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2020-08-26
Líbano: "Quando é que o trauma me vai tocar a mim?" [Público] - comentário de Susana Gouveia 

Medo e trauma – palavras que, ultimamente, cruzam os dias com frequência. Seja devido à COVID, seja por outros eventos disruptivos de vida: como foram as explosões de 4 de Agosto, em Beirute. Teme-se o desconhecido: a reação normal, de pessoas normais, perante uma situação anormal.

O modo como o trauma se manifesta, é diferente entre cada indivíduo e em fases distintas da vida. Há quem se revolte, manifestando comportamentos violentos, quem revele angústia, tristeza, hipersensibilidade a determinados estímulos, ou tenha fácil irritabilidade; há, ainda, quem fique “congelado”, apreensivo perante a realidade que tem de ser recriada, porque a vida continua.
Por vezes, a “fuga” perante a dificuldade de ajustamento ao novo quotidiano, reveste-se da “entrega a causas” de modo a dar sentido à vida que se preservou diante de tamanha violência e destruição; assim como, a sobreocupação do tempo com trabalho, ou tarefas minuciosas, acaba por ser uma estratégia para (não) lidar com o sofrimento, do próprio e dos que estão próximos.

Conforme os dias passam, também mudam a frequência, duração e intensidade daquilo que podem vir a ser sintomas de Perturbação Pós Stress Traumático. Se a pessoa tiver apoio ao nível da saúde mental, ou se tiver robustecidas competências e estratégias para lidar com situações impactantes, os sinais e sintomas não tendem a cristalizar-se. 

É sobejamente importante o acesso (gratuito) a cuidados de saúde mental, para prevenir, ou minimizar, os danos que o evento disruptivo de vida provocou – de modo a que a pessoa volte a sentir-se confortável e funcional, o quanto antes.
Em situações como as explosões em Beirute, o nível de sofrimento é tão doloroso que a análise do que são factos perturbadores, deve ser realizada em conjunto com um técnico de saúde mental – para que seja mais ágil a promoção do ajuste à nova realidade, além do suporte para ajudar na relativização do impacto emocional que o acontecimento provocou.

Falar sobre a experiência vivida no dia 4 de Agosto, pode ser “desbloqueador” para minimizar sintomas, como os pesadelos (ou a ausência deles!), relativizar a carga emocional associada a pensamentos e imagens intrusivas.
Definir metas e fazer planos para as concretizar, ajuda a treinar a autoconsciência, colocando o enfoque da ação no futuro e não “preso ao passado”.

Susana Margarida Gouveia 

Imagem: Público/Reuters