sociais da autoridade epistémica da biologia molecular (13). O poder atribuído aos perfis de ADN justifica a sua crescente importância no sistema de justiça criminal e tal tecnologia tem sido apresentada como um contributo para a redução do crime e para a segurança pública (30). Assim, é necessária uma governação eficaz que ajude a garantir que a sua eficiência seja maximizada, mas também que os seus potenciais efeitos danosos (p. ex. ameaças à privacidade, liberdade, autonomia e consentimento informado) sejam minimizados (27). O projecto propõe-se providenciar conhecimento teórico e prático para a compreensão das questões éticas, políticas e sociais, emergentes da implementação de uma base de dados de ADN em Portugal. Explora as implicações para a sociedade civil, governação, investigação científica e criminal, assim como as práticas dos actores judiciais. Os objectivos políticos de controlo do crime, as questões éticas e legislativas, por um lado, e as expectativas dos stakeholders, a governação, a confiança pública e o envolvimento da sociedade civil, por outro, serão alvo de particular atenção. A consideração destes tópicos procurará responder a uma série de questões centrais na investigação, tais como: 1.Questões acerca de legislação. Que legislação específica está a ser produzida em Portugal e em que medida difere ou se assemelha à legislação de outras jurisdições da UE? 2.Questões acerca de ciência e tecnologia. Que actores e organizações estão envolvidos no desenvolvimento da base de dados de ADN portuguesa e que objectivos são pretendidos? 3.Questões acerca da ciência na administração da justiça. Que adaptações legais (e alterações nas práticas científicas) serão necessárias de forma a alcançar consenso e garantir que a prova de ADN é interpretada e representada com exactidão? 4.Questões éticas. Em que medida os debates relativos à ética moldaram a implementação e operação da base de dados de ADN em Portugal? O que pode Portugal aprender com outros Estados sobre implicações sociais e éticas do uso e retenção de perfis de ADN, assim como de informação ‘pessoal’ daí resultante? 5.Questões acerca das implicações para a sociedade civil. Quais as diferentes perspectivas dos stakeholders acerca da utilidade e usos adequados da base de dados de ADN forense? Como poderão os cidadãos comuns envolver-se no debate e como poderão comunicar efectivamente as suas perspectivas aos governantes? 6.Questões relativas ao potencial efeito dissuasor da criminalidade. Que perspectivas têm os criminosos/detidos acerca da base de dados de ADN e do sistema de justiça, e quais as motivações para a reabilitação no contexto de uma sociedade que faz uso desta daquela tecnologia? Estas questões são relevantes no contexto português, onde os laboratórios de ADN foram só muito recentemente introduzidos, e um corpo de conhecimento teórico e empírico não foi ainda estabelecido. A tecnologia de ADN está associada a expectativas sociais elevadas criadas por ‘novas’ políticas para controlar o crime e assegurar a segurança pública, pelo que o sucesso da aplicação desta tecnologia depende essencialmente do desempenho dos laboratórios criminais, do apoio legislativo, da confiança pública, dos usos de provas de ADN por parte dos profissionais legais, e da existência de debate público acerca das implicações éticas desta tecnologia. Proporcionar conhecimento e avaliar a situação nestas diferentes áreas pode contribuir para responder à questão se esta nova tecnologia se adequa ao contexto português onde a incidência de criminalidade grave é baixa e os recursos económicos são limitados. Além disso, o estudo poderá avaliar o impacto das bases de dados de ADN numa sociedade caracterizada por baixos níveis de confiança no sistema de justiça (2;5). Tal avaliação será feita a partir de entrevistas aprofundadas com vários tipos de stakeholders, incluindo cidadãos comuns, assim como prisioneiros. Visa-se produzir conhecimento relevante para a definição de políticas públicas e para a divulgação no domínio científico e social mais alargado. |